Resumos das apresentações

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Oficina – “A Virada Global da Arte Contemporânea nas Coleções Brasileiras”

 

Duas questões principais: 

1 – Qual a resposta hoje à expansão global da arte contemporânea no Brasil? O público brasileiro tem alguma experiência da nova situação a qual nós chamamos arte global? Ou a dicotomia entre arte internacional (ocidental) e a produção artística brasileira local ainda prevalece?  

2 – Qual é a presença institucional do contemporâneo? Qual o papel do museu, enquanto oposto às galerias e coleções privadas? Como os museus devem lidar com o “global turn” na arte de hoje em sua coleção e política de exposições? Em que medida a arte contemporânea da Ásia e da África está presente nas coleções brasileiras?  

 
  

Laymert Garcia dos Santos

A intervenção vai levantar duas perguntas, uma relativa à transformação do circuito de arte local, outra referente à transformação das noções de arte contemporânea e de arte étnica, na perspectiva de Belting e Buddensieg. Ou seja: Em que medida a criação de um mercado de arte global suscita uma “alavancagem” da arte brasileira que tira do mercado local a capacidade de definir o valor econômico e estético das obras? E em que medida as novas relações entre arte contemporânea e arte étnico encontram no Brasil um campo singular, vale dizer único, para a experimentação? 
 

Ivo Mesquita

Além das perguntas propostas pelo seminário eu colocaria duas outras perguntas:

 

I. Qual seria a diferença entre arte internacional ocidental e a produção artística brasileira local?

 

II. Porque arte asiática e africana contemporânea deveriam estar presentes em coleções Brasileiras? O que me parece importante perceber sobre as falas sobre a América Latina no Brasil é que existe um lugar entre o pós-colonial colocado como questão no debate cultural contemporâneo e a singularidade da experiência latino-americana. O pós-colonial começou com a república há duzentos anos.  

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Ana Maria de Moraes Belluzzo

Minha atenção inicial recai sobre o caráter singular da experiência artística no Brasil, com vistas a uma compreensão mais adequada das contradições inerentes a toda e qualquer reflexão sobre a produção artística contemporânea na expansão global capitalista. Espero que um melhor discernimento do sentido atribuído à arte ou adquirido pela arte em condições históricas particulares possa favorecer o exame de questões tão ambíguas como as que envolvem o projeto modernista em países periféricos e a ideologia modernista nos países centrais, posto que produção artística move-se não somente em torno do universo de sentido. Penso também nos aspectos problemáticos de uma única linha de demarcação entre modernistas e contemporâneos, assim como na necessidade de aprofundar as diferenças entre a arte em diálogo internacional e a esfera administrada da cultura global, nas sociedades de consumo de massa. 

Todas estas questões adquirem sentidos muito diversos, conforme o lugar do qual são observadas.  

Portanto não posso omitir o esforço empreendido no Brasil colonial para que as obras de arquitetura, pintura e escultura alcançassem o que era considerado “qualidade artística”. Os modos artísticos, elaborados e valorizados ao longo dos séculos europeus chegaram na América latina  sob um dilema terrível: introduzidos em países de formação colonial, povoados por nativos indígenas e que contavam com mão de obra escrava. Refiro-me às injunções da assimilação da cultura artística por meio da religiosidade ibérica, à introdução da “cultura artística” como cultura hegemônica, em uma sociedade marcada por cultos e ritos originários nas várias etnias aqui reunidas, mas também à uma sociedade colonial escravista, que estigmatizava e desvalorizava o trabalho manual. 

A construção da arte em dimensão internacional e a “grande narrativa” da historia da arte foram proezas européias. As artes ensinadas nas cidades brasileiras foram herdeiras dessas tradições internacionais e fizeram por merecê-las, enquanto em muitas regiões do país a vida se deixava permear por outras necessidades simbólicas.  

A geração modernista da primeira metade do século XX projetou, pouco a pouco, um país moderno, com desejo de superar as marcas do passado colonial, assim como negou a cultura dos estilos acadêmicos internacionais, aparecidos na capital do país, no século XIX. 

Sem negar uma superposição de tempos, que sempre acompanha a atividade artística, nota-se que primeira etapa modernista foi pensada entre artistas e homens de letras e esteve próxima à experiência dos franceses, dos alemães. Esses artistas olharam o país e precisaram romper distancias internacionais, consideraram culturas locais; contando com a contribuição trazidas por imigrados. No pós guerra, a segunda etapa da modernidade experimentaria novas técnicas industriais, vislumbrando seu alcance social e a possibilidade de reconstrução social. Foi mais do que utópica. Aliada à vontade construtiva dos arquitetos modernos, edificou uma nova capital bem no centro do Brasil, como se pudesse abreviar a distancia entre a arte para a vida. 

A emergência de novas poéticas contemporâneas coincide com “a perda das esperanças”, ao longo dos anos 60,70, quando alguns artistas encontram novos compassos internacionais, com contribuições de pequena visibilidade fora do país. 

Para nos atermos a formação de coleções em processo acelerado, destacamos os museus de arte moderna, que surgem em data próxima à criação da Bienal de São Paulo, anunciando os novos contornos do empreendimento internacional. Enquanto os museus de arte moderna constituem acervos parciais e logram nuclear a pesquisas sobre arte. Movidos pelos padrões de gestão empresarial das últimas décadas, atuam uma rápida rotatividade de eventos voltando-se sobretudo para o presente, destinados ao grande publico. Pretendo considerar  contradições reunidas neste processo em torno dos museus de arte moderna no Brasil.  
 

Martin Grossmann

A minha contribuição apropria-se do tensionamento teórico entre Roberto Schwarz “fora do lugar” e Silviano Santiago “entre-lugar” visando contextualizar a atuação do museu no Brasil. Na primeira parte da apresentação farei um breve retrospecto dessa inserção deslocada do ponto de vista de uma genealogia do Moderno no Brasil. Na segunda parte vou comparar o papel que a arte contemporanea ocupa na construção de uma esfera cultural global com a normatização operada mundialmente pela TI- Tecnologia da Informação  (essa arte como um "sistema cultural operacional" nos moldes da hegemonia do Windows da  Microsoft...), finalizando com uma proposição: que há uma possibilidade de ação diferenciada nesse contexto por meio de investimentos em mediação contextual, colaborativa, crítica e criativa.

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Ana Leticia Fialho 
 
Is Brazil on the map? Some sociological notes about the internationalization of Brazilian contemporary art world  
 
In the last 20 years, the agents of the « international » art scene (western and central) started to integrate artists from non-central regions more and more in their discourse and practices, in response to multiple demands (commercial, institutional, academic, etc.).  
 
More recently, the multiplication of the number of events and art institutions, on a worldwide scale, is designing a new map of the arts, supposely more diverse and decentralized.  
 
In Brazil, as in other « non-central » countries, to gain visibility in this new artistic geography (Garreta, 2001) is presently an important goal for many agents of the art world.  
 
But, in fact,  what is the place of Brazil in the international art scene?  Do Brazilian institutions, artists, curators, critics, art historians, reserchers have acess to international recognition (in symbolic and economic terms), and if so, in which contexts and conditions? Is the invisible academy (Moulin, 2003) renewing its gatekeepers? 
 
Based on a wide empirical research about the international presence and visibility of Brazilian art production (including analysis of museum collections, exhibition programs, critics discourses and market results), those are some of the questions I've dealt in my PhD, presented in EHESS, in Paris, in 2006, which I would like to discuss and up date in this workshop, relating them to some of the questions proposed by GAM project. 
 
For now, I would say that Brazilian art has benefit from globalization in the sense that it is indeed much more present in the international art scene than it used to be 20 years ago. Although, Brazilian art world still has the challenge of participating in the international art scene in other ways than simply reservoir of new and cheaper art supplies. 

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O Brasil está no mapa? Anotações sociológicas sobre a internacionalização do mundo das artes no Brasil. 
 
Nos últimos 20 anos, agentes da cena artística « internacional » (ocidental e central) começaram a integrar artistas de regiões « não centrais » em seus discursos e práticas, atendendo a diferentes demandas (mercadológicas, institucionais, acadêmicas, entre outras).  
 
Mais recentemente, a multiplicação do número de eventos e instituições de arte numa escala global está configurando um novo mapa das artes, supostamente mais diversificado e descentralizado. 
 
No Brasil, assim como em outros países « não centrais », a conquista de visibilidade nessa nova geografia artística se tornou um objetivo importante para muitos agentes do mundo das artes. 
 
Mas qual o lugar do Brasil na cena artística internacional ? As instituições, artistas, curadores, críticos, historiadores, pesquisadores têm acesso a algum reconhecimento internacional, do ponto de vista simbólico e econômico ? Em quais contextos e em que condições ? A academia invisível (Moulin, 2003) estaria realmente renovando o quadro de seus guardiões ? 
 
A partir de uma vasta pesquisa de campo (abrangendo análise de coleções de museus, exposições,  textos críticos, resultados de vendas no mercado internacional),  essas foram algumas das questões abordadas em minha tese de doutorado, defendida na École des Hautes Etudes en Sciences Sociales (EHESS), em Paris em 2006. São essas algumas das questões que eu gostaria de atualizar e discutir nesta oficina, relacionando-as com as questões propostas pelo projeto Global Art and the Museum. 
 
Antecipando algumas notas conclusivas,  eu diria que a produção artística brasileira tem, de certa forma, se beneficiado do processo de globalização, pois está efetivamente mais presente na cena artística internacional do que estava há 20 anos atrás. No entanto, o mundo das artes no Brasil ainda tem o desafio de conseguir se posicionar no cenário internacional como algo mais do que um simples reservatório de mercadorias artísticas novas e mais baratas. 

Ricardo Basbaum  

As a practicing artist, living in Brazil but also working internationally, I intend to develop my presentation at the GAM meeting around issues concerning directly the production of contemporary art under the current “global art” conditions. As we are facing now a new cultural economy, artists should seek for understanding which are the new institutional and social mediations in order to organize the production of their poetic/artistic interventions. Although contemporary art now spreads worldwide at biennales and museums in all the 5 continents, its formal and conceptual standards are quite conservative when compared with the experiments held by modern avantgarde and contemporary experimental artists: there has been a strong ‘adjustment’ of media and formal art languages to fit the requirements of the market and adapt to the communicational and institutional demands of our (global) times. It could be possibly argued that in fact things should happen in the opposite way: it is the artwork that should provoke and produce institucionalization, without be too much constrained by the limits of the system of art, but always establishing some negotiation with it – in fact, artists continuously fight for at least some autonomy and we always have to be aware on how to struggle for it at any given time. At the same time, contemporary art has never been so much welcomed everywhere, by corporations, institutions and the public. In that sense, I would like to discuss the need that institutions and public take an ‘experimental’ turn: it is only when all the elements and roles that compose the art system effectively assume more open and experimental positions that we could then account for some concrete change on art practice. In that sense, global times keep interesting possibilities – perhaps the emphasis should fall not anymore on the formal limits of the artpiece but over its mediations and ‘membranes’: it is over the contact zones and their conceptual layers that we will see the emergence of new problems; these are the sites for a challenging contemporary art practice and for the development of new institutional and public relations. 

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David Sperling

"Serão problematizadas algumas faces decisivas da dimensão arquitetural do museu no mundo contemporâneo globalizado, a partir de inter-relações que se processam entre a ?esfera cultural? e as suas ?instâncias espaciais?. Comporão a reflexão, portanto, dois campos de argumentação. O primeiro caracterizará a esfera cultural contemporânea segundo certos deslizamentos semânticos - e operacionais - das noções de ?evento? e ?experiência? que tem realizado. O segundo apontará algumas condições que, em muito decorrentes daqueles mesmos deslizamentos, têm emergido na arquitetura ? e, em específico, na do museu ? pelo engendramento de suportes espaciais à nova condição cultural performática. Frente ao cenário globalizado que ora se apresenta, é possível encontrar potência latente de resistência na espacialidade dos museus contemporâneos? O que dizer da situação no Brasil?" 

Fernando Oliva e Marcelo Rezende 

Os museus diante de um novo público.

MIS: um breve estudo de caso. 

Nos últimos 15 anos, as nações de economia emergente passaram por sucessivas mudanças estruturais a fim de promover a adesão desses países ao capitalismo global. Hoje, países como Brasil, Índia, China e Rússia assistem à rápida expansão de sua classe média, com milhões de novos  integrantes originários das camadas mais pobres da população. No caso brasileiro, esse processo provocou a mais notável alteração em sua estrutura social nas últimas cinco décadas.

Isso acontece no momento em que essas mesmas culturas, antes tidas como periféricas, reivindicam um papel na construção de uma história para a arte contemporânea, se recusando a ser entendidas como produção étnica ou regional. A questão que gostaríamos de lançar neste encontro é: de que modo os museus, diante desse novo público, podem dar conta dessa nova narrativa, se relacionando com seu visitante não apenas a partir da produção contemporânea na arte, mas com um pensamento contemporâneo capaz de proporcionar um entendimento desse novo momento histórico?. 

Um segundo momento da nossa fala será dedicado a comentar um caso específico, o do Museu da Imagem e do Som de São Paulo (onde um dos curadores, Fernando Oliva, trabalha como coordenador de programação), sob o ponto de vista destas recentes mudanças na sociedade brasileira.

Fundado em 1971, a instituição conheceu um período de intensa atividade cultural entre o final dos anos 80 e início dos 90. A partir da segunda metade da década passada, teve início uma profunda fase de decadência e ostracismo, cuja consequência mais grave foi o divórcio do museu com seu público antes fiel. A principal crítica que se fez ao MIS neste período estava ligada ao fato de sua programação (outrora sua principal vitrine) não mais refletir as mudanças da arte e da vida contemporâneas. Neste sentido, a instituição envelheceu, o que se evidenciou não só em seus espaços expositivos, mas sintomaticamente em seu acervo – cada vez mais obscuro, longe das vistas e do conhecimento do público. Neste ano de 2008, favorecido por um súbito interesse do Estado, o MIS se beneficiou de uma grande reforma de seus espaços de circulação e expositivos. O desafio, de agora em diante, reside justamente no seu desenho curatorial, que se reflete em sua programação, membrana permeável entre a instituição e um novo espectador a ser constituído. As dúvidas que se colocam devem passar pela resposta à questão: como um museu designado como “da imagem e do som” será capaz de fazer frente às recentes e profundas mudanças por que passou a arte e a cultura visual nas últimas décadas? E de que modo a constituição de sua coleção permanente sera capaz em alguma medida de incorporar as marcas deste percurso e suas  tranformações, para que no futuro o MIS possa oferecer à cidade um acervo de fato vivo – título de um dos projetos da nova fase: “Acervo Vivo”.

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Marcelo Mattos Araújo e Taisa Palhares 

Arte contemporânea e Pinacoteca do Estado de São Paulo.  

Em 2005, o artista brasileiro Marepe (1970), foi convidado a realizar uma exposição no Centre Pompidou por ocasião do ano do Brasil na França. Um dos trabalhos realizados, intitulado “Retrato de Bubu”, apresentava um retrato de seu avô, carpinteiro em Santo Antônio do Jesus, também cidade natal do artista, no Recôncavo Baiano (imagem 1). Apropriando-se da obra monumental de Victor Vasarely que retrata o presidente Georges Pompidou em estilo op art, Marepe coloca, não sem ironia, o retrato de Bubu, lado a lado da imagem monumental do presidente francês no hall de entrada do Centro (imagem). De mesmo tamanho, cor e material, em termos estilísticos a obra pode ser interpretada como uma “cópia” da matriz européia original.  

Como é comum na obra do artista brasileiro, um dos mais importantes de sua geração, trata-se, em primeiro lugar, de trazer a tona em seus trabalhos a relação entre a cultura de sua região, de raiz essencialmente popular, e o diálogo que ela pode ter com uma tradição erudita de matriz européia. No caso específico desse trabalho, Marepe associa a memória pessoal, afetiva à imagem pública e institucionalizada do presidente francês, afirmando, não sem ironia, o valor que uma ou outra podem ter para ele.  

No início de 2008, a Pinacoteca do Estado de São Paulo adquiriu “Retrato de Bubu” para seu acervo, graças ao patrocínio de um banco privado e com a utilização de recursos de incentivo fiscais (lei federal de apoio à cultura), a partir do reconhecimento por parte do seu corpo curatorial da importância do artista, e dessa obra em particular, para o contexto da produção contemporânea brasileira. A obra é exemplar no que diz respeito à nova posição e inserção da arte e dos artistas contemporâneos brasileiros na história da arte internacional. Marepe participa de uma geração de artistas contemporâneos que desde os anos 1990 têm conquistado um amplo trânsito global e espaço garantido nas exposições de arte contemporânea internacionais. Se por um lado é verdade que pelo menos desde os anos 1960 alguns artistas brasileiros alcançam um reconhecimento quase simultâneo aqui e no exterior, parece que somente nos anos 1990 a circulação de artistas brasileiros ganha efetivamente um patamar global, a ponto de alguns possuírem hoje mais trabalhos em museus estrangeiros do que em coleções de arte no Brasil.  

“Retrato de Bubu” também aponta para uma das principais questões sobre a formação da cultura brasileira, que é constituída, mesmo em suas manifestações populares, de matrizes culturais diversas, que colocadas em contato em determinado tempo e lugar, geram novas formas, colocando em xeque a questão da relação entre cópia e original. No caso mais específico das artes visuais, essa problemática está centrada basicamente na relação entre uma cultura visual local e modelos e práticas gerados no hemisfério norte. Neste sentido, a obra de Marepe se beneficia da comunicação global e seus intercâmbios, mas refletindo ao mesmo tempo sobre os vínculos dessa cultura global com sua cultura de origem.     

Nesta perspectiva, a Pinacoteca vem desenvolvendo uma coleção de arte contemporânea focada em artistas brasileiros ou produções produzidas no Brasil. Fundada em 1905 como parte dos esforços da burguesia paulista no contexto da modernização da cidade de São Paulo, e voltada para os padrões dos museus de arte do século XIX, em seus primórdios a coleção esteve voltada para a produção artística oficialmente consagrada. A partir de 1970, o museu vai iniciar aquisições de produção contemporânea brasileira e somente em 2003 têm início um programa mais regular de exposições de arte contemporânea que resulta em importantes aquisições para o acervo. A ênfase na produção contemporânea teve como um de seus resultados a criação do Projeto Octógono Arte Contemporânea, com curadoria de Ivo Mesquita, que desde 2003 ocupa o espaço central do edifício com instalações de artistas contemporâneos nacionais e internacionais concebidas ou adaptadas para este local. De forma simbólica, esse projeto afirma o compromisso do museu em engajar-se na leitura de seu acervo, que tem peças do século XVIII até a atualidade, a partir de um olhar do presente. Uma tentativa de releitura do passado de um ponto de vista contemporâneo, de modo que essa história passe a fazer sentido para gerações mais novas. (imagem Octógono). 

Essa escolha em colecionar produção brasileira ou feita no Brasil ou em diálogo com o Brasil é muitas vezes interpretada por colegas da área como uma posição nacionalista e provinciana. Acreditamos, porém, que a missão de um museu é dar sentido ao que ele está colecionando, tanto em relação à história do seu acervo quanto em relação ao público. Tal fato não significa que partilhamos de uma visão nacionalista que acredita na oposição de uma produção brasileira autêntica contra a arte global, em uma atitude xenófoba de negação.  

Ocorre que também é preciso se pensar, em termos práticos, na questão dos limites do museu. Por um lado, a crescente circulação global da arte brasileira coloca os museus de arte locais em uma situação delicada na medida em que se torna cada vez mais dispendiosa a aquisição de arte brasileira mediante a inflação de preços proporcionada pelo mercado de arte global. Um programa consistente de exibições que dê ênfase à arte brasileira contemporânea garante a visibilidade dessas obras e facilita, de certa forma, sua aquisição. Além de promover, ou pelo menos ter a intenção de contribuir, para uma reflexão crítica sobre essa produção.  

Além disso, acreditamos que em nosso país, o museu ainda tem um papel social de formação de uma visualidade e sua compreensão, de educação do olhar, de construção de cidadania. Em si, o museu enquanto instituição cultural também é um modelo importado que aqui ganha funções e sentidos diversos. Em primeiro lugar, a história da arte no Brasil não atingiu o caráter público que têm nos países do hemisfério norte. Por outro lado, de uma forma ou de outra, o museu precisa lidar com um público muito heterogêneo do ponto de vista da educação e da formação cultural. Há também que se considerar a inserção simbólica da Pinacoteca no espaço urbano, no caso de uma região permeada de conflitos sociais e o papel que ela pode ter nestes conflitos. Além disso, não há entre nós um reconhecimento ou consciência pública da arte como patrimônio, o que faz com que boa parte de nossas produções culturais encontre-se ainda em coleções privadas. Neste sentido, é preciso trabalhar para incentivar o Estado no sentido de reconhecer a importância de se garantir o acesso a esses bens culturais e encontrar soluções para a relação entre o público e o privado no campo cultural.  

Como desafios para o futuro, a Pinacoteca precisa dar conta de um espaço mais adaptado às necessidades e especificidades da arte contemporânea. Por outro lado, há um trabalho interno de se pensar como lidar, do ponto de vista dos departamentos educativo e de pesquisa, como trabalhar esse acervo junto ao público, posto que no Brasil ainda há uma grande dificuldade em compreender a arte contemporânea até mesmo em relação à questão das linguagens. 

Marcelo Mattos Araújo e Taisa Palhares  

Jochen Volz

Desdobrando uma instituição: Descobrindo Inhotim 
 
Inhotim Centro de Arte Contemporânea, localizado no interior de Minas Gerais, foi criado a partir de uma coleção particular e inaugurado para o público em 2006. A jovem instituição tornou-se em poucos anos uma referência mundial de produção artística, educação cultural e exposições permanentes ou semi-permanentes de um acervo de arte contemporânea. Esta apresentação discute as diversas estratégias utilizadas por Inhotim para extrapolar a dicotomia entre um cenário global e regional e alcançar um espaço de diálogo com o circuito de arte internacional.