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Mark Dion

Vertices/Vetores: diálogos

Mark Dion

Mark Dion Carvalho

Carvalho, 2012

“O gabinete de história natural e o jardim [...] substituem o desfile circular do ‘mostruário’ pela exposição das coisas ‘em quadro’. O que se esgueirou entre esses teatros e esse catálogo não foi o desejo de saber, mas um novo modo de vincular as coisas ao mesmo tempo ao olhar e ao discurso. Uma nova maneira de fazer história”

(FOUCAULT, 1999, p. 148)

Para falar da obra de Mark Dion, poderíamos iniciar por qualquer um de seus trabalhos, uma vez que possui uma produção extensa e coerente, mas também complexa e exuberante. Desde os anos 1980, o artista dedica uma atenção particular às ciências biológicas e à ecologia, algo que ele afirma não ser propriamente o enfoque da arte daquela década. O trabalho de Dion explora muitas vezes métodos científicos de taxonomias, apropriando-se de sistemas de classificação dos museus de biologia, arqueologia e história natural e assumindo formas cada vez mais monumentais.

A complexa obra Carvalho (Xiloteca Schildbach, ou Biblioteca de madeira) é um site-specific permanente comissionado pela última Documenta de Kassel, em 2012. Consistiu numa intervenção no Ottoneum, espaço construído em 1603-1606, que já foi usado como teatro, capela militar, observatório e depósito de coleção de arte, entre outros fins. Teve parte de sua estrutura destruída na Segunda Guerra e, em 1954, foi reaberto como Museu de História Natural. O Otteneum abriga uma xiloteca composta por Carl Schildbach entre os anos 1771 e 1779, com amostras coletadas de 441 diferentes tipos de árvores locais, totalizando 530 livros. Esses livros guardam dentro de si espécies de representações do ciclo da vida, feitos com plantas secas e cópias em cera, e são organizados de forma enciclopédica.

Mark Dion dialoga com os elementos e com a história desse espaço, além de outros elementos relativos à própria Documenta. Em 1982, na Documenta 7, Joseph Beuys havia realizado uma intervenção na cidade de Kassel em que plantaou 7 mil árvores de carvalho (Oaks – City Forestation Instead of City Administration). Dion, por sua vez, configura uma nova disposição para os artefatos mostrados no Otteneum e constrói um móvel em que adiciona mais seis livros à coleção: “Cinco deles apresentam uma madeira específica de um dos cinco continentes faltantes na coleção de Schildbach, simbolicamente completando seu esforço enciclopédico”[1]. O sexto livro é feito com carvalho, referindo-se à intervenção de Beuys.

 

Seus projetos demarcam uma crítica institucional que se inicia com um questionamento das estratégias documentais tais como descritas pela fotografia e pelo filme. Seus primeiros trabalhos buscavam transpor o campo documental da fotografia e do filme para os da instalação e da escultura, o que fazia a partir de referências como Jean-Luc Godard, Chris Marker, Laura Mulvey e Allan Sekula, entre outros. Segundo ele, os artistas que fazem críticas institucionais se dividem em duas possibilidades, os que enxergam o museu como um “reservatório ideológico” e, dessa forma, acreditam que possam corrompê-los, e os que acreditam que podem torná-los lugares mais acessíveis ao público, mais interessantes culturalmente. Dion se assume como membro do segundo grupo.

Para o artista, museus são lugares de aprendizado e conhecimento de grande seriedade, mas que retiraram a cultura popular de cena. Entretanto, o que ocorre nos últimos anos, em diversos países, é a tentativa de encontrar novas formas de atrair o público, a massa pagante, para que os museus possam permanecer viáveis economicamente. Para isso, as estratégias apostam nas lojas de lembrancinhas, nos restaurantes, nos programas de entretenimento e na sensibilização do público, fatos que representam o redirecionamento dos museus para um fim mais popular (DION, 2005). Contudo, Dion acredita que os museus oferecem hoje, em sua maioria, exposições que “respondem” muito rapidamente às possíveis questões dos visitantes, ou seja, não é mais o lugar em que as questões são provocadas mas o lugar onde elas são solucionadas para o público: “o museu encarna a ‘história oficial’ de uma forma particular de pensar, em um termo particular e para um grupo específico de pessoas” (DION, 2005).

Sua obra denuncia, portanto, a tensão existente entre o museu como lugar para o entretenimento e o museu como um lugar para a educação. Sua estratégia busca o maravilhamento trazido pelos Gabinetes de Curiosidades para articular esse pensamento.



[1] <http://www.detnk.com/node/11611>. Acesso em: 20 set. 2015.