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Edemar enviou obras mais caras, diz arquivo

FOLHA DE S. PAULO

1 de janeiro de 2006

FOLHA Dinheiro


Edemar enviou obras mais caras,
diz arquivo

por MÁRIO CÉSAR CARVALHO
da Reportagem Local

O banqueiro Edemar Cid Ferreira tirou do país algumas das obras mais caras de sua coleção de arte. Um arquivo digital da Cid Collection, obtido pela Folha, mostra que dez obras compradas por cerca de US$ 5,5 milhões (equivalentes hoje a R$ 12,8 milhões) estão no exterior.
A mais cara dessas obras é a escultura "Woman", do artista britânico Henry Moore (1898-1986), comprada em 3 de junho de 2003 por US$ 1,475 milhão (R$ 3,4 milhões), segundo o arquivo.
Além da escultura, o banqueiro mantém fora do país trabalhos de Jean-Michel Basquiat (1960-1988), Fernand Léger (1884-1955) e Roy Lichtenstein (1923-1997).
O arquivo da Cid Collection traz informações sobre 9.488 trabalhos de Edemar, um acervo heterodoxo que reúne desde um ladrilho do Titanic até uma escultura romana.
O próprio Edemar reconheceu à Justiça, em interrogatório feito em agosto, que tem trabalhos fora do país. Citou as obras de Moore, Basquiat, Léger, Lichtenstein e Anish Kapoor. A tela de Basquiat está em Nova York, e os outros quatro trabalhos, em Zurique, na Suíça, segundo o banqueiro. Ele é réu num processo em que é acusado de gestão fraudulenta, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. O Banco Santos deixou um rombo de R$ 2,2 bilhões.
Edemar incluiu na lista de obras que estão na Suíça, de forma aparentemente equivocada, uma tela de Francis Picabia (1879-1953) que está em sua casa no Morumbi, zona sul de São Paulo. Reportagem de maio da Folha havia revelado que o banqueiro tinha obras num depósito suíço.

"Não tem mais"
Ao ser interrogado pelo juiz federal Fausto Martin de Sanctis sobre o valor dos trabalhos, o banqueiro respondeu: "Podem valer de US$ 100 mil a US$ 200 mil". Mesmo sem ter sido questionado se teria mais trabalhos no exterior, afirmou: "E acabou. Não tem mais obra nenhuma no exterior".
Não é bem assim, como mostra o arquivo com o livro de tombo da Cid Collection. Edemar tem pelo menos dez obras fora do país -o dobro do que ele declarou ao juiz Martin de Sanctis.
A informação de que o banqueiro tinha tirado obras de arte do país foi revelada pela Folha em 22 de maio de 2005. Nessa reportagem, o jornal informou, após quatro meses de levantamento, que oito trabalhos do banqueiro haviam deixado o país.
O ponto de partida do levantamento da Folha fora uma reportagem da revista "IstoÉ Gente" na qual Edemar aparecia à frente de uma tela de Basquiat batizada "Hannibal". Com o seqüestro da coleção, feita por ordem da Justiça no dia 1º de março de 2005, tornou-se possível checar as obras de Edemar que estavam no país.
Não dá para saber se o banqueiro retirou as obras antes ou depois que o Banco Central interveio no Banco Santos, em 12 de novembro de 2004.
A impossibilidade de se descobrir quando as obras deixaram o país deve-se ao fato de uma parte delas ter entrado no país sem passar pela Receita Federal.
Quatro ex-funcionários do banqueiro entrevistados pela Folha em maio passado contaram que, cerca de dez dias antes de o BC intervir no Banco Santos, circulou uma lista com cerca de cem obras que deviam deixar o país.

As mais caras
Uma pesquisa no CD em que foi gravado o livro de tombo da Cid Collection revela que as obras que estão fora do país são algumas das mais caras da coleção.
Se estão certos os preços do livro de tombo, os dez trabalhos de Edemar que estão fora do país custaram US$ 5.494.205. Esse valor equivale a 27,5% do preço da coleção na hipótese de ela valer US$ 20 milhões.
Quatro das obras que Edemar mantém no exterior custaram mais de US$ 500 mil: as de Moore, Basquiat, Léger e Lichtenstein. Com isso, só sobrou uma obra nessa faixa de preço entre as seqüestradas. É uma escultura romana, registrada no livro de tombo com o nome de "Togatus Romanus" (Romano de Toga), comprada em 2003 por US$ 772.980.
A figura masculina em mármore, sem a cabeça e sem as mãos, é a obra mais cara entre as seqüestradas -está na casa do banqueiro.
Entre as obras de arte contemporânea, os trabalhos mais caros são duas telas de Robert Rauschenberg, compradas por US$ 350 mil e US$ 360 mil.