Não mais Deuses de 2ª mão

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Começamos com o título de R. Buckminster Fuller : Não Mais deus de 2ª Mão (título homônimo de um livro de 1963), também para simbolizar que – apesar do pano de fundo das questões propostas por este seminário envolverem a ideologia do capitalismo representado pelo mercado e especialmente pela ação dos Estados Unidos da América – a tradição norte-americana de desobediência civil, de afirmação do direito individual é uma outra parte do complexo cenário dessa cultura.

Essas questões propostas vem com a tradição da cultura ocidental desde a muito. Infelizmente meu desconhecimento das culturas milenares orientais impedem apresentar uma análise em termos planetários.

Mas, no sistema da arte ocidental, essas são questões que assumem ora um papel mais importante, ora secundário, no desenvolvimento desse sistema. Esse pêndulo é determinado pelas transformações tanto nas técnicas, como na própria sociedade em termos éticos, morais, políticos e filosóficos.

À medida que as tecnologias se tornam mais abertas, mais essas questões são problematizadas. Em parte, pelos setores que desejam manter seu status quo, buscando encontrar ou adaptar um novo conversor para que as relações estruturais não se alterem e nem o papel de seus personagens; e em parte, por setores que ao problematizar essas questões buscam avançar em termos qualitativos tornando esse sistema mais democrático e pluralista.

Assistimos a uma renascimento de certas idéias, técnicas e táticas do Renascimento. A retomada da organização e criação coletiva de artistas, a cópia e reciclagem de material como procedimento técnico de base (ctrl-c/ctrl-v), a problematização do autor como referência de estilo (e daí, a questão da apropriação se coloca) e de mercado, etc.

Confesso que a perspectiva que posso oferecer é a de um criador que lida com essas questões de forma não sistemática. Apresento reflexões que resultam de questões de trabalho, de processo criativo. Assim, as questões de mercado são ainda dificíes porque envolvem a própria sobrevivência material em meio a um diletantismo assustador.

Essas questões nos leam a outra: a figura do artista e do artesão, da arte e do artesanato.

Como mercadoria, a obra de arte no ambiente digital perde valor monetário.

Esse é um modificador importante para todos os envolvidos: artistas, atravessadores, investidores, público.

É ai que se recoloca o arista como artesão e a obra de arte como artefato. A obra de arte como conhecida, cria seu valor monetário a partir do tipo de processo de reprodução a que está submetida tanto nas artes visuais, como na indústria audiovisual.

O ambiente digital e sua auto-reprodutibilidade coloca em xeque a reprodução controlada. Coloca em xeque a “aura” de objeto único e coloca em xeque a importância do autor como realizador privilegiado ou genial. No processo de replicação digital, é de menor importância de que cabeça partiu, dadas as inúmeras e substanciais transformações que sua emissão original é submetida.

Mais isso garante alguma qualidade específica ? Sim e não.

Mas acontece uma coisa importante, a obra de arte, é de tal forma misturada, espicaçda, reciclada, remixada, que nesse processo a coordenação e manipulação assumem um papel mais importante que a concepção primeira. A obra se transforma em objeto, artefato. Daí, a idéia de que estamos retomando, num novo ambiente de ferramentas, procedimentos de artesania no trato com o estético. Isso é muito saudável.

Se busca agregar valor ao artefato artístico por outras vias, colocando o artefato artístico como um brinde de um contexto mercantil, de venda. Assim é apolítica da maioria dos sites.

Para o músico, ao lado do prazer, vem a dúvida. Ao mesmo tempo em que é interessante uma acessibilidade universal ao seu trabalho, ele vai viver do que, se a única mercadoria quem tem a venda é sua música ?

Como profissional liberal, sua existência se vê ameaçada ?

Evidente que não. O músico ainda pode buscar alternativas, como tornar ele próprio um empresário de sua acessibilidade ? Gerenciando sites na internet com suas músicas e alugando espaço publicitário, etc.

Triste horizonte...

Existe uma dimensão de liberdade e iniciativa individual que o novo ambiente propicia ainda mais.

O desafio é buscar um equilíbrio entre um momento de transição, onde os papéis, leis e comportamentos ainda estão em fase de mudança e renovação.

Certamente a resposta será individual, ainda que conjugada de forma coletiva.

Voltando a Buckminster Fuller:

Deus nos livre dos apóstolos da nova era!!!


Livio Tragtenberg é compositor. Recentemente estreou a Orquestra de Músicos das Ruas de São Paulo.

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