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Patrimônio: ampliação do conceito e processos de patrimonialização

Relato por Edson Gomes

O tema da palestra de Renata Motta, diretora técnica do Sisem (Sistema Estadual de Museus da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo), foi a situação dos museus paulistas, no que tange à curadoria das coleções etnográficas indígenas, bem como dados administrativos e estatísticos.

O Sisem é uma instância da UPPM (Unidade de Preservação do Patrimônio Musicológico), que atua na articulação e na qualificação dos museus do Estado. Renata apontou que o estado precisa avançar na comunicação com os mais diversos profissionais que atuam na área das coleções etnográficas em museus do estado, para que haja, então, uma ação conjunta com museus em São Paulo, sejam eles públicos ou privados.  Atualmente o estado reúne cerca de 415 instituições públicas e privadas, com diferentes vinculações, distribuídas em 190 municípios. Estes dados estão sendo coletados. Segundo Renata, este será um desafio para o atual secretário de Cultura e para o Sisem que tem estado preocupado de forma geral em criar articulações e suporte a estas instituições.

Entre as principais ações do Sisem-SP estão assistências técnicas, programas de capacitação, realização de exposições itinerantes e ações de difusão de acervos. Anualmente, o Sisem realiza o Encontro Paulista de Museus. Segundo Renata, as principais ações realizadas pelo sistema junto aos museus paulistas são:

  1. Articulação das instituições musicológicas e dos profissionais de museus, por meio de representantes em cada Região Administrativa do Estado.
  2. Diagnóstico: visitas técnicas para reconhecimento ou atualização das informações dos museus do Estado.
  3. Assessoria técnica: visitas técnicas para análise e orientação de problemas específicos.
  4. Capacitação: palestras, oficinas e cursos regionais, em parceria com museus e municípios.
  5. Difusão: exposições itinerantes, em parceria com museus e municípios.

 

Entre maio e dezembro de 2010, na fase intitulada pela palestrante como “Diagnóstico”, foi realizado o mapeamento dos museus em parceria com a ACAN PORTINARI (parceira do Sisem) em municípios de São Paulo, levando em consideração aspectos como:  Levantamento dos museus e instituições afins;  preenchimento de ficha cadastral;  registro fotográfico;  dados político-administrativos,  sócio-econômicos, geográficos e históricos. Uma equipe foi contratada sob a coordenação da museóloga Elisabeth Zolzac, que teve o objetivo de atualizar os números destas instituições. Neste levantamento de campo feito em 645 municípios, foram registrados 415 museus e/ou instituições afins localizadas em 190 municípios (30% dos municípios de São Paulo).

Ainda segundo Renata, a publicação oficial de todos estes dados ainda não foi efetuada. Afirmou também que encontros, fóruns e seminários como este são importantes para agregar dados mais específicos e atuais das instituições em questão, tanto por membros representantes destas entidades bem como pela academia.

Fichas institucionais foram feitas, com uma série de dados relativos à identificação dos museus, áreas técnicas e serviços, recursos humanos, administração e infraestrutura. Um mapa apontava os museus e instituições de acordo com sua região administrativa, porém ainda não pode ser utilizado, pois se encontra em processo de finalização.

O levantamento revelou a existência de 53 museus com acervos arqueológicos e etnográficos e 34 museus com acervos etnográficos, nas seguintes regiões administrativas (RA) de: Araçatuba, Barretos, Bauru, Campinas, Central, Franca, Marilia, Presidente Prudente, Registro, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, São José dos Campos, Sorocaba, Baixada Santista e São Paulo. O estudo revelou que a RA de Campinas está em primeiro lugar, seguido da RA de São Paulo, depois pelas RAs de Marilia e Presidente Prudente.

Foram divulgados dados de estudos administrativos apontando os seguintes números quanto às formas de administração: Pública direta 71%, privada 23% e pública indireta com 6%. Quanto às formas de cadastro (documentação), são 30% já avançados com fichas e banco de dados, porém, 15% se encontram sem dados, o que deixa claro – uma opinião reforçada por Renata – que há uma fragilidade institucional visível.

Com relação a dados mais técnicos os números são os seguintes: Reserva Técnica 59% possuem e 49% não possuem Espaço expositivo temporário 74% possuem e 26% não, Atividades Educativas 59% tem esta atuação e 41% não.

Os números foram extraídos de um projeto de documentação do acervo museológico dos museus da Secretaria de Cultura, realizado em parceria com a Fundação Energia e ACAM Portinari entre 2008 e 2010. O projeto iniciou avaliando quinze museus, em onze cidades e agora está em processo de revisão, atualização de dados, desenvolvimento da ferramenta e incorporação de novos museus.

O resultado foi um banco de dados que aponta 2539 registros na tipologia “objeto etnográfico”; acervos etnográficos de cinco museus: Museu Histórico Pedagógico Bernardino de Campos (Amparo), MHP Prudente de Moraes (Piracicaba), MHP Amador Bueno da Veiga (Rio Claro), MHP Índia Vanuire (Tupã), Museu Paulo Setúbal (Tatuí) e 1813 registros de “objeto etnográfico” do Museu Índia Vanuire. A lista abaixo se refere aos museus citados como representativos no final da apresentação:

  • Tupã | Museu Histórico e Pedagógico Índia Vanuire
    Fundado em 1966, o Museu Histórico e Pedagógico Índia Vanuire, em Tupã, SP, reúne uma das mais importantes coleções etnográficas do país. São cerca de 18 mil peças, que representam diferentes comunidades indígenas brasileiras, dos Kayapó aos Yanomámi – incluindo os Kaingang e Krenak, povos que ainda hoje habitam a região oeste do Estado. No acervo estão instrumentos de caça, trabalho e uso doméstico e de outras atividades cotidianas das terras indígenas, além de arte plumária, cerâmica e objetos usados em rituais religiosos.
  • São Paulo | Museu de Arqueologia e Etnologia da USP
    O MAE-USP foi criado em 1989 com a união do Instituto de Pré-História, do antigo MAE, das áreas de arqueologia e etnologia do Museu Paulista e do Acervo Plínio Ayrosa do Departamento de Antropologia FFLCH. O acervo etnográfico do MAE é considerado um dos mais completos e representativos acervos das populações indígenas do Brasil. Representam vários grupos como Guarani, Tukuna, Umutina, Nambiquara, Kabixiána, Kaingang, Terena, Karajá, Xikrín, entre outros.
  • Iepê | Museu de Arqueologia e Etnologia de Iepê
    O Museu de Arqueologia de Iepê (MAI) foi inaugurado dia 26 de junho de 2007. A instituição é resultado de uma parceria a Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT), campus de Presidente Prudente, e MAE-USP. O MAI apresenta importantes coleções de materiais arqueológicos da tradição Tupiguarani, referente ao grupo Guarani do Brasil. Mostra, ainda, acervos associados a grupos caçadores e coletores da tradição Umbu e de horticultores-ceramistas da tradição Itararé. Também enfatiza a arqueologia do Vale do Rio Paranapanema, com destaque para os achados do município.
  • Campinas | Museu Universitário
    Criado em janeiro de 1985 pelo então reitor da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Prof. Heitor Regina. Sua história remonta ao ano de 1958, quando professores e alunos do curso de Ciências Sociais iniciaram a coleta de material etnográfico, arqueológico e folclórico, que deu origem à formação do Museu Universitário PUC-Campinas. De expedições aos índios Bororo e Xavante, o professor de antropologia, Dr. Alfonso Trujillo Ferrari trouxe um valioso material indígena para pesquisa. Graças a novas pesquisas, aquisições, doações e intercâmbio cultural, realizadas principalmente pelo Prof. Dr. Desidério Aytai, o acervo foi enriquecido e organizado em coleções temáticas.
  • Aparecida | Museu Nossa Senhora Aparecida
    A história do Museu Nossa Senhora Aparecida tem pouco mais de 50 anos. Foi inaugurado em oito de setembro de 1956, com benção do Cardeal Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, primeiro Arcebispo de Aparecida. Toda a sua coleção foi reunida pela professora Conceição Borges Ribeiro a partir de coleta de objetos pela região, com destaque para as peças indígenas.
  • Araraquara | Museu Histórico e Pedagógico Voluntários da Pátria
    O museu foi criado por Decreto Estadual no final da década de 1950, porém aberto ao público em 24 de maio de 1970, num antigo casarão, já demolido, situado na Avenida Espanha. A partir de 1975 passou a funcionar no prédio da Praça Pedro de Toledo, onde permanece até hoje. Esse prédio, do fim de 1898, foi construído para ser a segunda cadeia de Araraquara. Ocuparam o prédio o Fórum, Câmara Municipal, prefeitura, Escola de Belas Artes e Conservatório.
  • Ribeirão Preto | Museu Histórico e de Ordem Geral Plínio Travassos dos Santos
    Instalado há 54 anos na antiga sede da Fazenda Monte Alegre, o museu histórico tem como missão preservar, organizar e dar acesso a documentos, bibliografia e a variadas coleções referentes à história de Ribeirão Preto e região. A imponente arquitetura em estilo rural é representada por uma residência ampla em formato de L, rodeada por belas varandas decoradas com lambrequins de madeira e cercada por palmeiras imperiais.
  • São Vicente | Museu Histórico Casa do Barão
    Fundada em 1988 é uma das edificações mais conhecidas de São Vicente, que abriga o Museu Histórico e Geral da Cidade, em suas 13 salas principais, reunindo mais de 1.800 peças, entre fotos antigas de São Vicente, móveis e objetos do século XIX, minerais, fósseis, artesanato indígena, animais empalhados, cerâmicas e miniaturas marítimas, além dos quadros pintados por Carlos Alberto Fabra Perugorria, que constituem os memoriais do Padre Anchieta e da História Vicentina.

Para Renata, as expectativas do estado são positivas em relação aos museus com acervos etnográficos. Aponta interiorização das redes temáticas como caminho futuro, buscando uma transformação e requalificação dos museus etnográficos do estado; aumento do diálogo e reconhecimento das instituições, assim como discussão sobre relações entre museus e patrimônio cultural indígena, macro atuação na preservação, difusão e pesquisa.

Ela finalizou discorrendo sobre a atuação do Sisem com relação os museus da SEC, afirmando que há um investimento direto, uma busca da extroversão para o conjunto dos museus de São Paulo e a valorização do conjunto institucional e patrimonial, através da articulação entre preservação, comunicação e pesquisa – sem deixar de relatar que estes números e resultados da pesquisa não são absolutos.

Terminada a sua apresentação, perguntei se as muitas instituições mapeadas que apareceram nas imagens têm estrutura para receber público e se ela poderia nos informar sobre quanto o Estado investiu nesses mesmos museus durante todo o período de realização da pesquisa. Renata respondeu que a situação é complicada, pois apenas um número pequeno dessas instituições possuem estrutura para receber público. Quanto ao investimento público, ela afirmou que em 2008 foi de 220 mil reais e que hoje é de 2 milhões de reais. O que posso dizer para concluir este relato é que na cidade onde moro, Campinas, os museus ilustrados no telão, com imagens de suas fachadas, encontram-se em situação de total abandono do poder público. O Dr. Desidério, citado como um pesquisador importante para a região, está com seu acervo - ao qual tanto se dedicou ao longo de sua vida - em péssimas condições de conservação.