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Herbert Duschenes: um distinto professor estrangeiro no meio da sala de aula

Texto produzido por Martin Grossmann para o hotsite da Ocupação Maria e Herbert Duschenes, exposição que ficou em cartaz no Itaucultural de abril a junho de 2016. <http://www.itaucultural.org.br/ocupacao/maria-e-herbert-duschenes/>

São quase 40 anos que nos separam daquela sala onde Herbert Duschenes projetava seus filmes em super-8 nas aulas de história da arte e arquitetura que ministrava na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), em São Paulo (SP). Muita coisa mudou de lá para cá, a começar pelo modo como documentamos e representamos o mundo no qual vivemos.

Herbert, ao viajar com Maria pelos quatro cantos do mundo nos anos 1970 e 1980, utilizava o super-8 – formato de película cinematográfica com equipamentos de fácil manuseio –, lançado pela Kodak em 1965. Esse formato popularizou o registro e, subsequentemente, a reprodução de imagens em movimento antes mesmo do vídeo em VHS. Nessas ocasiões, Herbert também adquiria e captava material sonoro para ser utilizado em trilhas sonoras.

O dinamismo e a diversidade de um mundo em transformação eram observados e gravados por esse espírito inquieto e audacioso em “multimídia”.

O artista em Herbert já notava que o mundo estava ficando cada vez mais complexo, mais imprevisível, mais multidimensional. Para esse singular professor de história da arte e da arquitetura, livros, apostilas e um projetor de slides já não eram suficientes. Os meios, os gêneros e as disciplinas em suas especificidades limitavam a percepção e a crítica e, portanto, era necessário desenvolver novas formas de registro e de exibição, novas metodologias, novas pedagogias.

Como transmitimos aos outros nossas experiências, nosso conhecimento? Existem modos específicos, protocolos, convenções e formatos que permitem essa comunicação, mas dificilmente são questionados ou até renovados. Herbert e Maria estavam na vanguarda, adiantavam o devir! Apesar daquela sala ser inadequada, quase insalubre, "ensanduichada" entre dois pisos do prédio principal da Faap, Herbert proporcionava aos quase 120 alunos ali reunidos semestralmente verdadeiras viagens a outras paragens, a outros mundos – reais e imaginários.

Tal processo era conduzido, na sala, por uma mise-en-scène muito simples, mas muito bem planejada, composta de filmes (editados para cada ocasião) projetados na parede frontal, sempre acompanhados por inusitadas trilhas sonoras (em som estereofônico em caixas de som no fundo da sala) e por uma instigante narrativa, conduzidas por "um distinto senhor estrangeiro" sentado no meio da sala. Suas aulas eram assim, performáticas e espaciais.

Essa ambiência arquitetada por Herbert era capaz de nos transportar para além daquela sala, para além do exterior. Transportava-nos para um novo mundo, um mundo planetário, global! Sim, conhecemos a Europa, as grandes metrópoles do mundo desenvolvido; adentramos museus, a Documenta de Kassel, na Alemanha, a Bienal de Veneza, na Itália, e a de São Paulo, bem como outras importantes mostras internacionais de arte pelo mundo – mas também conhecemos a realidade das cidades, de alguns países, da relação/interação entre urbanismo, arquitetura e as artes em uma geopolítica e uma economia mundial em radical transformação.

E não era só isso: fomos também teletransportados para outros recantos do mundo, ainda hoje muito distantes do Brasil, como China, Japão, Bali, Vietnã, Camboja... A arte apresentada por Herbert em diferentes contextos e localidades não era só a arte de museus, galerias e bienais, mas uma arte em e de múltiplas dimensões, uma arte que transcendia os limites do entendimento tradicional da arte.

Por meio dessa mise-en-scène que Herbert proporcionava em suas aulas, a arte estava em toda parte e já não era somente multimeios, mas multimídia!

Essas aulas nos prepararam para este novo mundo no qual vivemos hoje – informado e estruturado pelas mídias e pela internet.

 

São Paulo, 27 de abril de 2016

 

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