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Museus, Edificações, Cidades

palestra de Gerardo Mosquera, curador do New Museum de Nova Iorque, com participação de Aracy Amaral como debatedora
Aracy Amaral, Gerardo Mosquera, Martin Grossmann
Aracy Amaral, Gerardo Mosquera e Martin Grossmann

 

Gerardo Mosquera e Aracy Amaral reuniram-se no auditório do MAM-SP para discutir a   atuação dos museus nas megalópolis. Mosquera abordou a questão da construção de novos prédios para museus, uma tendência mundial que agora atinge o New Museum de Nova Iorque. Esse processo de reestruturação arquitetônica eliminará uma  característica importante daquela instituição experimental e alternativa, pois o antigo espaço improvisado em lofts do Soho será substituído por um prédio de arquitetura minimalista e avançados recursos tecnológicos. Como manter a filosofia experimental do New Museum em um espaço bastante convencional -- e sem dúvida impecavelmente adequado a práticas museológicas -- e que passará a ser, ele mesmo, a obra que mais atrairá o público ao novo endereço?

Mosquera explica esta tendência do museu como um forte marco arquitetônico pela passagem da noção de museu como coleção para o atual conceito de museu como um espaço de acontecimentso, de vida cultural. Uma arquitetura forte corporifica este espaço para eventos, fazendo do museu uma verdadeira catedral contemporânea. E assim vê-se surgir no século 20 arquiteturas escultóricas impressionantes porém inadequadas para exposições, como o prédio que Frank Lloyd Wright projetou para o Guggenheim de Nova Iorque.

O New Museum de Nova Iorque foi crido em 1977 por Marcia Tucker com o intuito de ser uma instituição alternativa, que exporia a arte emergente, excluída do circuito convencional, política reforçada por suas publicações instigantes. Desde 1995, quando Gerardo Mosquera e Dan Cameron assumiram a curadoria das exposições, o museu passou a apresentar menos mostras coletivas e a focar em individuais de artistas pouco conhecidos em Nova Iorque, incluindo Cildo Meirelles e Hélio Oiticica. Com a construção do novo prédio, a ser inaugurado em 2006, Mosquera vislumbra uma nova atualização de curso nas políticas do museu que, apesar de seguir os passos de outras instituições ao lançar seu novo prédio, quer continuar a distinguir-se como um museu não convencional. Na definição dessa nova política, Mosquera orienta-se pelas necessidades de um mundo cada vez mais urbanizado: se no início do século 20 apenas 10% da população do planeta vivia em cidades, hoje este número chega a 50% da população mundial. Em 2015, das 36 megalópolis do mundo (cidades com mais de 8 milhões de pessoas) previstas em estudos demográficos, 30 estarão em países subdesenvolvidos. Os museus então terão um novo desafio: tratar das mesclas culturais derivadas do êxodo das populações rurais rumo às cidades, servir a esta nova situação como um hub distribuidor de comunicação. Esta mudança de conceito -- do museu como espaço de eventos para o museu como um hub distribuidor de novas situações culturais -- impõe ao museu um papel muito dinâmico pois implica em parcerias entre instituições (Mosquera citou por exemplo um intercâmbio entre o New Museum e novos espaços de exposição como o Torreão em Porto Alegre) e um forte relacionamento museu-artistas.  É preciso, segundo Mosquera, que o New Museum esqueça que tem um prédio novo, saia do prédio e lance-se às regiões onde os fenômenos demográficos exigem novas reflexões culturais.

Aracy Amaral iniciou sua apresentação sugerindo que no Brasil não podemos tão facilmente esquecer dos prédios dos museus, sair dos prédios, pois ainda não os temos. Não só nos faltam prédios como também nos faltam instituições que somem um acervo relevante e em desenvolvimento a um corpo profissional adequado para tratá-lo. Enquanto que nos Estados Unidos a tradição empresarial respondeu às necessidades culturais de uma comunidade e na Europa os governos assumiram a responsabilidade pela cultura, no Brasil foram iniciativas individuais que geraram o que há de relevante: assim ocorreu com a Bienal de São Paulo, o MASP, o MAM, o Salão de Maio, e mais recentemente os centros culturais como os do Unibanco, Itaú, Tomie Ohtake, e Sesc.

Nossa população de parcas opções culturais refugia-se na televisão enquanto que museus que poderiam ser verdadeiros centros de cultura encontram-se sem direção. Por que a sociedade não se organiza para exigir uma mudança nesta situação? O MASP está acéfalo, sustentando-se com recursos de empréstimos de obras; MAC-USP passa atualmente por uma direção burocrática alheia à riqueza cultural de São Paulo; MUBE é um prédio apenas, sem qualquer política cultural. Outras entidades assumem a função que as instituições detentoras do patrimônio cultural deveriam assumir. E assim a vida artística prossegue através do Itaú, Unibanco, BrazilConnects, etc.

Para Aracy Amaral, não podemos queimar etapas e partir para a crítica ao museu se ainda não os temos. Curadores de museus europeus podem fazer essa crítica tranquilamente, como ocorreu durante a participação de Catherine David no Fórum Permanente, mas no Brasil ainda temos uma conquista a fazer: um museu com prédio, coleção e corpo profissional adequados.

 

[por Paula Braga]