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Masp nas trevas

O francês Claude Mollard, fundador do Centro Cultural Georges Pompidou, diz que é uma "vergonha" a situação que vive o museu paulista

 

FOLHA DE S. PAULO

28 de maio de 2006

FOLHA +(c)ultura


 

Masp nas trevas

MARCOS STRECKER
MARIO GIOIA

DA REDAÇÃO

Para o francês Claude Mollard, fundador de um dos principais museus de arte contemporânea do mundo, o fechamento do Museu de Arte de São Paulo (Masp), na última terça-feira, por falta de eletricidade foi "um escândalo" e "um absurdo".
Economista, sociólogo e especialista em gestão cultural, um dos criadores e ex-secretário-geral do Centro Cultural Georges Pompidou, o famoso Beaubourg, em Paris, Mollard foi, a partir de 1981, assessor do ministro da Cultura francês Jack Lang, que inaugurou uma nova política para os museus e as artes plásticas no país.
Criou e geriu várias instituições de artes na França, tendo presidido o Centro Nacional da Fotografia, entre outros. Veio ao Brasil para ministrar um curso sobre história da arte no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro.
Ele também é co-autor do lançamento "Frans Krajcberg -La Traversée du Feu" (Frans Krajcberg -A Travessia do Fogo, Isthme Éditions), a primeira biografia do artista plástico polonês naturalizado brasileiro. Mollard falou à Folha por telefone, do Rio.  

FOLHA - O sr. acompanhou o incidente envolvendo o Masp? Já viu um museu dessa importância ficar fechado por falta de pagamento da conta de luz? CLAUDE MOLLARD - É um absurdo. Nunca tinha ouvido falar de algo assim. Nem estou acreditando. Ou o museu está sem recursos porque o poder público não os está repassando ou cuidou mal do dinheiro. Ou a companhia de eletricidade é muito má. Dirijo um museu em Montparnasse. Certa vez, a prefeitura deixou de nos repassar dinheiro e a companhia telefônica cortou nossas linhas. Não éramos responsáveis, ligamos para a companhia e religaram no dia seguinte. É delicado, não vou abordar a questão política, dos responsáveis, mas observo o resultado. Não é normal. É um escândalo, uma vergonha.

FOLHA - Como o sr. avalia a manutenção dos museus no Brasil? Como é essa percepção no exterior? MOLLARD - A impressão que temos é a de que o Brasil não se interessa muito pelos seus museus. Há alguns anos, fui ao Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, no Rio, e estava chovendo. Havia um problema no prédio e caía água sobre uma múmia egípcia. Também há o episódio do incêndio que ocorreu no Museu de Arte Moderna, no Rio [em julho de 1978, quando cerca de 90% do acervo foi destruído]. Se isso continuar, não haverá mais museus no Brasil. Há a tentativa aqui de criar um museu dedicado às obras do escultor Frans Krajcberg, mas não há dinheiro. Os museus são essenciais para a educação, para os estudantes, para a história etc. Isso não quer dizer que não haja várias iniciativas importantes aqui. [O problema no Masp] não é bom para a imagem do Brasil. Acho que está claro que não é feito o suficiente. Parece que aqui há mais interesse pela música e pela dança. A arte brasileira é uma prioridade, é uma pena que o Masp esteja sem luz.

FOLHA - O que o sr. acha das formas de financiamento dos museus, da relação entre financiamento público e privado? O que o sr. achou da recente iniciativa de construir uma unidade do Guggenheim no Rio? MOLLARD - O problema do financiamento privado é que em um dia funciona, no outro não. Acho que seria bom se houvesse um novo museu de arte moderna no Rio. Mas sempre há o problema de dinheiro. É uma questão de prioridade.
Museus são importantes, falam da nação, das raízes. É necessário também que sejam feitas grandes exposições, que sejam financiadas. Quando fui assistente de Lang, transformamos a arte em prioridade. Gosto muito do Brasil, das artes brasileiras. Espero que volte a luz por aqui. "Fiat lux".

 

 


 

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Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2805200615.htm