É preciso confrontar as imagens vagas com os gestos claros - Programação
O DEBATE DA EXPOSIÇÃO É PRECISO CONFRONTAR AS IMAGENS VAGAS COM OS GESTOS CLAROS, COM PAULO BRUSCKY, ANDRÉ SEVERO E PAULO MIYADA MUDOU DE DATA E AGORA ACONTECERÁ NO DIA 6 DE OUTUBRO, SÁBADO, ÀS 15H
A PROGRAMAÇÃO FICA ASSIM:
6 DE OUTUBRO
15H - DEBATE É PRECISO CONFRONTAR...
PAULO BRUSCKY, ANDRÉ SEVERO e PAULO MIYADA debatem o tema da exposição e apresentam experiências correlacionadas.
18h - PERFORMANCES DE JÚLIA ROCHA E JULIANA MORAES
7 DE OUTUBRO
18H - PERFORMANCES DE JÚLIA ROCHA E JULIANA MORAES
ATÉ 26 DE OUTUBRO
EXPOSIÇÃO ABERTA COM OBRAS DE BRUCE NAUMAN, CARLOS MONROY (PERFORMANCE), CIA LUDENS, CLARA IANNI, CLEVERSON SALVARO, DENNIS OPPENHEIM, DOUGLAS PÊGO, ELAINE ARRUDA, FELIPE SALEM, FRANCESCA WOODMAN, GISELA MOTTA E LEANDRO LIMA, GUILHERME PETERS, GUSTAVO SPERIDIÃO, GUY VELOSO, HENRIQUE CESAR, JÚLIA ROCHA (PERFORMANCE), JULIANA MORAES (PERFORMANCE), MARCELO SOLÁ, MARCONE MOREIRA, NINO CAIS, PAULO BRUSCKY, PEDRO FRANÇA, THEO CRAVEIRO E VIJAI PATCHNEELAM
OFICINA CULTURAL OSWALD DE ANDRADE
RUA TRÊS RIOS, 363 - BOM RETIRO
PERTO DO METRÔ TIRADENTES
SEG-SEX 9H ÀS 21H
SÁB 10H ÀS 17H30
É PRECISO CONFRONTAR AS IMAGENS VAGAS COM OS GESTOS CLAROS
Em Agosto de 1967, Jean-Luc Godard lançou o filme La Chinoise, sobre um grupo de jovens estudantes que aproveitaram a viagem de férias dos pais de uma garota para transformar seu apartamento em uma célula revolucionária maoísta. Articulando procedimentos gráficos e audiovisuais desenvolvidos por Godard ao longo da década com informações e ideias dos próprios atores participantes - entre eles Anne Wiazemsky (Véronique), então namorada do diretor -, o filme oscila entre uma homenagem inflamada e uma paródia irônica do engajamento estudantil que culminaria menos de um ano depois nos acontecimentos de Maio de 1968. Numa das paredes do apartamento, aparece uma frase-síntese da visão política engendrada no filme: É PRECISO CONFRONTAR AS IDEIAS VAGAS COM AS IMAGENS CLARAS. Sucinta, deixa claro o incômodo do cineasta em relação aos jargões e palavras de ordem acumulados pela esquerda francesa e que, interpretados de maneira vaga por seus defensores, acabavam falhando em dar forma a projetos claros, política e esteticamente. Críticas como essa geraram protestos entre diversos grupos da esquerda que, após a estreia do filme, não tardaram em taxar Godard como conservador e acadêmico. Ainda assim, os desdobramentos de Maio de 68, ou melhor, a sua relativa falta de desdobramentos, reiteraram em parte a precisão de seu comentário, que hoje pode ser colocado lado a lado com o desabafo de Caetano Veloso em sua célebre (não) interpretação de “É proibido proibir” em 15 de setembro de 1968, no terceiro Festival Internacional da Canção.
Hoje, diante das constantes recuperações do repertório da contracultura dos anos 1960 e da procura por formas de engajamento político que lidem com o enfraquecimento de fóruns tradicionais como os sindicatos e os diretórios estudantis, parece pertinente ressoar a frase pintada no apartamento de Véronique. No entanto, justamente pela constante inversão de significado que muitos dos jargões da contracultura sofreram através da captura pela mídia e canais responsáveis pela reafirmação do desejo de consumo, espetáculo e manutenção da ordem atual, convém revisar a frase de 1967. Repetir o confronto das ideias vagas pelas imagens claras poderia muito bem ser o mote de uma propaganda de uma marca de energéticos ou de roupas esportivas, uma vez que hoje são alardeadas como claras as imagens geradas em alta definição, cores saturadas e passíveis de serem vistas em 3D, em transmissão simultânea. O problema é que essas são imagens, embora nítidas, opacas enquanto artefatos ideológicos. Oscilantes, elas se oferecem como cristais refratores que espelham distintos contornos a cada momento para cada observador. Sua suposta transparência e nitidez disfarçam inúmeras decisões dissociadas da sua superfície visível. Tal natureza de imagens é preponderante inclusive em certos territórios da arte contemporânea, que oscilam de forma a oferecer objetos de bela manufatura, mas que escusam-se de uma posição ideológica, através de configurações “meio-bizarras/meio-elegantes” , “meio-descuidadas/meio- virtuosas”, “meio-apropriadas/meio- originais”, e assim por diante.
Cabe propor, hoje, uma inversão: É PRECISO CONFRONTAR AS IMAGENS VAGAS COM OS GESTOS CLAROS. O que foi dito antes aponta o que seriam essas imagens vagas; resta, portanto, esclarecer o que podem ser os gestos claros que devem se contrapor a elas. Caberá à exposição, e a seu ciclo de performances e debate, explorar algumas hipóteses acerca dos gestos claros que podem ser propostos desde o campo da arte contemporânea. Primeiro, existem trabalhos que reverberam certo legado do expressionismo abstrato norte-americano, na medida em que são produções de imagem intrinsecamente associadas ao gestual do corpo e à sintaxe linguística de seus autores. Depois, obras que focam-se nas relações entre o corpo e o espaço e entre o corpo e outros corpos como dispositivos de definição de territórios e espacialidades articuladas com a presença do artista na realização de sua obra. Por fim, processos criativos que, por sua acentuada clareza de conceito e método, podem sobrepor-se a sistemas opacos da realidade, revelando os contornos de partes de suas estruturas antes ocultas.
WE MUST CONFRONT VAGUE IMAGES WITH CLEAR GESTURES
In August, 1967, Jean-Luc Godard premiered the movie La Chinoise, about a group of young students that transformed a girl's apartment into a revolutionary Maoist cell after her parents went on vacation. Articulating graphic and audiovisual methods developed by Godard throughout that decade with information and ideas provided by the main actors in the picture - among them, Anne Wiazemsky (Véronique), the director's girlfriend at the time - the movie ranges from an inflamed homage to an ironic parody of the students' engagement that would culminate less than a year later in the events of May, 1968. The motto of the political view outlined in the movie is written on one of the walls in the apartment: ONE MUST CONFRONT VAGUE IDEAS WITH CLEAR IMAGES. Concise, it displays the director’s discomfort with the jargon and catchphrases accumulated by the French left wing, which, vaguely interpreted by their advocates, ended up falling short in creating clear projects, politically and aesthetically. Such criticisms generated protests among several left wing parties, which, after the movie premiere, rapidly labeled Godard as conservative and academic. However, the unfolding of the events that occurred in May 1968, or, more precisely, the relative lack of unfolding, partially reaffirmed the accuracy of Godard's analysis, which can today be placed side by side with Caetano Veloso’s outburst during his renowned (not) singing of “É proibido proibir” (it’s forbidden to forbid), on September 15, 1968, at the third Festival Internacional da Canção (International Song Festival).
Today, as the counterculture repertoires of the 1960s are constantly recuperated and one pursues new forms of political commitment that can cope with the weakening of the traditional forums - such as labor and student unions -, the sentence on the wall in Veronique’s apartment seems even more relevant. Nevertheless, exactly because of the frequent distortions that the counterculture tactics have undergone through their use by the media and the agents responsible for reaffirming the wish for consumerism, spectacle and maintenance of the current status quo, it is time to review the 1967 phrase. Reediting the conflict between vague ideas and clear images could certainly be the catchphrase of an energy drink or sportswear publicity campaign, since today are allegedly clear the images generated in high definition, with saturated colors and seen in 3D, in simultaneous transmission. The problem is that these images, though sharp, are opaque as ideological strategies. Oscillating, they work as refractor crystals that mirror different shapes at each moment for each observer. Their alleged transparency and sharpness conceal several decisions dissociated from its visible surface. This kind of image is also predominant in specific contemporary art territories, changing its appearance in order to offer objects of fine manufacture while fleeing from an ideological stand, through displays “half-bizarre/half-elegant”, “half-neglected/half-virtuous”, "half-taken/half-original", and so forth.
It is suitable, today, to suggest an inversion: “ONE MUST CONFRONT VAGUE IMAGES WITH CLEAR GESTURES”. What has been said defines the nature of vague images but we still need to elucidate which clear gestures should oppose them. It is up to the exhibition, and its performances and debate, to explore some hypotheses as to the clear gestures that can be proposed from the contemporary art territory. First, there are works that resonate the North-American abstract expressionism legacy, through production of images intrinsically associated with the bodily gestures and their authors’ linguistic syntax. Then, works focused on the relations between body and space and between body and other bodies as devices that define spaces and territories articulated with the artists’ presence during the execution of their work. Finally, creative processes that, for for their remarkable clarity of concept and method, can overlap opaque reality systems, partially revealing the outline of their once concealed structures.
Em Agosto de 1967, Jean-Luc Godard lançou o filme La Chinoise, sobre um grupo de jovens estudantes que aproveitaram a viagem de férias dos pais de uma garota para transformar seu apartamento em uma célula revolucionária maoísta. Articulando procedimentos gráficos e audiovisuais desenvolvidos por Godard ao longo da década com informações e ideias dos próprios atores participantes - entre eles Anne Wiazemsky (Véronique), então namorada do diretor -, o filme oscila entre uma homenagem inflamada e uma paródia irônica do engajamento estudantil que culminaria menos de um ano depois nos acontecimentos de Maio de 1968. Numa das paredes do apartamento, aparece uma frase-síntese da visão política engendrada no filme: É PRECISO CONFRONTAR AS IDEIAS VAGAS COM AS IMAGENS CLARAS. Sucinta, deixa claro o incômodo do cineasta em relação aos jargões e palavras de ordem acumulados pela esquerda francesa e que, interpretados de maneira vaga por seus defensores, acabavam falhando em dar forma a projetos claros, política e esteticamente. Críticas como essa geraram protestos entre diversos grupos da esquerda que, após a estreia do filme, não tardaram em taxar Godard como conservador e acadêmico. Ainda assim, os desdobramentos de Maio de 68, ou melhor, a sua relativa falta de desdobramentos, reiteraram em parte a precisão de seu comentário, que hoje pode ser colocado lado a lado com o desabafo de Caetano Veloso em sua célebre (não) interpretação de “É proibido proibir” em 15 de setembro de 1968, no terceiro Festival Internacional da Canção.
Hoje, diante das constantes recuperações do repertório da contracultura dos anos 1960 e da procura por formas de engajamento político que lidem com o enfraquecimento de fóruns tradicionais como os sindicatos e os diretórios estudantis, parece pertinente ressoar a frase pintada no apartamento de Véronique. No entanto, justamente pela constante inversão de significado que muitos dos jargões da contracultura sofreram através da captura pela mídia e canais responsáveis pela reafirmação do desejo de consumo, espetáculo e manutenção da ordem atual, convém revisar a frase de 1967. Repetir o confronto das ideias vagas pelas imagens claras poderia muito bem ser o mote de uma propaganda de uma marca de energéticos ou de roupas esportivas, uma vez que hoje são alardeadas como claras as imagens geradas em alta definição, cores saturadas e passíveis de serem vistas em 3D, em transmissão simultânea. O problema é que essas são imagens, embora nítidas, opacas enquanto artefatos ideológicos. Oscilantes, elas se oferecem como cristais refratores que espelham distintos contornos a cada momento para cada observador. Sua suposta transparência e nitidez disfarçam inúmeras decisões dissociadas da sua superfície visível. Tal natureza de imagens é preponderante inclusive em certos territórios da arte contemporânea, que oscilam de forma a oferecer objetos de bela manufatura, mas que escusam-se de uma posição ideológica, através de configurações “meio-bizarras/meio-elegantes” , “meio-descuidadas/meio- virtuosas”, “meio-apropriadas/meio- originais”, e assim por diante.
Cabe propor, hoje, uma inversão: É PRECISO CONFRONTAR AS IMAGENS VAGAS COM OS GESTOS CLAROS. O que foi dito antes aponta o que seriam essas imagens vagas; resta, portanto, esclarecer o que podem ser os gestos claros que devem se contrapor a elas. Caberá à exposição, e a seu ciclo de performances e debate, explorar algumas hipóteses acerca dos gestos claros que podem ser propostos desde o campo da arte contemporânea. Primeiro, existem trabalhos que reverberam certo legado do expressionismo abstrato norte-americano, na medida em que são produções de imagem intrinsecamente associadas ao gestual do corpo e à sintaxe linguística de seus autores. Depois, obras que focam-se nas relações entre o corpo e o espaço e entre o corpo e outros corpos como dispositivos de definição de territórios e espacialidades articuladas com a presença do artista na realização de sua obra. Por fim, processos criativos que, por sua acentuada clareza de conceito e método, podem sobrepor-se a sistemas opacos da realidade, revelando os contornos de partes de suas estruturas antes ocultas.
WE MUST CONFRONT VAGUE IMAGES WITH CLEAR GESTURES
In August, 1967, Jean-Luc Godard premiered the movie La Chinoise, about a group of young students that transformed a girl's apartment into a revolutionary Maoist cell after her parents went on vacation. Articulating graphic and audiovisual methods developed by Godard throughout that decade with information and ideas provided by the main actors in the picture - among them, Anne Wiazemsky (Véronique), the director's girlfriend at the time - the movie ranges from an inflamed homage to an ironic parody of the students' engagement that would culminate less than a year later in the events of May, 1968. The motto of the political view outlined in the movie is written on one of the walls in the apartment: ONE MUST CONFRONT VAGUE IDEAS WITH CLEAR IMAGES. Concise, it displays the director’s discomfort with the jargon and catchphrases accumulated by the French left wing, which, vaguely interpreted by their advocates, ended up falling short in creating clear projects, politically and aesthetically. Such criticisms generated protests among several left wing parties, which, after the movie premiere, rapidly labeled Godard as conservative and academic. However, the unfolding of the events that occurred in May 1968, or, more precisely, the relative lack of unfolding, partially reaffirmed the accuracy of Godard's analysis, which can today be placed side by side with Caetano Veloso’s outburst during his renowned (not) singing of “É proibido proibir” (it’s forbidden to forbid), on September 15, 1968, at the third Festival Internacional da Canção (International Song Festival).
Today, as the counterculture repertoires of the 1960s are constantly recuperated and one pursues new forms of political commitment that can cope with the weakening of the traditional forums - such as labor and student unions -, the sentence on the wall in Veronique’s apartment seems even more relevant. Nevertheless, exactly because of the frequent distortions that the counterculture tactics have undergone through their use by the media and the agents responsible for reaffirming the wish for consumerism, spectacle and maintenance of the current status quo, it is time to review the 1967 phrase. Reediting the conflict between vague ideas and clear images could certainly be the catchphrase of an energy drink or sportswear publicity campaign, since today are allegedly clear the images generated in high definition, with saturated colors and seen in 3D, in simultaneous transmission. The problem is that these images, though sharp, are opaque as ideological strategies. Oscillating, they work as refractor crystals that mirror different shapes at each moment for each observer. Their alleged transparency and sharpness conceal several decisions dissociated from its visible surface. This kind of image is also predominant in specific contemporary art territories, changing its appearance in order to offer objects of fine manufacture while fleeing from an ideological stand, through displays “half-bizarre/half-elegant”, “half-neglected/half-virtuous”, "half-taken/half-original", and so forth.
It is suitable, today, to suggest an inversion: “ONE MUST CONFRONT VAGUE IMAGES WITH CLEAR GESTURES”. What has been said defines the nature of vague images but we still need to elucidate which clear gestures should oppose them. It is up to the exhibition, and its performances and debate, to explore some hypotheses as to the clear gestures that can be proposed from the contemporary art territory. First, there are works that resonate the North-American abstract expressionism legacy, through production of images intrinsically associated with the bodily gestures and their authors’ linguistic syntax. Then, works focused on the relations between body and space and between body and other bodies as devices that define spaces and territories articulated with the artists’ presence during the execution of their work. Finally, creative processes that, for for their remarkable clarity of concept and method, can overlap opaque reality systems, partially revealing the outline of their once concealed structures.
