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A escrita em campo expandido, Beto Schwafaty

Relato maio - "Escritor, Editor e Curador", por Beto Shwafaty

Ao assumirmos as noções de escrita e edição em relação a projetos curatoriais, nos deparamos com uma situação na qual a curadoria pode ser pensada como um conjunto de estratégias e situações de comunicação e materialização provisórias, e não apenas como um produto cultural fechado. O ponto de partida desta oficina residiu na abordagem do campo impresso, de publicações, documentos e arquivos e suas possibilidades em configurar discursos e situações expositivas. Os curadores convidados para esta oficina, Maria Berríos e Marcelo Resende, trataram de aspectos quase marginais e históricos do modernismo latino-americano que ofereceram contra-modelos pedagógicos e poéticos à uma arquitetura funcionalista, e trataram ainda das primeiras gerações de artistas, críticos e curadores ligados ao movimento de arte conceitual. Em ambos os casos, as pesquisas e relações com os campos editorial, histórico e de arquivos foram observadas como estratégias tanto de produção e veiculação quanto caracterizadas enquanto forma e conteúdo.

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Maria Berríos iniciou explicando como sua relação com a escrita se desenvolveu por meio da sociologia – entendida por ela de um modo muito pessoal e particular como uma ‘ciência da curiosidade’ – ganhando identidade própria a partir de seus interesses pelo cinema e no contato com coletivos de arte e arquitetura. Ela cita o etnógrafo Franz Boas como uma importante influência em seu percurso da sociologia à produção cultural, aos campos de estudos pós-coloniais e da teoria crítica literária. Este percurso informou seu entendimento em relação à atividade investigativa do artista e do curador como uma próxima à arqueologia e à narração, campos nos quais a noção de ‘escrita’ pode ser reconhecida como uma forma expandida e instrumento de investigação. Estes processos e situações investigativas são consideradas por ela como momentos de materialização provisórios: situações poéticas existentes em concomitância a instâncias críticas que podem gerar ‘formas de escrituras e reflexões diversas’.

Maria apontou a importância de encontrar os formatos e contextos adequados para os objetos de pesquisa, procurando entender suas potencialidades de comunicação e materialização intrínsecas e evitando fórmulas ou estratégias pré-formatadas. Destacou ainda temas e interesses relativos à história cultural recente da América Latina, especialmente do Chile: um interesse que levou Maria a criar o projeto coletivo Vaticanochico, em Santiago. O projeto, estabelecido em conjunto com outros dois artistas, funciona como uma residência e programa cultural baseado na idéia de investigação, envolvendo expedições e viagens de campo realizadas conjuntamente com os artistas residentes, mostras como forma de contato com o público e projetos de publicações (fac-símiles). Ela apresentou também sua participação como editora associada do projeto Documenta Magazines, na 12a Documenta de Kassel e explicou como este projeto de discussões baseados no campo editorial independente ‘almejava ser um campo de reflexão paralelo ou mesmo alternativo dentro da própria mostra’.

Nesta apresentação inicial, tornou-se cada vez mais claro o interesse de Maria em explorar os diálogos culturais e coletivos como campos profícuos de produção e pesquisa em contraponto a uma atividade de escrita mais solitária. Evocava ainda as noções e problemáticas associadas à idéia do artista como etnógrafo, uma noção que parece ganhar cada vez mais relevância no momento em que se pretende abordar as relações e cumplicidades entre observador e observado, assim como relacionar campos de pesquisa e de interesse cujas localizações encontram-se em múltiplas situações, em dinâmicas de um mundo contraditoriamente mais conectado e ao mesmo tempo complexo e fragmentado.

Em seguida Marcelo Rezende iniciou sua apresentação explicando que seu interesse pelo campo editorial como plataforma artística nasceu de uma sobreposição entre as áreas de filosofia e comunicação, disciplinas de seu percurso formativo. Este interesse surgiu também devido a uma longa experiência de trabalho como crítico de cultura e cinema no jornal Folha de São Paulo, situação na qual sua atenção ao circuito impresso começou a ganhar forma. Segundo ele, o objetivo no jornal era realizar uma ponte com o leitor: criar ‘uma janela’ entre o universo de pensamento acadêmico e intelectual com outras esferas sociais. Este processo formou seu interesse atual em explorar as maneiras possíveis de estabelecer contatos e experiências estéticas através de ‘formas visuais e textuais’ inseridas em meios de comunicação de massa; e ainda pensar o que significa a abertura de tal espaço midiático e comunicacional para a produção de arte. Marcelo também mencionou um interesse em verificar uma possível genealogia ou ‘micro-arqueologia’ para o uso da palavra e do suporte impresso como ‘centro primordial de pesquisas artísticas’ e consequentemente as implicações conceituais e produtivas oriundas deste fenômeno.

O projeto editorial da 28a Bienal de São Paulo, assim como um projeto realizado em parceira com o Guia Cultural da Folha de São Paulo basearam as falas seguintes de Marcelo. No caso do guia, projeto realizado em parceria com o Palais de Tokyo e a residência FAAP, as noções de inserção dos projetos de arte em um campo alternativo ao circuito tradicional se fundiam à idéia de intervenção gráfica e literária. Em relação ao projeto editorial da 28a Bienal – em formato de jornal distribuído nos metrôs e em diversos pontos da cidade – o intuito era informar e divulgar, estabelecendo ‘uma plataforma de contato’ com um público não habituado à Bienal e ampliando ainda o campo de alcance do próprio projeto curatorial. Atuar em circuitos que funcionassem em grande escala, para grandes grupos sociais era o objetivo principal destes projetos.

Marcelo apresenta ainda parte de sua pesquisa histórica sobre práticas artísticas que utilizaram-se de meios impressos como material de produção e divulgação que permitia maior acessibilidade a trabalhos conceituais ou à informação de situações performáticas. Marcelo mencionou como fonte de documentação deste período o ensaio-livro de Lucy Lippard Six Years The Dematerialization of the Art Object from 1966 to 1972 , que contém um registro cronológico dos processos e redes de idéias relativas às tentativas de desmaterialização da arte daquele período. Estas produções, conhecidas como efêmera, ganharam mercado nos últimos anos: uma transformação do status destes impressos e informativos, que passam agora a ser colecionados como objetos ‘quase’ únicos. Nesta situação, o interesse cultural parece ser sobreposto por um processo de valorização de mercado, uma transformação econômica ‘de um objeto funcional’ a artigo único de colecionador. E este processo configurou então uma questão relativa ao mercado de arte, pois, se em grande parte as práticas conceituais dos anos 60 e 70 adotaram a efemeridade como tentativa de questionar e mesmo escapar dos processos de mercantilização do objeto artístico, hoje vemos que o próprio capitalismo, entendido sob a lente de um período pós-fordista, emprega de modo similar estratégias de comunicação ‘imateriais e quase conceituais’ em processos de criação de valor e geração de interesse. Assim, pode-se concluir que nossa atual configuração de mercado atua de certo modo na transformação de ‘objetos informacionais’ em situações de criação de desejo, criação de visibilidade de e para um fetiche. E tais práticas artísticas históricas, extremamente relevantes para o desenvolvimento da linguagem artística contemporânea, podem hoje ser problematizadas tendo em vista também a sua participação na ampliação das possibilidades de mercado e não somente do campo conceitual e teórico da arte.

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O segundo encontro ocorreu no arquivo Wanda Svevo, da Bienal de São Paulo, onde assistimos a uma apresentação sobre a formação histórica de seu acervo, suas políticas de constituição e organização e informações sobre as atuais iniciativas para torná-lo mais accessível e aberto ao público. Por indicação de Marcelo, o grupo tomou contato com materiais relativos ao campo impresso (efêmera) relativo à edições passadas da Bienal de São Paulo, à representações brasileiras em bienais internacionais e materiais correlatos, com atenção aos catálogos-jornais da 28a edição por ele editados.

Maria apontou a relevância em tentar, sempre que possível e quando pertinente, fazer o material sair dos arquivos para circular em outros circuitos, envolvendo a necessidade de pensar os formatos físico-conceituais para esta circulação e acesso. Desta discussão surgiu a pergunta sobre o que é interessante registrar, e quem define tal escolha; e como este ato pode auxiliar a recuperar ou até mesmo a criar memória, participando assim de possíveis processos de pesquisa que produzam novos discursos ou ainda momentos de revisões históricas. O arquivo como lugar pode então ser lido como uma micro-instituição, pertencente à uma primeira, mas com funções, políticas e dinâmicas próprias fundamentais para o entendimento da formação de um sistema (a exemplo o nosso atual), daquela instituição (a Bienal) e de suas relações com entidades externas, as quais compõem a formação de sua história, de seus projetos e de sua relevância cultural.

Outro fator discutido foi a atual utilização das modalidades impressas mais como ‘forma’ que conteúdo, explico: o formato de jornal vem sendo utilizado tanto por bienais quanto por feiras de arte e mesmo livros em formato de journals. Refletimos se este formato repetiria apenas uma lógica momentânea, talvez um trend, não sendo utilizado como um veiculo de discussão sobre assuntos ligados ao consumo e à informação, à acessibilidade de produção em situações de poucos recursos ou ainda em referencia às possíveis funções destas plataformas de comunicação nas situações de proximidade e distância que configuram os contextos culturais e artísticos atualmente. A problemática referente ao fetiche veio novamente a tona pois, de forma geral, ficou a impressão de que estes materiais impressos (jornais, boletins e novos fanzines) são produzidos hoje já conscientes de seu potencial enquanto objeto-fetiche, sendo utilizados muitas vezes somente para reforçar uma identidade momentânea no interior dos contextos nos quais estes se inserem. Surgiram por exemplo perguntas a respeito de como e o que veicular, quais conteúdos e com quais linguagens; e ainda, qual a função destas peças para a instituição e para o público. Seria a necessidade de encontrar um equilíbrio entre fornecer acesso à informação e a necessidade de realizar um tipo indireto de visibilidade (e até publicidade) uma contradição destas produções? Entretanto, é interessante ressaltar que diversos artistas e grupos dos anos 60 e 70 assumiram plataformas impressas e publicações como forma de comunicação fundamental e final, e senão a única acessível naquele momento, para dar acesso e difusão aos seus discursos e projetos. Esta reflexão levou ainda à discussão a respeito da eventualidade destas publicações (dentro de uma lógica do evento), que nascem com existência já determinada, uma situação temporária que se contrapões à possibilidades de intervenção mais estruturais e de permanência prolongada.

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Nos últimos dois dias de encontro as conversas trataram de projetos realizados por ambos os convidados, nas quais pudemos tomar maior contato com seus procedimentos de pesquisa e trabalho.

Maria apresentou o projeto curado em conjunto com Lisette Lagnado: Desvio de La Deriva: experiências, travessias e morfologias, realizado no museu Reina Sofia em Madri. Interessava neste projeto a noção de deriva e de como a esta foi praticada no continente latino-americano, refletindo sobre os modos diversos de praticar a arquitetura, de fundar as cidades e de como vivenciá-las, abordando aspectos pedagógicos em relação a utopias modernas. Estas experiências traduziram-se em propostas coletivas, travessias territoriais, ações poéticas e lúdicas que oferecem uma nova leitura sobre a modernidade, mais subjetiva e orgânica ligada a formas alternativas para entender e intervir no tecido urbano e social local ao mesmo tempo que refletem sobre uma contemporaneidade global.

O foco do projeto de Maria residia em pesquisar nos arquivos da Escola de Valparaíso, a história formadora assim como as ações e lógicas que guiam ainda hoje esta escola de arquitetura alternativa, fundada em 1952 no Chile. Como ato fundador desta escola, os arquitetos que faziam parte de um grupo de artistas, poetas, arquitetos e artistas (Irmandade da Orquídea) propuseram uma viagem geopolítica ou ‘deriva continental’, cujo início se deu na Terra do Fogo passando por diversos pontos do continente, inclusive pela Amazônia e retornando ao Chile. As premissas desta escola-movimento passavam pela idéia que o território poderia ser transformado pelo ato de atravessá-lo: transformar com o andar, com o viver. A América e suas distâncias e diferenças eram definidas poeticamente como ‘nosso mar interior’: um território então a ser constantemente explorado, referenciado, vivido e documentado. A escola trabalhava de forma pouco ortodoxa, seguindo até alguns preceitos Marxistas, mas sempre pautada em uma visão poética de ação do homem em relação ao mundo, compartilhada através de uma vivência coletiva. Maria nos descreveu, por exemplo, que uma das disciplinas denominada taller de América possui uma dinâmica coletiva e performática na qual cinco professores-arquitetos dialogam através de pequenas intervenções e desenhos, constituindo mais do que um espaço de aula: um campo de debate e discussão. Nesta escola, a arquitetura é assumida não somente como ato construtor mas também como poesia e ação no mundo, posição que a aproxima certamente do movimento Internacional Situacionista. Assim, estas práticas educacionais baseiam-se em um contato direto com a realidade da cidade, onde aprender fora da sala de aula estabelece um contato com as ‘lições arquitetônicas já existentes no mundo’ bastando ao arquiteto aprender a observá-las e valorizá-las. Em 1972, a escola funda a Cidade Aberta, uma cidade e campo real para construções e experimentos arquitetônicos, um território de experimentação de vida coletiva, destinado à construção de uma cidade cuja organicidade era baseada nos preceitos poéticos e subjetivos da escola.

Seja na campanha presidencial de Salvador Allende ou mesmo durante o período da ditadura militar Chilena, esta escola-movimento iniciou também uma série ações poéticas no ambiente urbano, que se constituíam como uma forma de ação política e de manifestação pública. Foi interessante notar que nestas manifestações poéticas e coletivas, desenhos e leituras de poemas eram utilizados como estratégias de intervenção e de manifestação. Estes atos aparentemente descompromissados (mas com alto potencial inventivo) geraram atritos com outras linhas de movimentos políticos de oposição. A instauração desta situação de confronto entre uma modalidade de manifestação menos panfletária, baseada em uma poética e subjetividade artística contrastava-se às tradicionais ações de protesto. Maria explicou ainda que estas manifestações poéticas possuíam um intento de criar micro intervenções no território, conectando uma rede de indivíduos e singularidades. Através deste sistema coletivo, cuja visibilidade pública não se constituía como um único discurso mas sim como um corpo mutável e instável, uma situação transitória, política e não literal, compunha-se uma estratégia para dificultar qualquer contra-ação de combate, e ainda manifestar outras perspectivas de reivindicação e de luta social. Ela apresentou ainda o projeto Rumores, no qual a relação entre história e ficção informam uma releitura de diversos acontecimentos históricos e culturais do Chile. Neste projeto em constante desenvolvimento, ela procurar as ‘verdades’ de mitos locais, explorando por exemplo os movimentos políticos culturais chilenos como a Unidade Popular, que apresentava uma grande heterogeneidade interna mesmo sendo um movimento social de oposição política. Interessava a Maria aproximar-se das coisas, dos objetos de suas investigações através de uma noção de interesse pessoal, sem estabelecer necessariamente e a priori uma hipótese. O interesse pelo humor é citado como um dos elementos chave nestas explorações da recente historia Chilena (em contraste a um sisudo movimento de arte conceitual daquele país), assim como um interesse pelo inusitado e por práticas que possuíam já em sua estratégia produtiva a idéia de não restar para a história, de desaparecer.

Maria finalizou explicando que estes projetos partem de longas pesquisas em arquivos e materiais históricos que muitas vezes não possuem uma estrutura funcional que os permitam ser claramente organizados e acessados. E neste sentido, além do trabalho de exploração do arquivo, tornava-se importante encontrar também um meio ou estratégia que permitisse articular os materiais documentais. Estratégias ligadas à arte conceitual dos anos setenta que documentavam fatos e operações artísticas mostraram-se como uma possível opção para estabelecer dispositivos de materialização e leitura para os documentos e imagens, uma estratégia desdobrada em muitos de seus projetos.

Marcelo retomou seu discurso relacionado as práticas conceituais ligadas ao campo impresso, refletindo sobre o que poderia significar atualizá-los hoje, assim como sobre o risco de tornar o uso de plataformas impressas apenas mais um ‘gênero’ ou suporte para a arte contemporânea. Ele apontou que na atual utilização de materiais informativos e efêmeros encontramos muitas vezes uma certa estilização dos acontecimentos, não existindo de fato um ‘ato artístico’ como no período conceitual, mas apenas uma espécie de encenação. Marcelo apresentou em detalhes os projetos inseridos no guia de um jornal de São Paulo, ponderando de forma crítica sobre as características e graus de eficácia das intervenções ali realizadas. Neste sentido, surgiram questões sobre como avaliar a receptividade, a eficácia ou até mesmo a função para estas modalidades de produção impressa e interventivas, bem como suas ações de veiculação nos meios de comunicação.

Marcelo citou ainda outros exemplos que utilizaram de forma contundente a idéia de desmaterialização da arte relacionada ao campo impresso. Citou, por exemplo, as conversas do artista Ian Wilson, nas quais o objeto final (um certificado jurídico) consiste apenas em um documento que atesta o acontecimento da conversa, cuja finalidade não é a exposição mas sim a confirmação jurídica e econômica da existência de um trabalho que aconteceu no passado, apenas como experiência. Esta ação demonstra que o processo de codificação de uma experiência é tão importante quanto seu próprio ato, problematizando a dicotomia entre processo e produto.

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Estas duas linhas de pesquisa com as quais tomamos contato são baseadas em processos de exploração de narrativas históricas em coleções e arquivos que muitas vezes não encontram-se totalmente organizados e outras vezes estão esparsos entre acervos e locais diversos. Foi importante entender que a demanda nestas situações não reside apenas em deslocar e colocar o material pesquisado à mostra, mas sim propor uma nova materialidade instauradora de um regime de visibilidade que permita a constituição de um discurso crítico e reflexivo, além do processo de atualização necessário a esta situação. Parece ser fundamental hoje que produções baseadas em pesquisas socioculturais e históricas reflitam sobre seus próprios meios de produção e distribuição, negociando seus discursos e processos de existência. O trabalho de exploração de arquivos configura então uma situação potencial para interações entre arte e formação histórica que pode problematizar os próprios processos que as originam.

Ao articular esta tarefa autoral de modo crítico, parece também ser possível tornar mais accessível o conjunto de escolhas, decisões e valorizações estabelecidas por processos curatoriais, assegurando talvez uma melhor (ou ao menos mais consciente) fruição dos objetos culturais com os quais nos deparamos. O produtor cultural (artista, curador ou pesquisador) pode assumir então um papel similar ao do historiógrafo: alguém que simultaneamente reescreve narrativas ao tornar possível uma reflexão sobre a natureza de certos acontecimentos, de fatos históricos ou mesmo de estruturas retóricas. Configuram-se aqui processos críticos que observam o fluxo dos presentes campos de comunicação através de reconstruções de memória em níveis individuais e coletivos, estabelecendo práticas reflexivas sobre os processos sociais e políticos que determinam as relações entre permanência, esquecimento e redescoberta. E no cerne destas ações, podemos identificar a intenção de atualizar fatos de interesse social e cultural que, quando tratados através das noções de escrita e edição, podem gerar novas materialidades e situações de visibilidade, convertendo-se em dispositivos de comunicação públicos para novos discursos, novas histórias.



 

Franz Boas interessava principalmente pelos métodos visuais que empregava em seus registros de pesquisas de campo. Boas foi o primeiro antropólogo a assinalar o caráter inconsciente dos fenômenos lingüísticos e dos fenômenos etnológicos, distinguindo sempre a partir daí as noções de consciente e inconsciente na antropologia. Suas pesquisas originaram o campo denominado antropologia cultural norte-americana, assim como formou bases para a antropologia estrutural de Lévi-Strauss.

Texto on-line: The Artist as Ethnographer, Hal Foster.

É interessante observar aqui como estas noções se desenvolveram, gerando na atualidade projetos curatoriais e abordagens que consideram até mesmo o campo jornalístico e educacional de forma expandida, como por exemplo o livro Aesthetical Journalism de Alfredo Camerotti, e mesmo o projeto Biblioteca de Martha Rosler.

Projetos gráficos, visuais e literários inseridos nas áreas de conteúdos do guia. Projeto realizado como parte do programa de residências do Palais du Tokyo

Este termo é entendido como toda produção correlata que identifica e é derivada de projetos e situações artísticas (convites, folder, boletins, etc). Recentemente estes elementos vem ganhando mais atenção, considerados como documentos e adquiridos como itens de colecionador. Um interessante ensaio sobre o potencial desta categoria, Heterotopias: Art Ephemera, Libraries and Alternative Space, pode ser encontrado em http://eprints-gro.gold.ac.uk/142/1/art_doc_25_2_jc.pdf

Em referência a uma noção mais ampla de arquivos em relação à arte contemporânea, dentre tantos autores que a exploram, indico o texto de Hal Foster: Archives of Modern Art

Cito como exemplos: mostra clip, stamp, fold que aborda o fenômeno da arquitetura radical dos anos 60 e 70, manifesta principalmente através de fan-zines e revistas, ou ainda o livro In Numbers, sobre publicações periódicas realizadas por artistas desde 1955.

Maria aponta para os processos de formação das cidade latino-americanas, que apresentam duas vertentes: a portuguesa que se define através de uma ocupação do território de forma mais ‘orgânica e informal’ e a espanhola, que obedece um plano em malha ortogonal.

Baseada no poema Amereida, (uma referência a Eneida de Virgilio) realizado durante a travessia continental’.

O movimento Situacionista Internacional foi o propositor mais conhecido das práticas de deriva urbana.

Estes procedimentos de certo modo aproximam este movimento-escola de um outro movimento sócio-político próximo aquele período, o movimento italiano Autonomia Operaria. Guardadas as diferenças de constituição e objetivos, ambos buscavam criar formas alternativas de viver e exercer a cidadania como prática cultural e luta política . Ver referencia: http://www.nodo50.org/insurgentes/textos/autonomia/06autonomiaitalia.htm

Ela cita por exemplo a história de Enrique Lihn's Batman en Chile, publicada em Buenos Aires. Esta publicação (historia em quadrinhos) em formato de romance, trata da tentativa do herói em assumir um trabalho ultra-secreto durante o governo de Allende no Chile.

Uma referência interessante envolvendo a idéia de ‘guias produzidos por artistas’ pode ser encontrada nos trabalhos de Lara Almarcegui, expandindo ainda para uma modalidade também interessante da produção de mapeamentos sociais e geopolíticos, como por exemplo os realizados pelos coletivos franceses Bureau D’Estudes e Societé Realiste.

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