EPM: um legado fecundo de parcerias

Davidson Kaseker - Diretor do Sistema Estadual de Museus de São Paulo desde 2013

Davidson Kaseker

2021

Diretor do Sistema Estadual de Museus de São Paulo desde 2013

 

Sumário Panorama Reflexivo 11 anos de Encontro Paulista de MuseusEncontro Paulista de Museus

 

A construção da memória se dá no presente e invariavelmente resulta de escolhas determinantes do que haverá de ser preservado ou legado ao esquecimento no futuro. A produção deste livro-documento que registra a trajetória de mais de uma década de realização ininterrupta do Encontro Paulista de Museus (EPM) vem suprir uma lacuna na preservação da memória institucional desse evento. Organizado pelo Sistema Estadual de Museus de São Paulo (Sisem-SP), instância da Secretaria de Cultura e Economia Criativa de São Paulo coordenada pela Unidade de Preservação do Patrimônio Museológico (UPPM), com a parceria da Acam Portinari na sua organização e produção, o EPM é reconhecido de fato e por direito como um dos mais relevantes espaços para a troca de experiências e debates do setor museal brasileiro.

Falando do lugar de quem já esteve dos dois lados da tribuna, como público e como organizador, não posso me furtar de um relato biográfico, mas que ao mesmo tempo se reporta à própria trajetória do EPM como construção coletiva de uma museologia participativa.

Minha primeira interação com o EPM se deu, como já dito, na condição de público quando ainda atuava como representante regional do Sisem-SP da região de Sorocaba. Logo percebi o potencial do EPM ao reunir gestores da esfera estadual da cultura para um diálogo aberto e direto com gestores municipais, profissionais de museus, estudantes e demais interessados na discussão de políticas públicas para o setor museológico paulista.

Em seguida, a partir do 5º EPM, ao assumir a direção do Grupo Técnico de Coordenação do Sisem-SP, em 2013, coube-me a responsabilidade e o desafio de integrar e coordenar a comissão organizadora do evento. A essa altura, o EPM já se firmava como uma agenda atrativa, as Representações Regionais e o Conselho de Orientação (Cosisem-SP) haviam sido institucionalizados e um novo horizonte se colocava à frente. Não por acaso, foi neste ano que, para sinalizar esse mo(vi)mento de consolidação institucional, o EPM e o Sisem-SP adotariam uma nova identidade visual integradora, instituindo uma vinculação gráfica entre si. Foi neste ano, ainda, que o EPM instituiu uma plenária para coletar subsídios para a elaboração da metodologia do Cadastro Estadual de Museus (CEM-SP). Iniciávamos, então, uma nova etapa que marcaria em definitivo o EPM como construção coletiva e instância participativa.

Nos anos seguintes, profundamente impactados por sucessivas reduções orçamentárias como reflexo do cenário macroeconômico nacional, o EPM peregrinaria por vários espaços da Capital em função do incêndio no Memorial da América Latina. Nesse período, como expressão de resiliência, graças ao apoio da SEC e da Acam Portinari, foi possível manter um padrão de excelência na organização do EPM. Ao apoio das demais organizações sociais que administram os museus da SEC somaram-se parcerias estratégicas que permitiram assegurar um alto padrão de programação nos EPM, como as parcerias com o Icom, British Council, o Sesc-SP (em especial com o CPF-Sesc) e o Fórum Permanente, dentre outras instituições culturais.

Para dar conta de todos os desafios de planejamento e produção do EPM, foi imprescindível a persistência numa gestão horizontalizada e participativa, com responsabilidades compartilhadas e o comprometimento de todos os colaboradores com valores e objetivos comuns. É indispensável, portanto, registrar meu agradecimento à equipe do GTC Sisem-SP, composta inicialmente por Luiz Mizukami e Thaís Romão, e mais recentemente também por Luiz Palma, além de vários estagiários, aos quais homenageio em nome de Carolina Teixeira. Da mesma forma, expresso minha gratidão à equipe técnica da Acam Portinari dedicada exclusivamente ao apoio ao Sisem-SP, que é coordenada por Joselaine Tojo e composta por Bárbara Paulote, Carol Ávila, Michael Argento e Otávio Balaguer, sem esquecer Janderson Brasil, Adriano Tardoque e Léa Blazer, que também participaram dessa trajetória.

Alguns momentos merecem destaque. Dentre eles, as comemorações dos 30 anos do Sisem-SP no 8º EPM, realizado na Sala São Paulo, quando foi lançada a fase-piloto do CEM-SP, após três anos colaborativos na construção de sua metodologia, com intensa contribuição dos RRs e membros do Cosisem-SP.

Primando pelo crescente envolvimento e participação de nossos stakeholders, a programação do 9º EPM contou com a formalização de uma Comissão Consultiva, composta por representantes de instituições parceiras, como o Icom Brasil, Acervo Artístico-Cultural do Palácio, Corem 4R, PPGMus-USP, Blue Shield Brasil, CPF Sesc-SP, além da própria Acam Portinari.

Na realização do 10º EPM, em 2018, com o auditório Simón Bolívar devidamente restaurado, tivemos o privilégio de poder voltar ao Memorial da América Latina, e, para celebrar essa emblemática edição, a SEC firmou termo de cooperação com o Ibram, tornando o Sisem-SP entidade registradora dos museus na Rede de Informações Museais (Renim).

Momento singular do 10º EPM foi a concessão da Medalha do Mérito Museológico Waldisa Rússio Camargo Guarnieri ao seu primeiro agraciado – o professor Ulpiano Bezerra de Meneses –, que nos presenteou com uma palestra memorável sobre o papel do museu no mundo contemporâneo.

No ano seguinte, atendendo a uma antiga aspiração dos RRs, em parceria com o SESC, realizamos o Encontro Paulista de Museus Itinerante (EPMi), com um ciclo de edições sediadas em seis macrorregiões do estado. Com o propósito de atingir um público de profissionais de museus que nem sempre têm a oportunidade de participar dos Encontros na Capital, a partir dessa inovação, o EPM volta, nos anos ímpares, a percorrer as distintas regiões do território paulista, dando visibilidade a museus do interior e litoral que se notabilizam pelas boas práticas e inovações.

Em 2020, premido pelo distanciamento social demandado pelo protocolo sanitário da pandemia, o EPM migrou para o ambiente digital, exigindo esforços desafiadores para reinventar seu formato de modo que não se limitasse apenas a reproduzir nas redes sociais o modelo tradicional realizado presencialmente. Seria preciso inovação e resiliência para assegurar de forma criativa a qualidade da participação do público e dos convidados, com recursos de acessibilidade, articulando intervenções pré-gravadas com mediações e presenças on-line.

Mais importante ainda é que, na programação do EPM 2020 – sob a inspiração do tema “Museu, sociedade e crise: do luto à luta” –, mais uma vez construída colaborativamente com os membros do Conselho Consultivo do EPM, foi possível avançar no debate das práticas da sustentabilidade na gestão dos museus nos seus eixos ambiental, econômico, social e cultural, com ênfase no combate ao racismo estrutural e às desigualdades sociais, assim como no enfrentamento das questões da diversidade étnica e de gênero.

Por último, há que se destacar a dor e alegria de podermos prestar no EPM 2020 a nossa homenagem ao saudoso Júlio Abe, vítima da Covid-19, que nos legou sua derradeira mensagem ao celebrar, em vídeo gravado às vésperas do Encontro, o recebimento da Medalha do Mérito Museológico Waldisa Rússio Camargo Guarnieri, a ele atribuída pelos relevantes serviços prestados à museologia paulista e brasileira.

Ao mirar pelo retrovisor uma década de políticas públicas voltadas para a qualificação dos museus paulistas para as quais tive o privilégio de contribuir, a despeito de todas as incertezas, reitero a minha convicção de que, sob a égide das parcerias e responsabilidades compartilhadas, ilumina-se na trilha da sustentabilidade o caminho para assegurar vida longa ao EPM!