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Relato – Política cultural para as Artes Visuais no recém criado IBRAM - Instituto Brasileiro de Museus

Por Daniela Castro


“O Ministério da Cultura sempre sofreu problemas de estrutura”, disse José do Nascimento Júnior, presidente do recém-criado Instituto Brasileiro de Museus, “e o Ibram surge como um upgrade estrutural, que compele o próprio MinC e outras instituições públicas, como a FUNARTE, a se re-organizarem”.

O problema estrutural do MinC não é e nunca foi uma novidade para ninguém. Já a criação de uma autarquia federal, com um orçamento que pode chegar a 120 milhões de reais para este ano e cuja proposta central constitui “por ordem na casa”, é uma novidade que merece a atenção crítica e postura engajada de qualquer profissional da arte, seja ele/a ligado/a direta ou indiretamente à instituições públicas.

O novo Instituto Brasileiro de Museus sucede o IPHAN-MinC, Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, nos direitos, deveres e obrigações junto aos 28 museus federais. Viu-se necessário, portanto, redefinir os papéis e as atribuições que serão conferidos ao Ibram e à FUNARTE, gerando um estado de extrema re-estruturação dentro do Ministério. Além disso, na incumbência de gerar políticas culturais em âmbito nacional, as ações do Instituto determinarão também as linhas de atuação das instituições de arte em níveis estaduais e municipais, o que resulta em 2.667 museus, a 6a maior rede no mundo.

Essas políticas, em pautas comuns ou separadas entre os dois órgãos, visam apoiar, dentre outros, a aquisição e manutenção de acervos de arte contemporânea, a institucionalização de coleções privadas de relevância, o fomento à produção artística, histórica e teórica da arte, a capacitação de profissionais, o aprimoramento e ampliação do público, difusão, o fomento de programas de intercâmbio e residências, a garantia da participação brasileira em exposições internacionais (bienais e afins), a garantia de uma política de cooperação inter-institucional para a circulação de exposições no país e no exterior, a melhoria dos espaços expositivos e reservas técnicas...Ou seja: tudo.

Foi em função dessa novidade que desde abril deste ano, o próprio Instituto promoveu encontros fechados em São Paulo e no Rio de Janeiro com os principais dirigentes de museus, centros culturais, instituições de arte semi-privadas e privadas, artistas e produtores culturais com a intenção de apresentar-lhes as diretrizes gerais do Ibram e para, a partir de sugestões advindas desses representantes, definir políticas culturais comuns a serem elaboradas e efetivadas pelo novo órgão.

Em São Paulo, os presentes nessas reuniões elaboraram um documento  que foi apresentado publicamente em 25 de maio no MAC – Ibirapuera e comentado por José Nascimento Júnior, presidente do Ibram, e Ricardo Resende, Diretor da FUNARTE, após sua leitura na íntegra por Ana Letícia Fialho, do Fórum Permanente. Na mesa, também estavam presentes Mário de Souza Chagas, Diretor do Departamento de Processos Museais, e Eneida Braga Rocha de Lemos, Diretora do Departamento de Difusão, Fomento e Economia dos Museus.

José Nascimento abriu a plenária apresentando um breve histórico da criação do Ibram. O Instituto surgiu como resultado de uma política do Ministério da Cultura na área de museus, e já constava no programa do Presidente Lula desde 2002. Foi reafirmado no programa de 2006 e materializado com a sanção da lei em janeiro de 2009. O programa foi lançado em 2003, e durante esses 6 anos desde seu lançamento oficial, seus dirigentes constituíram uma série de ações integradas, que atuam em 3 frentes:

1)    Institucionalização da política cultural: consiste na criação do Sistema Brasileiro de Museus, Estatuto de Museus e o Ibram.
2)    Democratização dessa política: organização e criação de fóruns, seminários e editais para museus, entendendo que estes sejam  instrumentos tanto de fomento como de difusão e democratização de financiamentos.
3)    Financiamento comum: aprimoramento de editais já existentes (Petrobrás, Caixa) e modernização a partir de criação de editais (como o Mais Museus, que beneficia municípios com menos de 50 mil habitantes que ainda não possuem instituições artísticas. http://www.museus.gov.br/main.htm ).

Essas ações integradas também incluem cursos de capacitação e especialização de profissionais ligados à área (são 27 mil profissionais trabalhando diretamente em instituições museológicas hoje no país), com mais de 150 oficinas já ministradas desde o lançamento do Ibram. Nascimento aponta que o objetivo principal do Instituto é o da criação de políticas públicas junto à produção de conhecimento específico e instrumentos de institucionalização, ou seja, junto à criação de órgãos que formam e gerenciam essas políticas.

O presidente enfatiza que, no entendimento do Instituto, a ideia de museu difere daquela “tradicional” e convencional  do museu-parede, museu-coleção, museu-prédio público. Aqui e agora, a ideia de museu é compreendida como processo, como ferramenta de transformação social e de tecnologia social. Sendo assim, “nos aproximamos da arte contemporânea no que concerne à desmistificação de posturas convencionais de museus e no desafio de se fazer entender esse espaço como tendo vários formatos, várias relações, várias formas”.

Em um encontro de ministros de cultura latino-americanos e de países árabes, foi esclarecido entre os convidados que a sigla “IBRAM” é uma palavra em árabe que significa “ligação”. Com essa citação, Nascimento concluiu sua primeira apresentação  no MAC dizendo que o Instituto se propõe a ligar as coisas não-óbvias; que seu papel é trabalhar entre os museus e a produção de arte e, portanto, atuar nessa pluralidade. “Esse é o momento ideal para voltarmos mais a nossa atenção e dedicação às artes contemporâneas, na medida em que essas políticas se consolidam, e em parceria com a FUNARTE. A ideia é investir na formação de acervos de arte contemporânea, como também na institucionalização de coleções já existentes – o programa “Tesouros Contemporâneos” está sendo construído, com o trabalho de uma comissão curatorial especializada, para cumprir estas metas –, para que daqui a 20 anos, o Brasil possa apresentar um conjunto de acervos considerados de ponta”.

Diferente do entusiasmo de Nascimento, Ricardo Resende, diretor do Centro de Artes Visuais da FUNARTE há apenas 4 meses, disse ter ficado surpreso com o convite de participação no debate, pois havia recebido uma cópia do documento multi-autoral há poucos dias do encontro. No que condiz às atribuições da FUNARTE, Resende destacou que, em primeiro lugar, a instituição não é uma “produtora” de eventos e sim uma fomentadora. Seu papel central é o de distribuidora de verba para fomentar a prática e pesquisa artísticas, através de programas de editais para museus, centros culturais e pontos de cultura.

O novo diretor afirma que está à frente da re-estruturação da FUNARTE, que vislumbra a criação de vários programas de estímulo à cultura, dentre eles, a criação de uma biblioteca básica de arte contemporânea, pois “há uma grande carência nessa área no Brasil”, como também disponibilizar verbas para aquisição de obras. Resende mencionou o Projeto Conexão Artes Visuais (http://www.funarte.gov.br/novafunarte/funarte/conexao/conexao.php), criado em parceria com o MinC e Petrobrás, e enfatizou a necessidade desses projetos se manterem como processos continuados. Quanto a editais de pesquisa, o diretor procura retomá-los, mas lamentou as baixíssimas inscrições da edição passada e diagnosticou o fato como um problema de divulgação e comunicação. 

Porém, lembro-me bem que a poucos dias da data limite da entrega de projetos para esse edital, os funcionários da FUNARTE ameaçavam entrar em greve em protesto ao então presidente, Celso Frateschi, que foi acusado de favorecer a companhia de teatro que ele dirigia por meio de editais de produção de eventos teatrais. Portanto, é a partir desse momento no debate, sucedendo a apresentação entusiasta sobre o novo Instituto Brasileiro de Museus e precedendo as perguntas, que quaisquer problemas mencionados em termos de logística, passaram a ser questionados em termos de credibilidade.

Aberta a sessão de perguntas, a diretora da Expomus, Maria Ignez Mantovani Franco, em consonância com a intervenção de Lisbeth Rebolo do MAC-USP mais adiante, indagou sobre quais critérios poderia ser criada uma política de aquisição e de institucionalização de coleções de obras de arte contemporânea relevantes hoje, “pois o futuro nos cobrará”, e sugeriu a criação de uma comissão de análise e estudos que visaria uma constituição mais plural e democrática de coleções, numa rede realmente nacional.

José Nascimento pareceu aceitar a proposta da criação de comissões de avaliação, mas adiantou que esse tipo de problemática ficará a cargo do Sistema de Museus, que será criado pelo próprio Instituto, pois o Ibram se deterá com questões de políticas públicas e não no âmbito de valoração comercial do mercado privado. Parece-me, porém, que políticas de isenção fiscal para aquisição de bens culturais pelo setor privado advém de medidas dos governos federal, estadual e municipal. Portanto, uma divisão monolítica entre os setores “público” e “privado”, em se tratando de políticas de aquisição de arte e institucionalização de coleções privadas, além de difícil, mereceria critérios mais condizentes com a fluidez das políticas de mercado da arte, que são determinada por variados fatores, além da valoração comercial na esfera privada.

Em seguida, Felipe Chaimovich perguntou se o Ibram  herda questões do IPHAN no quesito de tombamento dos prédios, e indagou: onde fica a arte contemporânea nos 28 museus federais? Nascimento foi evasivo e mencionou que há a intenção  de modernizar os prédios, e que a nacionalização das coleções, inclusive de arte contemporânea, será determinada pelo conselho.

“Que conselho?”, pensei. Sim, de acordo com a lei, além dos 425 cargos efetivos que serão gerados pelo Ibram, o Instituto “cria Cargos em Comissão do Grupo-Direção e Assessoramentos Superiores – DAS e Funções Gratificadas, no âmbito do Poder Executivo Federal, e dá outras providências”. Logo em seguida, curiosa sobre o que seriam essas “outras providências”, perguntei à mesa se o Instituto se preocupará em trabalhar em proximidade às Secretarias estaduais e municipais de Cultura, no intuito de efetuar regulamentação sobre o uso devido do benefício de editais e exercício das políticas culturais, uma vez que estas forem instauradas.

Nascimento informou que o trabalho em conjunto com secretários de cultura já vem ocorrendo, mas que essas parcerias ainda estão em construção. Quanto aos editais, mencionou que o pedido ainda é bem maior do que o Ibram consegue atender de uma maneira sustentável. A seguir, Eneida Braga Rocha de Lemos, do Departamento de Difusão, Fomento e Economia dos Museus, afirmou ser sim da intenção do Ibram intensificar cada vez mais essas parcerias entre governo, estados e municípios no sentido de garantir o uso correto desses recursos. Em se tratando de leis de incentivo e editais, Eneida explicou que essa será apenas uma parte da atuação do Ibram, mas que o propósito é chegar em políticas comuns nas 3 instâncias governamentais para que cada secretaria consiga suprir as necessidades da sua área de atuação. Já Mario Chagas, do Departamento de Processos Museais, defendeu a autonomia dos estados, explicitando que o Ibram atuará em nível apenas nacional, e que cada estado, em se tratando de políticas públicas, deve ter a sua.  

Claudinéli Campos, da Unidade de Preservação do Patrimônio Museológico (UPPM) da Secretaria de Estado da Cultura, colocou uma preocupação com relação a essas mudanças estruturais que vem ocorrendo no Ministério – e em específico, nas mudanças que a Lei Rouanet vem sofrendo –  e se o Ibram poderia garantir o acesso a recursos já captados anteriormente. Num segundo momento, Campos pergunta se a presença da arte contemporânea é encorajada na programação dos Pontos de Cultura.

Nascimento responde à primeira pergunta dizendo que o critério das faixas de incentivo divide os aspectos privados dos públicos nas leis de incentivo, e explicita ser esta a essência do debate. Há de se estabelecer parâmetros na definição de instituições privadas e semi-privadas com relação ao seu critério de interesse público. A partir daí, será decidido se a instituição poderá se beneficiar de incentivo ou não. José Nascimento citou o caso de Inhotim, um acervo exclusivamente privado. Em visita ao local, ele disse aos dirigentes da coleção que ali não deveria haver incentivo público, a não ser que normas sejam adotadas que garantam que a coleção tenha caráter de interesse público. A ação privada que tenha interesse público, voltada a uma comunidade e/ou à produção de conhecimento, será beneficiada; do contrário, não. Em relação aos Pontos de Cultura, Nascimento colocou que a arte contemporânea de cunho comunitário será apoiada nesses locais.

Chagas afirmou que a definição do caráter de interesse público ficará a cargo do Estatuto de Museus. Mas o que vem a ser isso? Como definir o “interesse público” para em seguida avaliar se instituições privadas – e isso vale para a questão da institucionalização de coleções também – possuem esse caráter para serem incentivadas? Essas questões geram um conjunto de conseqüências que desafiam uma resposta única.

A intervenção de Martin Grossmann, diretor do Centro Cultural São Paulo e coordenador do Fórum Permanente, foi de ordem prática e gerou respostas que apontam para um problema ainda mais amplo que o mencionado anteriormente. Martin perguntou à mesa sobre a dinâmica de trabalho no dia a dia do Ibram. Tendo em conta as dificuldades encontradas em aparelhos públicos, e imaginando que haja vícios herdados dos mecanismos do MinC e IPHAN, como o governo investe em políticas de reformas administrativas? Há reuniões? Há possibilidades de interlocução direta? Nas reuniões preliminares a esse debate,  diz Martin, havia sido mencionado uma ansiedade sobre processos burocráticos atrasarem essas mudanças. Como isso funciona internamente?

Nascimento explica que o momento é de um forte trabalho de construção; que eles ainda estão colocando os tijolos. E continua, dizendo que após 6 anos de trabalho, a demagogia não existe, que se sabe onde estão os maiores pontos de tensão e insiste que o plano para os museus é plural. Ele menciona que a própria pluralidade é uma dificuldade; que foi historicamente da FUNARTE, com bons e maus momentos, mas que agora está com o Ibram: o que é cultura? Museu de ciência é cultura? O museu histórico, do Imigrante, por exemplo, é cultura? O próprio MinC tem dificuldade em estabelecer o que é de sua alçada. Exposições de arte e tecnologia é cultura ou ciência? Nascimento conclui dizendo que aspectos de inovação da arte contemporânea tem que ser avaliados e incorporados como entendimento cultural.

Ou seja, há de se começar a efetuar essas mudanças do começo bem básico. Fica a pergunta sobre quem, qual conselho técnico, qual comissão de curadores e/ou historiadores conseguirá definir estas questões e, mais ainda, a partir de quais critérios? Por definição, a arte e cultura resistem à estabilidades ontológicas. A definição de ‘cultura’ e de ‘público’ em contrapartida ao ‘privado’ geraram e ainda geram inúmeras teses de mestrado e doutorado em diversas disciplinas, como também inúmeros projetos artísticos no mundo todo. Sob o risco de perdurarem os didatismos e reiterações, a regulamentação a partir de critérios firmes e de caráter exclusivamente administrativo parece ser uma saída possível, se não, corremos o risco de perpetuar uma obsolência programada.

Eneida Braga, no entanto, ofereceu uma resposta mais direta à pergunta de Martin. Ela disse que a criação do Ibram compele o próprio MinC e o IPHAN a se re-organizarem. Ainda há um trabalho de gestão conjugada em 2 unidades gestoras, mas que existe a consciência da necessidade de re-organização interna. As articulações entre IPHAN, Ibram e FUNARTE vão possibilitar novas formas de melhoramento e desobstrução dos processos administrativos.

O debate esquentou quando Ricardo Ohtake, do Instituto Tomie Ohtake, declarou sua experiência como Secretário da Cultura do Estado de São Paulo há 15 anos. Neste período, havia 65 museus em São Paulo, mas, segundo sua experiência, os museus de fato contavam 5. O resto eram verdadeiros depósitos de objetos sem qualquer relevância artística ou histórica (o capacete do soldado que lutou na revolução de 1932 e afins). Ele sugeriu que o Ibram pensasse numa política que, ao invés de valorizar a criação de novas instituições, alguns desses 2.667 museus no país pudessem ser unidos para criar uma rede de museus históricos forte e compreensiva para manter a memória brasileira disponível ao conhecimento geral e à pesquisa.

Nascimento apontou que o importante é capacitar as pessoas e mostrar que elas podem fazer melhor pelas instituições. O presidente lembrou que há um histórico dos museus em vários municípios do país serem “geladeiras políticas; aquele que não apoiou a política do prefeito eleito é jogado lá”. Há de se capacitar, concluiu Nascimento, mencionando vários programas de oficinas de capacitação e editais para especialização de profissionais sênior com esse intuito.

Pergunto: não seria o caso de re-contratar? Será que é tão incabível uma outra forma de exercer  posições de gerência de museus e instituições artísticas que não a partir de indicação política? Não houve em momento algum do debate uma única menção sobre um aspecto mais amplo, e bem relevante atualmente, do “mundo da arte” que dissesse respeito à grande e rápida emergência de jovens e não tão jovens  profissionais especializados em vários setores das artes  (prática artística, curadoria, crítica, produção, pesquisa acadêmica; profissionais especializados em captação de recurso, etc.). A capacitação e aprimoramento profissional são necessários, óbvio, mas o espírito de parceria e atenção às inovações da arte contemporânea correm o risco de virarem making off’s subjacentes às verdadeiras necessidades da realidade cultural e profissional da arte brasileira hoje.

A pergunta a seguir, de uma funcionária do Museu Lasar Segall, o único museu federal na cidade de São Paulo, vai ao encontro dessas questões. Quanto à formação de conselhos e comissões para o encaminhamento de políticas públicas museais, como serão eleitas essas pessoas? Quais os critérios que serão estabelecidos para que haja uma participação mais representativa do meio artístico nessas decisões?

Nascimento responde dizendo que no conselho do Ibram consta a participação de um representante dos funcionários, e completa dizendo que essas questões são complexas por se tratarem de regiões no país muito diversificadas e que ficará a cargo de um conselho técnico elaborar essas políticas.

Esse “conselho técnico” é especializado em quais assuntos? Quais são os critérios para a sua formação? Quem estabelece esses critérios? Será que foi um conselho técnico da Secretaria da Cultura do Município de São Paulo, que um dia avaliou ser necessária a investida financeira da Sra. Marilisa Rathsam, que transformou a área pública do MUBE em um museu de eventos em benefício próprio? A exemplo de fatos embaraçosos que ocorrem em instituições municipais e estaduais, o Ibram não poderia efetuar mudanças de caráter democrático e legislar sobre questões de tempo de gestão de diretores de museus, regular sobre o número de instituições que indivíduos podem gerenciar ao mesmo tempo, bem como avaliar novos sistemas de indicação ou mesmo candidatura para a ocupação desses cargos?

Marcelo Araújo, da Pinacoteca do Estado, intervém e pede foco nas questões museais, que consistem em criação, circulação e preservação de patrimônio. Pergunta a respeito de valores de seguro, condições técnicas de preservação e uma regulamentação de política de aquisição. Se há um problema com a formação de coleções privadas e públicas é porque o governo nunca manifestou um interesse público sobre acervos. Ao final, Araújo critica o título do programa de aquisição de obras de arte contemporânea do Ibram, intitulado “Tesouros Contemporâneos”. Marcelo manifestou a contradição do termo em tudo que se refere à produção de arte contemporânea, pois “tesouros” remete à ideia de relíquia, de valor incomensurável e de difícil acesso.

Todos que se manifestaram na mesa foram unânimes em dizer que o termo pode ser repensado. Esta foi a resposta mais direta e transparente de todo o debate. O que ficou explícito naquela tarde de segunda-feira, apesar das grandes frentes de atuação e renovação serem de fato abertas com a criação do novo Instituto Brasileiro de Museus, foi que, em se tratando da criação de novas políticas públicas que determinarão as linhas de atuação das instituições culturais no país e, por conseqüência, a própria cultura, é que as palavras “definição” de mecanismos de re-estruturação e “regulamentação” dessas estruturas viram sinônimas.

Regulamentação de critérios e restituição da credibilidade em órgãos públicos que se propõem a administrar, fomentar e apoiar processos artísticos, pesquisa, criação e manutenção da memória de um país são fundamentais para a manutenção sustentável do sistema das artes hoje. R e f o r m a, com todas as letras. Se o Ibram se propõe a pensar museus como processos e instrumentos de tecnologia e transformação sociais, há de se romper vícios político-oligárquicos, de “ligar as coisas não-óbvias”, que já deveriam ter ficado óbvias para esse campo profissional há muito tempo. 



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