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Os avanços recentes e as metas atuais no contexto participativo do SISEM-SP

Por Larissa Magioli – Relato da mesa “SISEM: articulando territórios” e da Palestra “Apresentação do diagnóstico dos museus do Estado de São Paulo”

Larissa Magioli - 2011

Relato crítico da mesa: “Sisem-SP: “articulando territórios” e da Palestra “Apresentação do diagnóstico dos museus do Estado de São Paulo”

Este Relato faz parte do livro: Panorama Reflexivo 11 anos de Encontro Paulista de Museus

Sumário Panorama Reflexivo 11 anos de Encontro Paulista de Museus Encontro Paulista de Museus

O segundo dia do 3º Encontro Paulista de Museus teve uma manhã de exposições de dados que contavam com o intuito de abordar a articulação de instituições museológicas com o território e a formação de uma rede interativa. No entanto, aqui, a dinâmica e o enriquecimento da experiência vivida e proporcionada por museus ou equivalentes formou uma base de discurso um pouco distanciada do conteúdo da apresentação. Como ultrapassar os limites de uma discussão sintética e fazer chegar ao público uma proposta sólida, aliada, ainda, ao início um tanto burocrático do trabalho de sistematização de informações e números? Diante da extensa apresentação de Renata Motta, à frente do Sistema Estadual de Museus do Estado de São Paulo, o Sisem-SP, sobre o projeto de catalogação das instituições do estado, foi mostrado o panorama geral – um pacote de dados que cumpre as formalidades – do propósito de articular e desenvolver a presença e o papel dos museus nas cidades em que atuam e, no cenário global, como se conectam. A intenção de contar com maior participação do público, envolvendo cada vez mais a população local, e criar um relacionamento mais próximo e acessível com território e sociedade é assunto utópico idealizado ao longo de décadas. Nas falas de Renata Motta e Claudinéli Ramos, da UPPM, essa vontade aparece forte em vários momentos, embora por vezes solta de uma metodologia mais complexa ou de investigações que excedam os limites da sistematização substancial. Talvez não fosse o momento. Nessa ocasião, além das ambições ao final do processo, falou-se dos primeiros passos, do início da organização dos sistemas.

No primeiro momento, Renata Motta apresentou rapidamente a trajetória da discussão sobre o sistema articulado e sobre a importância da modernização do decreto de 1986, que legitima a composição de um Conselho de Orientação ao Sisem-SP. Sua atualização, datada do dia 3 de junho de 2011, é tida como um grande passo dado nas buscas por desenvolvimentos na presença dos museus nas cidades, por meio da consolidação jurídica das ações estruturais desenvolvidas desde 2008. O fato é comemorado e acredita-se que, a partir dele, “articular territórios” por meio de instituições museológicas possa ser feito de forma mais consistente e organizada. Para além da questão legislativa tratada, que sem dúvidas trará benefícios do ponto de vista profissional, no entanto, cabe perguntar-se até que ponto este tipo de medida pode representar mudança sensível na experiência museológica mais presente. Claudinéli Ramos chama a atenção para essa modernização do decreto, pois, segundo ela, habilitará o Sisem-SP por meio da adequação frente às esferas nacional e internacional e, assim, terá a oportunidade de estimular o desenvolvimento dos diversos papéis dos museus junto ao território. De forma tão breve e geral – para todas as instituições museológicas públicas ou privadas do Estado, a máxima é a mesma –, é difícil atravessar o discurso genuíno e imaginar o Conselho de Orientação que se projeta ter sua atuação especialmente otimizada por conta da aprovação jurídica. Conta-se, com esses avanços, com uma organização mais eficiente de eventos e atividades a serem cumpridos, dando maior visibilidade às prioridades do sistema. O que fica claro é que as principais pautas tanto da UPPM quanto do Sisem-SP se estabelecem neste momento de acordo com parâmetros organizacionais e funcionalistas. As válidas preocupações com profissionalização e estrutura em museus, na visão do Estado, no entanto, parecem se projetar com uma objetividade extrema, e questionável do ponto de vista das propriedades e particularidades internas de cada instituição.

Além do recente fato notável, a palestra se concentrou em apresentar e explicar o processo de mapeamento do conjunto dos museus do estado de São Paulo, ocorrido em 2010. Esse diagnóstico de números e dados é a ferramenta que auxilia e oferece os subsídios necessários para que seja reconhecido o panorama geral das condições do conjunto. O trabalho desenvolvido pela equipe do Sisem-SP até o momento, então, diz respeito a conhecer melhor a si próprio. Ainda que a fala de Renata deixe clara a dificuldade de agregar e articular informações e características de 415 instituições, entre públicas e privadas, em rede – conceito bastante discutido nesta manhã –, é evidente a pouca representatividade que a maioria das instituições sempre desempenhou – o Sisem-SP existe desde 1986 – perante seu próprio sistema organizador. A importância de obter informações recentes para iniciar o rascunho das futuras ações é reconhecida e a iniciativa, louvável. No entanto, mesmo essa pesquisa preliminar, quase superficial, que pretende elencar e categorizar de acordo com os mais nítidos dos aspectos, é capaz de surpreender palestrantes e espectadores, ambos formados por gestores, pesquisadores e autoridades relacionados a instituições museológicas, culturais e afins. Dados básicos não informados, como o número de peças do acervo, por exemplo, estão presentes na realidade de parte expressiva das instituições paulistas, e demonstram certo descaso em relação ao conjunto ao longo de todo o desenvolvimento das principais políticas culturais no estado.

Renata Motta discorreu rapidamente acerca da trajetória do Sisem-SP, sobretudo as ações dos últimos anos, que convergem para o cadastro estadual de museus e a grande pesquisa que a ACAM Portinari desenvolveu em 2010. De modo geral, a incumbência de subsidiar a investigação e a difusão do patrimônio e dos debates culturais, recentemente, tem sido encarada com enfoque nas áreas de organização e, de certa forma, padronização de ações. Sendo nítida a problemática que envolve a precariedade de informações sobre o conjunto dos museus, o que se busca imediatamente é a compilação de dados que possam definir eficientemente uma estratégia funcional de atuação em rede. Outro ponto ressaltado foi a necessidade de ter a consciência de escala e o contexto geral em mente quando se trata de medidas estruturais na esfera pública, para que as práticas coordenadoras sejam bem fundamentadas e com objetivos claros. Dito isso, o diagnóstico, no âmbito das palestras do Encontro Paulista de Museus, é muito bem-vindo, pois, pela capacidade de mobilização de profissionais relacionados à museologia, os dados objetivos podem ser amplamente comunicados. A metodologia utilizada pela ACAM Portinari para realizar esses levantamentos se deu por meio das visitas diretas, produzindo fichas cadastrais organizadas por categorias e por registro fotográfico. Parte importante dessa ação é a disponibilização de tais fichas online permanentemente, por conta de maior capacidade de atualização e alcance de público do meio virtual, a ser realizada juntamente às municipalidades até o fim de 2011. É válida, ainda, uma análise dos parâmetros do formulário definidos para o diagnóstico, por demonstrar de forma prática os aspectos que o Sisem-SP julga como prioridade para se obter a imagem do contexto de atuação. Ainda que não produza neste momento específico da série de palestras grandes debates conceituais, ajuda a fundamentá-los e promovê-los na continuidade do Encontro.

Por meio do foco dado ao mapeamento realizado entre maio e dezembro de 2010 das instituições museológicas permanentes, sem fins lucrativos e amplamente abertas ao público, alguns aspectos foram sendo desenvolvidos com mais ímpeto. O conceito predominante nas falas tanto de Renata quanto de Claudinéli é o de articulação. Em posse do diagnóstico, a intenção de promover diferentes e avançadas formas de ambientação do museu convencional, como exposições itinerantes ou cursos de capacitação pontuais e de longa duração demonstra vontades simbólicas. Pode-se de fato tornar-se mais presente e atuante a partir das medidas de expansão das instituições, como se propõe, embora nesse sentido o que parece fazer mais diferença não seja a medida em si – neste caso, amplamente difundida e comemorada como contemporânea –, mas a maneira de desenvolvê-la em diversos campos da indústria cultural atrelada aos museus, a maneira de conduzi-la.

A proposta com a articulação é que o conjunto de 415 instituições museológicas, entre públicas e privadas, distribuídas em 190 municípios pelo estado, mantenha uma unidade de comunicação entre pesquisas e atividades. Renata descarta que com essa atitude haja uma tendência à homogeneização, garantindo que dentro do conjunto cada instituição tenha seu foco e organização particular, mas que, juntas, possam atuar articuladamente em rede, de acordo com as demandas percebidas pelo Sisem-SP. Ainda que se planeje a melhor estrutura possível, mais uma vez esses anseios por um museu ideal parecem desalinhados em relação à ficha cadastral e ao pacote de dados que tomarão a apresentação.

Também essa transposição de proporções entre a administração da unidade isolada e a atuação em um sistema conectado entre as municipalidades depende de uma significativa mudança de escala e perspectiva, que se torna essencial à gestão pública efetiva. Mesmo viabilizadas por meio de linhas de ações principais, como a circulação de acervos e de assessorias técnicas diretas, a meta principal do Sisem-SP é, mais uma vez, a articulação programática em rede das instituições.

Daí em diante, passadas as explanações sobre as principais motivações e objetivos do Sisem-SP e da UPPM, Renata se deteve a apresentar e comentar alguns números do diagnóstico. No geral, pode-se dizer que a presente situação não está de todo correspondente às expectativas referentes ao momento próspero vivido pelo Brasil. Nesse sentido, o diagnóstico corrobora com a já reconhecida dificuldade atual de tirar proveito do crescimento econômico e do aumento imediato do poder de consumo de grande parcela da população para promover progressos relacionados à educação e à cultura. É neste contexto que as ações que visam promover maior representatividade dos museus em todo o estado de São Paulo se veem. Na apresentação pôde-se notar certo otimismo em relação ao desenvolvimento da organização, muito por conta das recentes conquistas do Sisem-SP, embora também tenha ficado clara a consciência da dificuldade de lidar com o conjunto daqui para a frente. O alvo distante é sempre o museu ideal – e único. A “adequação” buscada com a “rede” é a imagem da instituição cultural ativa e inserida no território, o que soa muito bem, porém se fala muito pouco de propostas palpáveis. Recorrentes ao alvo são as já experimentadas exposições itinerantes, as assessorias técnicas, a capacitação profissional etc., que soltas não parecem tão consistentes assim.

Juntamente com a região metropolitana de São Paulo, os municípios de Campinas, Marília, São José do Rio Preto, São José dos Campos e Sorocaba se destacam por manter o maior número de instituições museológicas do estado. Esse tipo de levantamento não é capaz de mostrar muito além dos números a diferença entre as organizações dos municípios citados e de outras regiões menos representativas. O Sisem-SP, no entanto, promete o enfrentamento dessa questão de ausência de conselhos orientadores ou de qualquer outro tipo de comissão qualificada a analisar e estruturar a linha de desenvolvimento de cada uma das instituições. Pode-se retratar um pouco essa situação atual com o dado de que dois terços das instituições não possuem nenhum desses tipos de organização. Os descompassos entre as estruturas presentes nessas cidades em relação ao restante do estado, do ponto de vista qualitativo, é certo, se mostrariam ainda maiores. Na verdade, 75% das instituições contam com no máximo dez funcionários, contabilizados desde a prestação de serviços básicos, especializações técnicas e administração. Esse número explicita, ainda, a ausência de cursos voltados à área museológica, desde os destinados à capacitação da atuação profissional aos voltados à pesquisa e investigação dos equipamentos presentes.

Em relação às dependências de cada instituição, o mapeamento referente aos acervos constitui um aspecto interessante, que inclusive serve de alerta para as conclusões precipitadas que alguns dados quantitativos podem suscitar. As coleções que informam contar com até 500 peças representam 21% do total e as de até mil peças, 36%, demonstrando que a maioria das coleções dos museus do Estado informa contar com no máximo mil peças. Esse número, ressalta Renata, aponta, sim, para o diagnóstico de acervos comedidos, porém deve ser visto com algum cuidado, pois pode variar também de acordo com o perfil programático de cada instituição. Há que se ponderar: outras investigações são necessárias. Na categorização programática, o levantamento indica a maioria absoluta de museus de perfil histórico e pedagógico (50%), seguido pelas instituições relacionadas a ciências, tecnologia e técnica (15%), e os ligados à arte (12%). Porém, a surpresa maior está na porcentagem de instituições que não informaram o número de peças do acervo. É espantoso que esse dado básico não seja conhecido pelas próprias administrações dos museus em 25% dos casos. Além disso, mais da metade das unidades da rede proposta não possui uma reserva técnica adequada para o acervo. É de fato preocupante. E é nesse sentido que o levantamento feito em 2010 pode encontrar sua relevância. Demonstra que os museus necessitam da organização para proporcionar no mínimo locais apropriados à conservação de suas peças. Inquestionável. Tal dificuldade de acesso e documentação representa tal falta de sistematização e organização a ser realizada por meio de algum tipo de conselho orientador, como Renata deixará claro como um aspecto bastante valorizado.

É notável na apresentação que o Sisem-SP tem hoje projetos de implantar algumas boas ações diversificadas, com a intenção de articular as instituições museológicas singulares em uma rede em que se retroalimentem e passem a agir conjuntamente em relação às demandas culturais do estado. Entre os planos há pouca inovação no pacote de medidas, embora constem as já comentadas atividades educativas, distribuição de materiais gráficos institucionais, entre outras medidas dessa ordem, que são essenciais a todos os equipamentos socioculturais na atualidade. Já os websites configuram uma das pautas debatidas fundamentais a ser trabalhada de imediato, pelo baixo custo e pela rapidez do processo de implementação. De acordo com o levantamento de dados, dois terços das instituições não estão presentes digitalmente, não possuem sequer um blog ou um feed de notícias. Se a proposta é manter a base estrutural da rede conectada, um site que congregue as informações gerais geridas pelo Sisem-SP e pela UPPM em face da Secretaria da Cultura, é prerrogativa básica à articulação. E, além da dinâmica das ações conjuntas, o site próprio a cada museu é indispensável à tal presença que se espera que a instituição venha a ter com a sociedade civil, com o território em que se insere.

Outro aspecto atual a que foi dada bastante importância é a acessibilidade física ao edifício. Ao contrário da presença das instituições online, configura uma ação mais complicada e de investimento mais alto, porém democratizar a integração com o público como um todo faz parte de uma concepção ideal válida e, principalmente, está de acordo com os objetivos apresentados por Claudinéli Ramos e Renata Motta de integração arquitetônica e urbanística do equipamento cultural à sua volta. É com base no número reduzido de visitas mensais que as ações podem começar a ser estruturadas. A maioria das instituições recebe um público de até mil visitantes por mês no total, uma média muito baixa. A interlocução com o público e as relações de pertencimento e democratização dos museus se fazem um tanto desconectadas da realidade. Já que o debate se desenvolve hoje em cima de dados, talvez resida nesse número a síntese de como as instituições estão representadas hoje não só no estado de São Paulo, mas em todo o Brasil. Deve ser a partir dessa referência, com capacidade de interpretação dos dados e de proposição adequada ao contexto, que as organizações responsáveis pelo desenvolvimento de políticas culturais devem se nortear. A inserção articulada das instituições museológicas continua a ser a meta atual.