Você está aqui: Página Inicial / Sobre / Texto de Apresentação da Coleção Fórum Permanente

Texto de Apresentação da Coleção Fórum Permanente

Coleção Fórum Permanente

As ideias suspendem o tempo em suas lucubrações, mas estão sujeitas ao tempo quando operacionalizadas. O Fórum Permanente é uma plataforma de mediação cultural que se inspira nos museus-laboratório das décadas de 1960 e 1970, ações colaborativas em museus de arte que incentivaram, entre outros, práticas artísticas experimentais, novas formas de exposição, de comunicação e de divulgação, bem como revisões críticas das metodologias da museologia tradicional. Na Europa, entre os condutores desses processos crítico-criativos estão Pontus Hulten, Harald Szeemann, Willem Sandberg, Jean Leering e aqui no Brasil, Walter Zanini, como primeiro diretor do Museu de Arte Contemporânea da USP de 1963 a 1978 e depois como curador da 16ª e 17ª Bienais de São Paulo. Em meados da década de 1990, novas estruturas mediáticas e de informação motivaram investigações e experimentos no desenvolvimento de extensões virtuais dos equipamentos culturais existentes. Na Universidade de São Paulo, por meio de uma atuação crítica contextual-institucional pautada por demandas, questionamentos, dúvidas e ações de risco, foram desenvolvidas várias frentes. Em 1994, foi criado o Laboratório Interdepartamental e Multidisciplinar de Interfaces Eletrônicas no NICA – Núcleo de Informática da Escola de Comunicações e Artes e em 1995 foi desenvolvida a primeira interface da USP na internet. O projeto USPonline, mais do que um portal de informação online, configurava-se como uma metáfora de Universidade ao se conformar como interface cultural, relacionando sistemas de cultura e conhecimento com sistemas de informação. Antes do lançamento do Fórum Permanente em 2003, a ideia de um museu na virtualidade foi extensivamente debatida em um workshop no NICA em março de 1996, por um grupo de artistas, produtores culturais e alunos de pós-graduação. Deste debate nasceu o museu do (in)consequente coletivo (cf. http://www.eca.usp.br/prof/martin/in_consequente/).

Quais são os alicerces de um museu na virtualidade? Como este se constitui e evolui a partir destes alicerces? Como se mantém e se expande? Quais relações devem ser motivadas nos trâmites entre o real e o virtual? Comum acordo: o foco não é a forma ou o formato ou até mesmo o suporte. Ou seja, a preocupação primeira não é com um edifício, um objeto, uma obra, um livro ou um texto – alicerces da Cultura Material – mas sim com o processo: a formatação, o desenvolvimento, as dinâmicas e a manutenção de um contexto museológico na virtualidade, em contraponto ao real, a um contexto museológico no espaço-tempo do sistema cultural local relacionado, por sua vez, a uma condição cultural globalizada. A internet e sua interface gráfica batizada de World Wide Web, com sua simplicidade, flexibilidade e acessibilidade de uso e desenvolvimento, tornou-se o ambiente mais propício para o desenvolvimento de uma proposta de museu-laboratório na atualidade, capaz de simultaneamente corresponder às demandas locais e globais. A trajetória do Fórum Permanente permite algumas respostas: Quais são os alicerces de um museu na virtualidade? A sociedade. Como o museu na virtualidade se constitui e evolui a partir destes alicerces? Como se mantém e se expande? Pelos estímulos propostos pela sociedade, pelo compromisso comunitário, pelo trabalho coletivo amparados por uma estrutura que permita a comunicação, o intercâmbio e a interação entre as partes que a configuram. Por sua vez, que tipo de sociedade é esta? Uma sociedade aberta, democrática, transparente, pública, avessa à segmentação do conhecimento e, assim, à reserva de mercado das especialidades. Uma sociedade cuja missão seja a de ofertar o livre acesso à informação de qualidade e ao conhecimento gerados em seus domínios e fora deles, fontes externas selecionadas por afinidades eletivas, conceituais, filosóficas bem como operacionais. Nos primórdios, esta sociedade poderia ter sido aquela inicialmente formada pelo grupo participante da oficina de 1996, autonomeados de os (in)consequentes. Esta sociedade dos (in)consequentes seria assim a base de lançamento para um museu do (in)consequente coletivo. Este museu-plataforma vingou por alguns anos (até 2001), pelo menos como interface sugestiva na internet, mas minguou por falta de recursos, dispersão da sociedade original e principalmente por estar avançada no tempo. A sociabilização de seus ideais, ou seja, o processo de absorção de suas ideias por um contexto sociocultural, essencial para a sua concretização, só começou a ocorrer em meados de 2003 com a elaboração do projeto apresentado ao Goethe-Institut de São Paulo Fórum Permanente: Museus de Arte entre o Público e o Privado, que, como plataforma de mediação crítica se propunha, pelo menos durante dois anos, incentivar e coordenar o debate acerca do papel do Museu de Arte na contemporaneidade em um contexto cultural local onde boa parte dos museus e instituições congêneres viviam (vivem) em crises institucionais crônicas, permanentes.

O tempo é fascinante. Os dois anos inicialmente pensados para a duração do projeto se multiplicaram. O Fórum Permanente completou em outubro de 2010 sete anos de vida. A consequência e inconsequência desta empreitada demonstram que certas ideias permanecem no tempo, mesmo que em hibernação por um certo tempo, acabam encontrando o momento propício para serem definitivamente ativadas, concretizadas. Se a sociedade no momento inaugural era constituída por um pequeno grupo, os (in)consequentes, hoje a Sociedade Fórum Permanente é formada por uma multidão. Não só indivíduos, instituições e outras formas de organização coletiva como também um público expandido, de difícil qualificação, uma vez que o site é mundialmente acessado. A Sociedade Fórum Permanente constituiu-se assim em uma rede e por que não, em uma complexidade. Como plataforma de ação e mediação cultural, no encontro/passagem entre o real e a virtualidade, atua nacional e internacionalmente nas diferentes instâncias do sistema da arte contemporânea. Estrutura-se em uma rede de parcerias com diferentes agentes do campo da arte e da cultura, instituições de arte e agências culturais estrangeiras. Sua ação compreende a curadoria de eventos discursivos e dialógicos, a organização de oficinas de curadoria, a coordenação de pesquisas, a edição de uma revista, a organização de publicações especializadas, a divulgação de eventos relacionados a instituições de arte e à arte contemporânea, a transmissão online de atividades e a edição de relatos críticos sobre essas atividades. O website <http://forumpermanente.org/> funciona de forma híbrida: como museu-laboratório, como revista, como arquivo vivo, acolhendo projetos, pesquisas, debates e dossiês, bem como disponibilizando textos e registros em vídeo das atividades realizadas. O conteúdo do site é publicado sob uma licença livre, permitindo sua reprodução para fins não comerciais. Sabemos que é de grande utilidade a professores, pesquisadores, artistas, estudantes, entre outros. Em São Paulo, as instituições culturais voltadas à arte contemporânea participam desta rede. O Fórum Permanente concentra suas atividades em São Paulo, mas já apoiou eventos em outras cidades, como Recife, Salvador, Madri e Arnhem, buscando descentralizar-se. Tem envolvido em suas atividades diferentes articuladores da arte contemporânea no Brasil e do cenário internacional. Tendo realizado até aqui mais de 110 eventos presenciais cujos registros e relatos se encontram disponíveis em nosso arquivo, produz em média quinze eventos anuais, que vão de palestras e workshops a encontros e seminários. O site hoje é uma referência não só nacional como internacionalmente. Com seus 4.700 mega bits de tamanho, 2.170 páginas, 1.820 imagens, o site é acessado em média por 320 visitantes diários que folheiam 875 páginas, usuários estes provenientes de 337 cidades no Brasil e de 1.240 cidades no mundo (dados referentes a 2010). A abrangência internacional inclui países como Argentina, Chile, Colômbia, Equador, Guatemala, Cuba, México, Angola, Moçambique, Ilha da Madeira, Coreia, Suécia, Noruega, Inglaterra, Irlanda e outros países da Europa Continental, bem como os Estados Unidos e o Canadá. Há dados curiosos como o fato de Berlim ser a 9ª cidade, Lisboa a 11ª, Madrid a 17ª e Bogotá a 22ª no ranking das cidades que mais acessam o site.

Com a longevidade e a consistência alcançadas, há hoje a possibilidade de lançarmos novos desafios para o Fórum Permanente. Um deles, já iniciado, é o de desenvolver pesquisas de âmbito nacional e internacional. A primeira destas pesquisas opera por meio de uma parceria tripartite entre o Ministério da Cultura, a Fundação Iberê Camargo e o Fórum Permanente. Almeja mapear a economia das exposições no Brasil nos últimos dez anos. No entanto, um desejo há muito acalentado se concretiza agora, o da organização de publicações pautadas no rico e diversificado acervo discursivo do Fórum Permanente. Imaginávamos edições tipográficas que pudessem promover, de forma concentrada, o enquadramento conceitual e de crítica cultural desenvolvido pelo Fórum Permanente em seu site em formato hipertextual. Inicialmente o foco estava nos museus de arte, sua crise institucional e ainda em seu principal contraponto, a produção de arte contemporânea. Com o passar do tempo o Fórum Permanente ampliou o debate abarcando assuntos de grande relevância atualmente, como a curadoria, a mediação cultural, as grandes mostras de arte contemporânea, a esfera pública da cultura, as residências artísticas, a acessibilidade, o mercado da arte, entre outros. Com o lançamento do Programa Brasil Arte Contemporânea, fruto da parceria entre o Ministério da Cultura e a Fundação Bienal, surgiu a oportunidade de investirmos neste projeto ao tomar parte do edital “Publicações em língua estrangeira de Arte Contemporânea”. Apresentamos três propostas, todas premiadas, com o firme propósito de lançarmos a Coleção Fórum Permanente de Livros. Museu Arte Hoje, Relatos Críticos 1: Seminários da 27ª Bienal de São Paulo, e Modos de Representação da Bienal de São Paulo indicam os caminhos desta linha editorial, não só pelos formatos apresentados mas pelos temas em evidência. A coleção assim se apresenta por meio de organização de coletâneas de acordo com as temáticas em debate, edições dos relatos críticos produzidos para os eventos registrados no site e livros que problematizem a institucionalização da arte, local e globalmente. Frente à condição globalizada da arte e da cultura resolvemos assumir o compromisso de lançar livros bilíngues, encabeçados pelas versões em língua inglesa. No entanto o lugar da fala é proveniente da realidade local, brasileira, seja das instituições culturais como da arte contemporânea.

 

Martin Grossmann

editor-chefe da coleção

culturador-coordenador