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Diretores da Casa Daros dizem que fechamento é irrevogável e culpam custo de manutenção

Para o curador da coleção, Hans-Michael Herzog, decisão 'é uma falta de respeito' por Nani Rubin - Agência O Globo

 


A Casa Daros, em Botafogo - Guito Moreto / Agência O Globo

 

RIO - Depois de comunicar o encerramento de suas atividades a funcionários e artistas na terça-feira, a Casa Daros fecha suas portas em dezembro, após pouco mais de dois anos de funcionamento, sem dar uma explicação convincente de seus motivos. O discurso oficial fala em altos custos de manutenção do prédio (sem apresentar números), mas a pergunta que público e artistas fazem é: a instituição não previu isso em seu planejamento, que envolveu a compra, por R$ 16 milhões, de um casarão de 12 mil metros quadrados, mais um investimento de seis anos em obras ao custo de R$ 67 milhões?

A entrevista coletiva para anunciar oficialmente a decisão do conselho da Daros Latinamerica, realizada nesta quarta-feira em seu casarão em Botafogo, foi recheada de respostas vagas. O diretor da Casa Daros no Rio, Dominik Casanova, atribuiu a decisão ao alto custo de manutenção e à dificuldade de se operar uma instituição desse porte a partir da sede da coleção, em Zurique, na Suíça. Já o presidente do conselho da Daros Latinamerica, Christian Verling, citou as Olimpíadas de 2016, e os negócios nela envolvidos, como um atrativo para possíveis compradores do imóvel, num momento em que, segundo ele, a Daros vai focar em atividades internacionais, isto é, no empréstimo de suas obras para outras instituições.

— Decidimos tornar as atividades da coleção mais internacionais — disse ele. — A operação da Daros no Rio envolve custos de envio de obras para o Brasil, e há um limite para o uso dos recursos. Nós nos demos conta de que nosso esforço econômico estaria mais bem servido com essa mudança de foco do que numa operação cara e sofisticada como a da Casa Daros — afirmou.

Até a abertura oficial da instituição no Rio, em 2013, a Daros Latinamerica emprestava cerca de 250 obras anualmente a instituições de todo o mundo. Em 2008, por exemplo, a peça “Missão/Missões”, de Cildo Meireles, atualmente na mostra “Made in Brasil”, em cartaz em Botafogo, integrou a retrospectiva do artista na Tate Modern, em Londres. Em 2010, foram emprestadas peças para a Bienal de São Paulo e para a exposição de Antonio Dias na Pinacoteca de São Paulo. Com a abertura da Daros no Rio, o esforço se voltou para as exposições na cidade.

COLEÇÃO TEM 1.200 OBRAS

Entre tantas respostas imprecisas, o alemão Hans-Michael Herzog, curador responsável pela coleção e pelas exposições realizadas na Daros no Rio, foi afirmativo:

— É uma falta de respeito que uma instituição que funciona tão bem como essa tenha que terminar. Uma instituição tão viva, tão importante, requer uma responsabilidade — disse ele, o único funcionário, aparentemente, a não ser surpreendido pela decisão. — Para mim, isso já era esperado. Sem curadoria não é possível continuar um trabalho como esse.

Herzog está na Daros desde 1999, quando começou a pesquisar e a formar a coleção — hoje a maior de arte latino-americana da Europa, com 1.200 peças — para a milionária suíça Ruth Schmidheiny, ex-mulher de Stephan Schmidheiny, industrial da área de cimento. Em julho de 2014, o curador foi comunicado que seu contrato, previsto para vencer em setembro deste ano, não seria renovado. O mesmo ocorreu com o cubano Eugenio Valdés Figueroa, diretor de Arte e Educação, que saiu em dezembro, para trabalhar na Coleção Cisneros, em Miami. A notícia dos desligamentos provocou boatos sobre o fim da Casa Daros, logo desmentidos pela instituição (antes de Herzog e Figueroa, em maio de 2014, a diretora geral Isabella Rosado Nunes, que estava na Casa desde o início do projeto, já havia se desligado espontaneamente).

Agora, o curador se prepara para abrir a última exposição da Daros: “Ficción y fantasía — Arte de Cuba”, com 140 obras de 15 artistas cubanos, entre eles Tania Bruguera e a dupla Los Carpinteros, que será inaugurada em setembro.

Segundo ele, desde os primórdios da coleção, iniciada oficialmente em 2000, queria-se implantar um centro cultural na América Latina, para exibir obras adquiridas e ter uma ação educativa permanente. Inicialmente pensou-se em Havana — o projeto, segundo Herzog, chegou a ser aprovado no Ministério da Cultura de Cuba —, mas a ideia foi sepultada, em 2003, após o fuzilamento de três cubanos desertores e a condenação a penas variadas de 75 opositores do regime de Fidel.

A opção pelo Rio acabou dando à cidade um belo espaço cultural. Verling e Casanova dizem que buscam um parceiro capaz de manter o local “como uma plataforma de atividades culturais e artísticas”. Ontem mesmo, um grupo privado com atuação na área cultural manifestou interesse em conversar. A direção da Daros prometeu que, mesmo após o fim da programação (em 13 de dezembro), continuará responsável pela manutenção do prédio até que um novo gestor assuma.

Na quarta-feira, também, o prefeito Eduardo Paes se reuniu com representantes da Daros, além do secretário de Cultura, Marcelo Calero, e do presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, Washington Fajardo. Segundo Calero, Paes disse que a cidade sentiria muito o fechamento da instituição, e colocou a prefeitura à disposição para ajudar, sem detalhar como. Na reunião, os representantes da Daros queixaram-se de dificuldades para trazer obras ao Brasil por conta de burocracia.