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O que representam os museus? Sobre as relações entre museu, educação e sociedade

relato crítico por Danielle Rodrigues Amaro

Relato das Mesas Redondas II e III:  Educação em Museus e das Plenárias II e III do ICOM Diálogos Sul-Sul de Museus, ocorridas no Auditório da Pinacoteca do Estado de São Paulo, no dia 19/08/2013.

Relatora:  Danielle Rodrigues Amaro

 

O ICOM Diálogo Sul-Sul de Museus, evento promovido pela Secretaria de Estado da Cultura,reuniu representantes da América Latina (ICOM LAC), África (AFRICOM) e Caribe (além de convidados de outros países), presentes no Brasil em virtude da 23ª Conferência Geral do Conselho Internacional de Museus (ICOM), realizada entre os dias 10 a 17 de agosto de 2013 na cidade do Rio de Janeiro.

O evento, que teve como objetivo “oferecer oportunidades de networking, disseminação de informações, criação de laços profissionais e cooperação entre os participantes”;abordou três temas gerais de comum interesse entre os envolvidos:  1) Planos de Emergência;  2) Educação;  3) Projetos Expositivos.

Considerando que das quatro mesas redondas realizadas, duas tiveram como tema “Educação em Museus”, que ocorreram no período da tarde do segundo dia de atividades (19/08/2013), é possível perceber, de antemão, a importância atribuída às ações educativas desenvolvidas em museus atualmente.

 

Da “Mesa Redonda II:  Educação em Museus (parte I)” participaram Gabriela Aidar (coordenadora dos Programas Educativos Inclusivos do Núcleo de Ação Educativa da Pinacoteca do Estado de São Paulo) e Marina Toledo (coordenadora do Núcleo Educativo do Museu da Língua Portuguesa), ambas membros do Comitê de Educação e Ação Cultural (CECA ICOM Brasil), tendo como mediadora Joana Monteiro (ICOM Portugal).

Após uma brevíssima sessão de informes, a mesa iniciou-se com a apresentação de Gabriela Aidar sobre a experiência do Programa de Inclusão Sociocultural do Núcleo de Ação Educativa da Pinacoteca.

Gabriela Aidar começou sua comunicação contextualizando a instituição a partir da qual atua.  A Pinacoteca é o mais antigo museu de arte do Estado de São Paulo, fundada em 1905.  Localizadano centro de São Paulo, nas imediações da Estação da Luz, é uma instituição pública, vizinha de outros equipamentos culturais como o Museu da Língua Portuguesa, o Museu de Arte Sacra de São Paulo, a Sala São Paulo, o SESC Bom Retiro (apenas para citar alguns), que em seu conjunto é considerado um importante pólo cultural da cidade.  É também uma região marcada por grandes contrastes.  Ao mesmo tempo em que conta com uma boa infra-estrutura e oferta de serviços públicos e privados, é igualmente habitada por populações de baixa renda, em condições adversas de subsistência, com altos índices de vulnerabilidade social e riscos,como populações: moradoras de habitações precárias (as chamadas “ocupações” e “cortiços”);  populações de dependentes de substâncias psicoativas legais e/ou ilegais (que em virtude da sua concentração e do alto consumo, em particular, do crack, fez da região popularmente conhecida como “Cracolândia”);  populações em situação de rua;  além de ser uma conhecida zona de prostituição.  Como é possível prever, apesar de circular cotidianamente no entorno do museu, este público (ou não-público) é o mais distante da Pinacoteca.

Gabriela Aidar cita ainda pesquisas referentes à percepção, acesso e frequência da população brasileira a equipamentos oficiais de cultura.  Os museus, por exemplo, não são homogeneamente distribuídos no território nacional.  A maior parte da população nunca visitou um museu ou centro cultural.  De acordo com os dados produzidos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) – fundação pública federal vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República – em pesquisa sobre a percepção e a avaliação da população dos serviços de utilidade pública ligados à Cultura e o grau de importância deles para a sociedade, 68% dos brasileiros (ou seja:  aproximadamente sete em cada dez) afirmaram nunca visitar esses espaços.  Entre os motivos indicados para a não freqüência a esses espaços estão:  os altos preços, a distância e a percepção desses espaços como elitistas, apontando assim para uma barreira simbólica que os intimidava e impedia de se apropriarem desses espaços.[i] Outras pesquisas apresentadas por Gabriela Aidar (como aquelas desenvolvidas pelo Observatório de Museus e Centros Culturais e pela própria Pinacoteca) apontam que esses dados se reafirmam com mais força nos museus de arte, onde o público freqüentador desses espaços se caracteriza pela alta escolaridade, possuidores de rendimentos acima da média e pela alta freqüência a esses espaços.

O museu, no entendimento de Gabriela Aidar, precisa lidar com essa situação de uma maneira produtiva e pró-ativa, já que (em sua perspectiva) a neutralidade não seria possível.  Ao contrário do que se possa pressupor, a neutralidade manteria e reforçaria estruturas e distâncias simbólicas.  Nesse sentido, é que se justificam as ações desenvolvidas pelo Programa de Inclusão Sociocultural (PISC).  Após uma apresentação mais geral do Núcleo de Ação Educativa da Pinacoteca (do qual o leitor pode ter mais informações acessando aqui), Gabriela Aidar esclarece que o Programa de Inclusão Sociocultural se insere nos Programas Educativos Inclusivos (juntamente com o Programa Educativo para Públicos Especiais, o Programa Consciência Funcional, o Projeto Meu Museu) que trabalham com públicos não-frequentadores habituais de equipamentos oficiais de cultura.

Gabriela Aidar apresenta o que, de forma geral, o Núcleo de Ação Educativa da Pinacoteca entende por acessibilidade.  Apesar de, no contexto brasileiro (principalmente no âmbito das discussões em educação), a palavra ser compreendida como sinônimo de “acesso físico” (relacionado, na maioria das vezes, às pessoas com deficiência), na Pinacoteca o termo é compreendido numa chave mais ampla.  Além “da garantia de circulação e afluxo de público às instituições (com a utilização de rampas, elevadores e mesmo com a gratuidade nos ingressos)”, há outras formas de acessibilidade tão ou mais importantes e que se relacionam a aspectos intangíveis e mais subjetivos, como:  acesso cognitivo (que se refere “ao desenvolvimento da compreensão dos discursos expositivos”) e acesso atitudinal e afetivo (“por meio do desenvolvimento de identificação com sistemas de produção e fruição, e da confiança e prazer pela inserção no espaço do museu”) (CHIOVATTO et al. in:  SANTOS, 2010, p.18).[ii]

Gabriela Aidar então apresenta o que seria o objetivo principal do Programa de Inclusão Sociocultural da Pinacoteca:  promover o acesso qualificado aos bens culturais presentes na Pinacoteca a grupos em situação de vulnerabilidade social (termo adotado pela Política Nacional de Assistência Social, e que aponta para uma maior abrangência de situações nas quais a exclusão pela pobreza é mais uma delas e não a única, assim como a falta de acesso às políticas e aos serviços públicos, estando a idéia igualmente vinculada à violação de direitos, nos quais se inclui os direitos culturais) com pouco ou nenhum acesso a instituições oficiais de cultura, como os museus.

As ações desenvolvidas pelo Programa de Inclusão Sociocultural apresentadas por Gabriela Aidar são:  1) estabelecimento de parcerias com organizações que desenvolvam projetos socioeducativose visitas educativas continuadas dos grupos à Pinacoteca (ou seja:  os grupos retornam várias vezes ao museu);  2) promoção de cursos de média e longa duração para educadores sociais;  3) duas ações educativas que acontecem fora do museu:  a Ação Educativa Extramuros (que acontece, desde 2008, em duas casas de convivência para adultos em situação de rua do entorno do museu, nas quais são desenvolvidas oficinas de artes com ênfase em xilogravura) e a Ação Educativa Comunidade e Museu (iniciado em 2012, é um processo de educação patrimonial desenvolvido com dois grupos comunitários com perfis muito diferentes:  um grupo de jovens de um Centro pra Juventude localizado na Zona Leste de São Paulo;  um grupo de famílias de uma Aldeia Indígena Guarani do Pico do Jaraguá).  Ao falar sobre a ação desenvolvida junto ao último grupo, a platéia se mostrou visível e particularmente comovida e surpresa.  Acredito que seja tanto pelo caráter insólito de, em uma metrópole como São Paulo, ainda abrigar aldeamentos indígenas que bravamente resistem em meio a sérias adversidades; além do desafio que é trabalhar com grupos com modos de vida muito particulares.

Finalizada a primeira apresentação, Joana Monteiro passou a palavra para Marina Toledo, que deu prosseguimento à mesa apresentando o Projeto “Dengo:  um museu para todos”, ação desenvolvida pelo Educativo do Museu da Língua Portuguesa junto a pacientes de hospitais.

Marina Toledo começou sua apresentação justificando o título do projeto:  dengo é uma palavra de origem africana e que, traduzida, fala sobre amabilidade, graciosidade.  Consultando posteriormente um dicionário, encontrei os seguintes sinônimos:  “carinho”, “cuidado”.  A palavra, em seus significados e sinônimos, traduz assim o objetivo do projeto:  uma ação desenvolvida em hospitais

O Museu da Língua Portuguesa, segundo Marina Toledo, trata da língua portuguesa e da cultura brasileira como identidade, não perdendo de vista a diversidade que lhe é inerente.  Logo, como se trata de um patrimônio imaterial, a tecnologia é tanto um meio como a própria linguagem.  Tendo em vista a facilidade de adaptação do suporte a formatos menores e móveis, há algum tempo se mostrou interessante ao Educativo do Museu da Língua Portuguesa a possibilidade de sair do museu, de propor ações para além das fronteiras institucionais.

Desde o princípio, o projeto pretendia atingir grupos oriundos de comunidades e instituições mais distantes e com dificuldades de acesso ao museu (como asilos, creches, hospitais).  Assim, optou-se por iniciar o desenvolvimento do projeto junto a hospitais.  MarinaToledo justifica a escolha tendo em vista particularmente o público infanto-juvenil que, em virtude de algum processo terapêutico, encontra-se impossibilitado de usufruir desses espaços, mostrou-se a ação potencialmente interessante de ser desenvolvida junto a esses grupos.

A partir da escolha do perfil das instituições nas quais o projeto seria proposto, os desafios se apresentaram.  Como adaptar o conteúdo e propor formas de levar o acervo para espaços como uma sala de quimioterapia, nas quais os pacientes se encontram extremamente fragilizados e, ao mesmo tempo, onde passam longos períodos?  Parte do conteúdo do acervo do Museu da Língua Portuguesa foi então adaptada para computadores portáteis e, inicialmente, as ações eram restritas a esses equipamentos eletrônicos.  Na grande maioria das vezes, o atendimento é individual, em virtude das particularidades do tratamento quimioterápico:  ou estão sentados em poltronas recebendo medicação, ou repousando no leito.  No entanto, como o processo de tratamento contra o câncer é demorado, percebeu-se que uma mesma criança ou adolescente era atendido diversas vezes, o que necessitou a adaptação do projeto para uma perspectiva de atuação continuada.  Para isso, foram desenvolvidos jogos e publicações educativas (como o material educativo da exposição “Menas: o certo do errado e o errado do certo”, e que se encontra disponível aqui).

Marina Toledo salienta dois aspectos relacionados ao Museu da Língua Portuguesa e, particularmente, ao Projeto Dengo.  O primeiro refere-se ao fato de o acervo que, como o acervo que constitui esse Museu em particular (a Língua Portuguesa) faz parte do universo cotidiano do público participante do projeto, seu repertório lingüístico e cultural, em suma, suas vivências possibilitariam uma infinidade de formas de abordagem.  O segundo se relaciona diretamente com o método de trabalho adotado no projeto:  segundo Marina Toledo, quem dita o trabalho, o ritmo e a forma é o paciente.  É uma opção de trabalho que pretende respeitar as condições nas quais o sujeito se encontra naquele momento.  Sendo assim, as ações podem acontecer tanto em espaços coletivos (como, por exemplo, em uma brinquedoteca), como no próprio leito, em tempo determinado pelo mesmo.  Além disso, esclarece que o projeto se desenvolve em parceria com os profissionais das instituições, se adequando às regras impostas por esses espaços (como, por exemplo, a esterilização dos jogos).

O papel dos médicos e enfermeiros é igualmente fundamental na avaliação de impacto das experiências propostas pelo Dengo, de forma a verificar se houve repercussão e de que forma ela se deu no cotidiano dos envolvidos.  Este seria um dos grandes desafios do projeto, tendo em vista a complexidade do quadro clínico dos participantes e da imprevisibilidade como se encontrarão no futuro, após o tratamento.  Segundo Marina Toledo, os depoimentos dos profissionais são importantes na medida em que revelam os impactos imediatos pós-visita ao hospital.  Nos depoimentos, os profissionais apontam para um estado de bem estar dos envolvidos após a visita do Dengo, principalmente entre os adolescentes que perguntariam diversas vezes sobre quando aconteceriam novas visitas.  A partir disso, é possível avaliar que as atividades propostas pelo Dengo são prazerosas aos que delas participam, ao mesmo tempo em que a elas são atribuídas importância.

O outro grande desafio, e com o qual Marina Toledo encerra sua apresentação, é o de expansão do projeto,para o ano de 2014, por meio de patrocínio, a fim de retomar o objetivo inicial que era de atender instituições com dificuldade de acesso ao Museu.  Atualmente, a ação é custeada pelo Museu da Língua Portuguesa que, como a Pinacoteca, é uma instituição pública do Governo do Estado de São Paulo, gerida por uma Organização Social.

Após a mesa e sem intervalos, iniciou-se a “Plenária II”, coordenada por Adriana Mortara Almeida (ICOM Brasil).  Entre as questões levantadas, várias se referiram aos processos de avaliação de processos educativos cujos dados são muito mais subjetivos e intangíveis, por se relacionarem a uma experiência qualitativa, do que passiveis de se tornarem dados quantitativos.Questionamentos foram levantados, se não seria igualmente importante aos museus a ampliação de público.

Além disso, o problema da continuidade das ações sujeitas aos patrocínios público e privado foi retomado.  Marina Toledo apontou para uma necessidade de equilíbrio entre o financiamento público e o patrocínio privado, de forma que as ações não sejam estranguladas devido aos estreitos orçamentos advindos do poder público e, ao mesmo tempo, não sejam interrompidas devido à ausência de patrocínios privados.

Outra discussão recorrente foi o papel das instituições como um todo e não apenas dos educativos nesses processos inclusivos dos não-públicos.  Seria assim necessário um esforço mais disperso nas outras áreas do museu, já que esse deveria ser encarado como um projeto institucional e não apenas abraçado por um número restrito de profissionais.  Afinal, de modo geral, o que se verifica nas instituições é que há dois discursos coexistindo em meio a tensões “dois museus diferentes”:  um do educativo, outro do resto do museu.  No entanto, o projeto de transformação do museu em uma instituição pública de fato deveria se algo que unificasse os discursos, e que não os dividisse.

A platéia levantou uma série de perguntas sobre projetos que envolvessem outros públicos, particularmente aqueles com deficiência.  Como esclareceu Gabriela Aidar, a apresentação teve como enfoque as ações desenvolvidas pelo PISC.  No entanto, devido a essa demanda, profissionais do Núcleo de Ação Educativa da Pinacoteca aproveitariam o intervalo para apresentar as ações desenvolvidas pelos demais programas e projetos.  Assim, encerrou-se a plenária.

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Retomando os trabalhos, foi aberta a “Mesa Redonda III:  Educação em Museus (parte 2)”, da qual participaram Lothar Jordan (Memory ofthe World / UNESCO) e Denise Grinspum (Assessora Técnica nosMuseus Castro Maya/ IBRAM MinC), sendo mediada por Lourdes Monges (ICOM México).

Lothar Jordan apresentou o “The UNESCO Memory ofthe World Programme”, criado pela UNESCO em 1992, que se dedica ao patrimônio documental mundial, identificando documentos ou conjuntos documentais, inserindo-os no Registro Internacional de Patrimônio Documental.O programa adveio da consciência do precário estado de conservação do patrimônio documental (pelos mais diferentes motivos:  saque e dispersão, comércio ilegal, destruição, entre outros) e da dificuldade de acesso a ele.  Tem como principais objetivos:  facilitar a preservação do patrimônio documental mundial por meio de técnicas apropriadas;  facilitar o acesso universal ao patrimônio documental;  criar uma maior consciência em todo o mundo acerca da existência e da importância do patrimônio documental.  A apresentação de Lothar Jordan foi bastante detalhada.  A fim de que esse relato não se torne cansativo pela extensa citação de dados, sugiro a leitura do documento “Memória do Mundo:  Diretrizes para a salvaguarda do patrimônio documental”, que se encontra acessível aqui.Ao fim da apresentação de Lothar Jordan, Lourdes Monges agradeceu sua participação e, enfim, passou a palavra para Denise Grinspum, última participante das mesas redondas do dia.

Denise Grinspuminiciou sua comunicação intitulada “Educação em Museus”afirmando queexistiria uma dimensão educacional que envolveriatodos os profissionais de museu.  A partir disso, tratou da importância de uma definição de política educacional nos museusgerida de forma compartilhada, considerando as particularidades contextuais de cada instituição.  Para melhor elucidar a questão, Denise Grinspum escolheu relatar duas experiências, que segundo elasó foram possíveis devido ao acordado e aceitedado pela direção das duas instituições (o que demonstra a importância do compromisso da instituição como um todo nesses processos).

A primeira se desenvolveu no Museu Lasar Segall (único museu do IBRAM sediado na cidade de São Paulo) entre os anos 1990 e 2000.  Tendo Denise Grinspum implantado a área educativa na dada instituição em 1985, dessa experiência resultou a tese de doutoramento “Educação para o Patrimônio: Museu e escola – Responsabilidade compartilhada na formação de públicos”, a qual concluiu e defendeu em 2000, na Faculdade de Educação USP.  A questão norteadora do trabalho era se a escola tinha um papel fundamental na formação de público, mais do que outras instâncias sociais.A partir do estudo de caso de algumas parcerias de médio e longo prazo estabelecidas com escolas da rede pública e particular do município de São Paulo, ela aponta como conclusões que além do fato do museu não fazer parte do elenco de atividades possíveis no âmbito familiar dos alunos, a escola acabava por assumir e exercer esse papel de formação de público isoladamente.  Além disso, avalia que projetos continuados e de longa duraçãocontribui qualitativamente para o processo de autonomia de público e de hábito de visitação.

A segunda experiência compartilhada por Denise Grinspum referia-se à Curadoria Educativa (por ela coordenada) da 27ª Bienal Internacional de São Paulo, cujo tema era “Como viver junto”, organizada a partir de dois grandes programas educativos:  Programa Bienal Escola (tendo como ações:  formação de mediadores, produção de material de apoio, formação deprofessores) e Programa Centro Periferia, no qual se deteria mais particularmente em sua comunicação.

Segundo Denise Grinspum, 75% dos visitantes da 26ª Bienal (precedente a esta e primeira a ser gratuita) eram da classe A e B.Retomandoas considerações tecidas na mesa anterior por Gabriela Aidar, afirma que gratuidade não é sinônimo de acessibilidade.  Apenas a liberação do pagamento do valor do ingresso não garantiria o livre acesso à Bienal, na medida em queexistiriam outras barreiras a serem desconstruídas.

O programa Centro Periferia foi desenvolvido junto aos Centros de Educação Unificada (CEUs).[iii] As atividades desenvolvidas pelo programa articulavam ações desenvolvidas juntos a grupos comunitários locais onde se encontravam os CEUs e visitas à Bienal.  Denise Grinspum salienta que o número de público atendido por este programa em particular foi muito menor se comparado com os números de visitação do Programa Bienal Escola.  No entanto, esclarece que era de conhecimento da equipe que não seria possível desenvolver esse programa de uma forma massiva.

Iniciou-se enfim “Plenária III”,aúltima do dia, coordenada por Maria Izabel Meirelles Reis Branco Ribeiro (ICOM Brasil).Algumas questões se referiram ao Programa da UNESCO, sobre o processo de instituição dos arquivos de “memórias do mundo”, considerando principalmente a intangibilidade das experiênciaspatrimoniais em regiões do mundo como a África, onde a maior parte da população vive e produzem contextos rurais, onde a tradição ainda é baseada na oralidade.  No entanto, parte significativa do tempo da plenária foi dedicada a discussões sobre a relação entre museu e escola.  A respeito disso, Denise Grinspum chamou a atenção para o fato de que o museu não deve atender às necessidades escolares, mas estabelecer um diálogo com a escola a fim de que possam construir, juntos, algo que a escola não tem condições de oferecer, que seria justamente o contato com as fontes primárias do conhecimento.

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De modo geral, os temas abordados nas quatro comunicações apresentadas nas duas mesas voltadas para a discussão do tema “Educação em museus” privilegiaram programas, projetos e experiências que extravasam as fronteiras usuais da relação estabelecida no senso comum de subserviência do museu em relação à escola.  É lógico que, na maioria dos casos, o público escolar é o que engrossa quantitativamente os números de atendimentos educativos.  Os relatos apresentados, no entanto, apontam para uma ampliação do papel educativo dos museus na sociedade.A “Educação em Museus” não tanto restrita apenas aos públicos escolares, assim como também seu papel social exercido somente pelos profissionais do educativo, mas deveria ser abraçado como um projeto institucional, abarcando as suas diversas instâncias.  Educa-se não apenas por meio do educador, mas através dos recortes curatoriais, de narrativas e discursos (explícitos e ocultos), da expografia, e de tantos outros modos que constituem a comunicação museal.

De forma a concluir esse relato, retomo a definição do que seria um museu, de acordo com o Conselho Internacional de Museus:  o museu é, entre outras coisas, uma instituição “a serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público e que adquire, conserva, investiga, difunde e expõe os testemunhos materiais do homem e de seu entorno, para educação e deleite da sociedade”.  A partir dessa definição e do meu ponto de observação (enquanto educadora de um museu de arte), proponho a seguinte questão:  se a neutralidade – como colocou Gabriela Aidar – não seria possível, para qual projeto político e social estamos servindo em nosso ofício quando atuamos nessas instituições?



[i] O “Sistema de Indicadores de Percepção Social:  Cultura” se encontram disponível para consulta em:  <http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/SIPS/101117_sips_cultura.pdf>.  Acesso em 08/09/2013.

[ii] SANTOS, Anderson Pinheiro (org.).  Diálogos entre Arte e Público:  cadernos de textos.  Recife:  Fundação de Cultura Cidade de Recife, 2010.  Volume 3:  Acessibilidade Cultural:  o que é acessível e para quem?  Disponível para download em:  <http://www.divshare.com/download/15188990-bc9>.  Acesso em 01/09/2013.

[iii] De acordo com informações disponíveis no Portal da Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura Municipal de São Paulo, “O Centro Educacional Unificado (CEU) é um complexo educacional, esportivo e cultural caracterizado como espaço público múltiplo.  A cidade de São Paulo conta hoje com 45 CEUs e o Centro de Convivência Educativo e Cultural de Heliópolis.”  Mais informações sobre os CEUs, disponíveis em:  <http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/Anonimo/CEU/apresentacao.aspx>.  Acesso em 08/09/2013.