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Justiça manda casa de Edemar virar museu

FOLHA DE S. PAULO

08 de dezembro de 2005

FOLHA Dinheiro


Justiça manda casa de Edemar
virar museu

por MÁRIO CÉSAR CARVALHO
da reportagem local

O banqueiro Edemar Cid Ferreira tem 40 dias para deixar a casa em que vive na rua Gália, no Morumbi, na zona sul de São Paulo. Com a desocupação, a Secretaria de Cultura do Estado tem 60 dias para transformar o imóvel em museu.
As duas decisões foram proferidas anteontem pelo juiz Fausto Martin de Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal. O prazo começa a contar a partir do recebimento da intimação, o que não havia ocorrido até ontem à noite.
A casa de Edemar custou R$ 147,2 milhões, segundo auditoria feita a pedido do próprio banqueiro e revelada em outubro último pela Folha. A coleção de arte é avaliada por especialistas entre US$ 20 milhões e US$ 30 milhões (R$ 43,6 milhões a R$ 65,4 milhões).
O juiz já havia decidido seqüestrar a coleção de arte do antigo dono do Banco Santos. Edemar é réu em processo federal sob acusação de gestão fraudulenta, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. O Banco Santos, cuja falência foi decretada pela Justiça estadual em setembro, deixou um rombo de R$ 2,2 bilhões.
A sentença destitui Edemar do papel de fiel depositário das obras de arte, categoria na qual o juiz inclui a casa: "O imóvel da rua Gália tem sido tratado por este juízo apenas como obra de arte, porque assim efetivamente comprovou o laudo pericial, não se podendo, portanto, visualizá-la sob a ótica dos interesses econômicos dos credores".
Com isso, o juiz descarta o eventual leilão da casa e da coleção para ressarcir investidores que perderam recursos no Banco Santos.
Edemar foi destituído do papel de depositário das obras por três razões, de acordo com a sentença:
1) Permitiu que dezenas de obras etnográficas, principalmente de arte plumária de índios brasileiros, deteriorassem-se no depósito da Cid Collection ao parar de pagar as contas de água, luz e serviços de segurança;
2) Resistiu a entregar três peças arqueológicas marajoara; e
3) Omitiu do juiz que tinha réplicas de obras em sua coleção ao afirmar que só possuía originais. Laudo assinado por dois peritos designados por De Sanctis aponta a existência de réplicas de uma obra de Aleijadinho (1730-1814), de uma escultura de Alfredo Ceschiatti (1918-1989) e uma provável cópia de um oratório barroco. Os peritos notaram também que uma escultura de Maria Martins (1894-1973) não tem assinatura, numeração e identificação do fundidor, "o que reforça a conclusão no exame pericial de tratar-se de réplica".
Segundo o juiz, "essas condutas (...) configuram ato de deslealdade com o juízo, além de encontrar vedação no ordenamento legal brasileiro e em convenções que regem a questão".
O procurador da República Silvio Luís Martins de Oliveira, que investigou a bancarrota do Banco Santos, diz que não dá para saber se as réplicas foram feitas depois do seqüestro da coleção, determinado pela Justiça em fevereiro deste ano, ou se faziam parte da coleção original do banqueiro.
Segundo Martins de Oliveira, o "abandono" do galpão na Lapa, na zona oeste, não pode ser justificado pela situação econômica de Edemar. O banqueiro declarou à Justiça que recebe R$ 100 mil de aluguel de imóveis e outros R$ 100 mil de amigos. "Houve negligência no cuidado com as obras de arte. No segundo semestre, as obras foram deixadas sem segurança no depósito."
A Justiça seqüestrou outros oito imóveis de empresas de Edemar. O juiz determinou ainda que a Polícia Federal e a Polícia Militar vigiem a casa para evitar o eventual desaparecimento de obras.