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Projeto Respiração - Nuno Ramos - "Pergunte ao"

Curadoria – Marcio Doctors / Fundação Eva Klabin

O Projeto Respiração, que propõe criar intervenções de arte contemporânea em meio ao acervo de arte clássica da Fundação Eva Klabin, surgiu da necessidade de lidar com um acervo que estava engessado pela própria circunstância de sua criação, que foi a de deixar para a memória coletiva da sociedade brasileira uma coleção que é um resumo dos principais momentos da história da arte clássica, circunscrito em uma ambiência de casa-museu que reflete o gosto pessoal e os hábitos sociais de sua instituidora. Como trazer para um espaço totalmente preenchido pelo imaginário de Eva Klabin, experiências plásticas mais afeitas a espaços neutros como os dos museus tradicionais de arte moderna e das galerias de arte? 

A nossa resposta a esse desafio foi convidar artistas capazes de estabelecer outras camadas de leitura do acervo. A intenção foi declaradamente criar fricções de linguagens entre a arte consagrada do passado, patrimonializada, e as manifestações contemporâneas. Esses atritos são provocados não só pelo acervo ou pela história da arte, como também por outras questões específicas de uma situação de casa-museu. Essas vão desde o fato das obras estarem expostas em um ambiente doméstico, em oposição a um ambiente tradicional de museu, até outras implicações mais sutis como a relação entre o que é pessoal e o que não é socializável, entre o espaço da intimidade de uma residência e o de um ambiente de um museu de representação coletiva. Eva Klabin habitou e formatou esse espaço, criou o cenário para a sua própria existência e o transformou em museu, fazendo de seu acervo universal um patrimônio artístico e histórico nacional.

O Projeto Respiração teve início no segundo semestre de 2004 e já contou com a participação de José Damasceno, Ernesto Neto, Chelpa Ferro, Anna Bella Geiger, Paulo Vivacqua, Brigida Baltar, Claudia Bakker, Marta Jourdan e do artista português Rui Chafes.

A exposição “Pergunte ao” do artista Nuno Ramos corresponderá à 8ª edição do Projeto Respiração e ocorrerá de 04 de abril a 01 de junho de 2008. A proposta do artista trata, através de elementos plásticos e escultóricos, de voltar o conjunto fabuloso de obras da FEK para ele mesmo. O olhar do público será filtrado por uma situação de interdição que ativará a percepção de que para nos relacionarmos com uma coleção devemos abrir espaços mentais que provocam indagações e reflexões sobre o que está sendo visto. O olhar do público será solicitado a se infiltrar nas frestas estabelecidas pelo artista entre as obra e elas mesmas.  

Os quadros serão “aprisionados” em espelhos voltados para eles, refletindo-se, olhando-se pela primeira vez; o mesmo raciocínio será empregado para as esculturas e para os móveis do acervo, através de granitos reluzentes, cortados no formato destas esculturas e destes  móveis, que se verão refletidos nas pedras; conjuntos de mobiliário serão “aprisionados” em vitrines com caixas de som voltadas para dentro, que emitirão monólogos ou diálogos criados especialmente pelo artista. O resultado será, de certa forma, substituir o olhar de fora, do público, pelo olhar interno à Coleção, como se estivesse refletindo a si mesma, ou literalmente conversando consigo mesma, numa inversão do sentido do olhar (do público para as obras) que prevalece normalmente.

O título “Pergunte ao” vem da longa lista de perguntas - Pergunte ao pó; Pergunte à ventania; Pergunte à maçã; Pergunte ao caos etc, que estará impressa nas costas dos espelhos e dos granitos.

Ao introduzir a palavra como elemento plástico e sonoro de sua intervenção, Nuno Ramos provoca um deslocamento do campo visual para o campo verbal que reforça a intenção de sua proposta, que é a de criar uma situação visual, semelhante ao universo das palavras, em que a realidade é percebida em um circuito de representação fechado sobre si mesmo. Mas ao lançar a sentença “Pergunte ao” estabelece no campo da palavra um raciocínio de origem visual que é o de fazer com que a “coisa” possa falar. A resposta é também um circuito fechado sobre si mesmo.  Palavras falam sobre palavras e coisas apontam para coisas. Essa irredutibilidade entre “as palavras e as coisas” que sua intervenção vai indicar (ao fazer os quadros, as esculturas e os móveis se vendo e conversando com eles mesmos e o público buscando se introduzir nesta relação), evidencia que, hoje, para que possamos melhor perceber as obras de arte do passado, necessitamos desestabilizar o território do olhar patrimonializado.

Na fase atual do projeto, as peças que comporão a exposição (espelhos, vitrines e granitos) estão sendo detalhadas pelo artista, que veio de São Paulo e ficou trabalhando na FEK nos dias 24, 25 e 26 de janeiro. O artista trouxe de Belo Horizonte um especialista que desenvolverá ferragens específicas para as obras no sentido de fixá-las sem colocar em risco o acervo. Durante estes dias o artista esteve reunido com o curador Marcio Doctors e com parte da equipe da FEK, os museólogos Diogo Maia e Ruth Levy, que colaboraram na definição de soluções para evitar qualquer dano à coleção e na medição das obras do acervo. As peças começarão a ser produzidas, mas ainda serão testados protótipos para eventuais ajustes.

O artista vem elaborando também os textos que farão parte da exposição como o “Pergunte ao” que se encontra em arquivo pdf anexo.




Equipe técnica

Coordenador/Curador: Marcio Doctors
Artista convidado: Nuno Ramos
Montagem e apoio: equipe da Fundação Eva Klabin


Marcio Doctors – Coordenador/Curador
É crítico de arte e curador da Fundação Eva Klabin. Foi secretário particular de Mário Pedrosa, crítico de arte do jornal O GLOBO e é mestre em estética pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tem artigos publicados nas principais revistas de arte do Brasil como Módulo, Galeria, Guia das Artes e em revistas internacionais como Colóquio/Artes (Portugal) e Lapiz (Espanha). Organizou inúmeras exposições como curador independente e atuou como membro de várias comissões de seleções e bolsas.
Como curador da Fundação Eva Klabin tem organizado exposições - como "Universos Sensíveis: as coleções de Eva e Ema Klabin" na Pinacoteca do Estado de São Paulo e no Museu Nacional de Belas Artes, além de ciclos de conferências, cursos e publicações. Em 2004 criou o "Projeto Respiração", de intervenções de arte contemporânea na casa-museu de Eva Klabin. Vem coordenando também importantes projetos na área de pesquisa, conservação e restauração, incluindo projetos apoiados por Vitae e patrocinados através da Lei do Mecenato.
Desde 2003 é representante para a América Latina do DEMHIST – comitê do ICOM (Conselho Internacional de Museus) para casas-museus e vem desenvolvendo importantes atividades para a integração e visibilidade dos museus desta tipologia.


Nuno Ramos – Artista convidado
Nasceu em 1960. Formou-se em Filosofia pela Universidade de São Paulo, em 1982. Desde 1983 tem exposto pelo Brasil e pelo mundo. Participou das Bienais de São Paulo de 1985, 1989 e 1994, além da Bienal Brasil de 1994. Representou o Brasil na Bienal de Veneza de 1995. Ganhou o Grand Award da Barnett Newman Foundation, pelo conjunto da obra, em 2006. Como escritor, publicou os livros “Cujo” e “O pão do corvo”. Como cineasta, produziu e dirigiu (em parceria com Eduardo Climashauska e Gustavo Moura) os curtas “Luz Negra”, “Casco” e “Iluminai os terreiros”.