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Projeto ELOÍSA CARTONERA: ENTREVISTA com Javier Barilaro

Projeto Eloísa Cartonera: Entrevista com Javier Barilaro

 

Eloisa Cartonera, projeto existente há três anos na cidade de Buenos Aires, está presente na 27ª Bienal de São Paulo no andar dedicado aos "projetos construtivos", em um espaço que reproduz um ateliê de trabalho, com a presença dos artistas Javier Barilaro e Ramona Leiva, do colaborador-editor Cristian De Napoli e dos filhos de catadores de papel brasileiros selecionados para o projeto. O trabalho do grupo consiste na edição de textos de literatura latino-americana, cedidos pelos autores, para os quais se fazem capas de papelão pintadas com o nome do livro e do autor, confeccionadas pelos próprios catadores de papel. Javier Barilaro qualifica o projeto como uma Escultura Social, a partir da noção de Joseph Beuys ("como moldamos ou damos forma ao mundo em que vivemos") um terreno no qual se encontram estética e política. A breve entrevista que se segue procurou debater as relações entre esses dois âmbitos, a partir do exemplo de um trabalho concreto.

 

Número: Como vocês trouxeram o projeto para a Bienal de São Paulo?

Javier: Quando nos convidaram, debatemos o que faria um grupo como o nosso na Bienal e decidimos vir para começar um projeto aqui. Estamos trabalhando com filhos de catadores de papelão brasileiros, tentando publicar novos títulos locais para que a coisa arranque e siga sozinha, como já acontece em Lima, no Peru e na Bolívia. A idéia não é a de autoria nem a de empresa que vende, mas a de buscar um intercâmbio humanístico, em que todos aprendam de tudo.

 

Número: Como ocorre a relação entre os artistas, os autores e os catadores?

Javier: No Brasil, os catadores estão muito mais organizados, têm sua cooperativa há 14 anos. Quero levar para a Argentina o que aprendi aqui. Quando iniciamos o projeto em São Paulo, decidimos que os catadores seriam os organizadores. Em novembro virá uma catadora que trabalha conosco e veremos o que acontece. Antes de vir para cá, tomei a decisão de que viria como o organizador porque ainda não atingimos um ponto em que os catadores tenham consciência do que estão fazendo. Eles trabalham quando pagamos, se não pagamos, não vêm. Mas entendo: o que um catador pode ter em comum com a literatura ou com a arte? Então não pretendo, tampouco eles, que se apoderem totalmente, embora a utopia que perseguimos é de que eles se encarreguem de tudo e que eu vá fazer outras coisas. Mas estar na literatura ou na arte vem quando já há uma porção de outras coisas. Todos nós, de classe média, mal ou bem comemos, mal ou bem estudamos, e os catadores estão totalmente fora. Não podemos nos medir com a mesma vara, e embora queiramos ser todos iguais, não podemos ser, por infinitas circunstâncias. Por fim, por mais que nosso grupo faça algo mais concreto, seguramente o que restará será o simbólico: somos iguais a todos os artistas. Faço o possível, mais não se pode ou, pelo menos, eu não descobri. Teria que deixar de ser artista e passar a ser político e, para ser político, precisaria começar a negociar... Prefiro ficar aqui e gerar uma potência simbólica.

 

Número: É possível separar um campo estético de um campo da ação social e política?

Javier: Para mim não. Mas prefiro esclarecer. Trabalhamos no campo estético, somos artistas. E, de saída, afirmo: minha estética supõe que é mais belo quando há inclusão.


Número: Você deve escutar bastante a crítica de que seu trabalho tem uma eficácia social limitada. Você acha que esta é uma crítica válida ao projeto?

Javier: Lamentavelmente quem tem a eficácia alta é o Estado. Segundo, nós trabalhamos com duas ou três pessoas, não são dois ou três objetos. Terceiro: o que fica para a arte? Porque acho que a arte, quando se mete com o político e com o social, gera apenas símbolos, ou seja, documentos, discussões e debates, nunca mais que isso. Nós fazemos isso e ainda damos concretamente trabalho para duas ou três pessoas. Eu durmo tranqüilo. Eu penso que há de se fazer o possível, se cada um faz o possível, atingimos o impossível.

 

Site do projeto:  http://www.eloisacartonera.com.ar