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Ibirapuera: proposta para transformá-lo em um parque cultural-ambiental da cidade de São Paulo

Escrito pelo Professor Martin Grossmann em São Paulo, 25 de janeiro de 2006.

Um conjunto interligado de espaços culturais, funcionando em rede, visando o entretenimento, o prazer, o lazer e a formação e atualização cultural, intermediados pelo verde do parque —recuperado seu projeto paisagístico de Burle Marx, potencializado pela marquise do projeto original de Niemeyer e do elo plástico de um jardim de esculturas. Um lugar protegido do caos urbano, visando proporcionar uma experiência continuada da arte e da cultura, nos seus vários tempos e modos.

 

Instituições integrantes já existentes:

  • Fundação Bienal de São Paulo

  • Museu de Arte Contemporânea da USP —MAC-USP

  • Museu de Arte Moderna de São Paulo — MAM-SP

  • Museu Afro-Brasil

 

Criação de duas novas organizações:

  1. OCA da arte, um espaço de exposição internacional, sub-tropical, inspirada nos moldes das "kunsthalles" alemãs e nos grandes espaços alternativos de arte e ciência que hoje são encontradas nas principais cidades do Hemisfério Norte (vide, entre outros, a Schirn Kunsthalle de Frankfurt, Haus der Kunst em Munique, etc.).

Papel: promover grandes exposições retrospectivas de artistas, de movimentos de arte, antropológicas, de cunho científico, visando o grande público, na esteira das melhores exposições promovidas pela Brasil Connects em seu período áureo (ex. em associação com Instituições de renome internacional como a Tate Gallery, o Centro Charles Pompidou, Museus Etnográficos e Científicos Nacionais e também com instituições brasileiras). Esse espaço seria complementar ao "Museu-Interface" (descrito abaixo) e deve estar em sintonia com a programação cultural de todas as instituições que formam o "parque cultural-ambiental". Com a institucionalização desse espaço, o Brasil faria assim parte de uma rede internacional de grandes exposições de qualidade voltados ao grande público. Essa integração deve também prever a criação de mostras brasileiras a serem exportadas para espaços congêneres no exterior. Essas exposições poderiam ser planejadas em conjunto com as instituições que formam o complexo do "parque cultural-ambiental".

 

  1. Museu-Interface de Arte Brasileira: mi@br, a ser instalado no "Palácio dos Estados" —atual Pavilhão Armando de Arruda Pereira, sede da PRODAM. Um museu sem acervo próprio, mas cujas exposições seriam compostas pelos acervos das seguintes instituições:

 

  • Universidade de São Paulo: MAC e IEB (eventualmente algumas obras do Museu Paulista)

  • MAM-SP

  • Pinacoteca do Município de São Paulo

  • Coleções particulares

  • Eventuais empréstimos das coleções da Pinacoteca do Estado, do Museu Lasar Segall e da Coleção do Governo do Estado.

 

Trata-se de um novo tipo de museu, entendido como interface, ponto-de-encontro das várias coleções e saberes que conformam a nossa arte, do modernismo à contemporaneidade. Inspira-se nas idéias e atuação de Mario Pedrosa_ e também no esboço de "Um Grande Museu para São Paulo" proposto por Aracy Amaral no final da década de 80:

No entanto, a atualização dessa idéia, em contraste com o projeto de Aracy, exclui o referencial de um museu autônomo, como equipamento da cultura material, que precisaria ter uma infra-estrutura para todas as áreas que conformam esse tipo de museu: reserva técnica, laboratórios de restauro, etc. Na verdade ele seria um museu para a exposição dos desdobramentos da arte brasileira pelo ponto de vista da experiência contemporânea, relacionado não só ao contexto nacional como também ao internacional, por meio de um complexo expositivo apoiado em um programa curatorial-educativo de ponta, capaz de proporcionar, com qualidade, experiência e conhecimento a diversidade do que costumamos chamar de "grande" público. Ou seja, uma instituição voltada à formação cultural, com ênfase na mediação cultural, capaz de fornecer leituras críticas, sincrônicas e diacrônicas, da arte brasileira (do ponto de vista do contexto internacional) para um público variado, de todas as partes do país e do mundo, do escolar ao universitário, do indivíduo à família ou grupos especiais. Contando com as obras mais significativas das coleções envolvidas, a expografia desse museu seria também um diferencial em relação ao entendimento de exposição de arte hoje. O museu-interface é um espaço expositivo multimídia que, em sua composição, faz uso não só das obras em si, mas de um rico referencial informacional editado na forma de filmes, vídeos, fotos, material hipertextual, 3D e interativo, o que constituiria um outro acervo disponível também em formatos digitais e de livre acesso pela internet. O museu-interface seria assim constituído por "ambientes imersivos" capazes de envolver o visitante emocionalmente, mas também cognitivamente, alimentando sua volição ao conhecimento. Esses ambientes seriam planejados por equipes multidisciplinares e se apoiariam não só na rica experiência educativa das instituições envolvidas como também em propostas modelares como as da Tate Modern - vide palestras de Toby Jackson, diretor do departamento de Educação e Interpretação da Tate Modern em Londres:

 

http://www.forumpermanente.org/event_pres/jornadas/educ_toby

 

Para a concretização desse museu-interface e sua expografia inovativa, sugere-se a parceria com empresas multinacionais ligadas ao setor da tecnologia e telefonia. O projeto seria conduzido por um curador-chefe e implementado por uma equipe de especialistas multidisciplinares e interinstitucionais (vide item.” Gestão do Parque Cultural-Ambiental”)

 

Criação de três novos projetos

a serem geridos pelo coletivo de instituições que formam o conglomerado do "parque cultural e ambiental":

 

  • Jardim de esculturas,

Parceria MAM, MAC, Bienal e Museu Afro-Brasil

Considerar o parque como esse jardim. Tendo como referência o

projeto original de paisagismo de Burle Marx e empreitadas anteriores, como o jardim de esculturas do MAM, a proposta é a de atualizar esse conceito e colocar em prática uma forma renovada de interação entre o paisagismo e a escultura (do Modernismo à contemporaneidade).

 

  • Espaço para a arte contemporânea

Parceria entre Bienal, MAM e MAC.

Espaço de exposição continuada de arte contemporânea, nacional e internacional. Um espaço apropriado para isso seria o andar térreo da Bienal, em toda a sua extensão.

 

  • Programa de novas aquisições

Parceria entre MAM, MAC, Museu Afro-Brasil, OCA e Bienal.

Esse programa promoveria uma política integrada de novas aquisições associada a todos os eventos promovidos pelo Parque Cultural-Ambiental, inclusive os da Bienal e da OCA. A idéia central é a de que todo programa de exposições esteja associado a aquisições de obras que serão direcionadas às coleções das instituições que constituem o complexo cultural, ou seja, uma porcentagem dos patrocínios aos eventos e equipamentos culturais do Parque será direcionada a esse programa. Dessa forma, as coleções dos museus integrantes terão finalmente a garantia da atualização de seus acervos, algo que nunca foi seriamente endereçado pelas políticas públicas e privadas voltadas aos equipamentos museológicos da cidade de São Paulo.

OBS. Todos os projetos acima devem contar com um curador-chefe que, em conjunção com as equipes curatoriais das outras instituições, traçaria o plano diretor desses programas e seria responsável por sua condução.

 

Nova composição do parque

(instituições existentes + novas organizações):

 

O "Palácio das Nações", (Pavilhão Manoel de Nóbrega) ficaria com o Museu Afro-Brasil que lá se encontra. A OCA recuperaria definitivamente sua função como "Palácio das Exposições" em contraposição espacial a outro espaço destinado a eventos temporários que é o auditório recém-construído em parceria com a TIM (bom exemplo de parcerias futuras).

A Fundação Bienal continuaria no "Palácio das Indústrias", mas com uma nova função de organizar em seu recinto, em conjunto com as outras instituições do conglomerado, um programa permanente de arte contemporânea de preferência em seu andar térreo. Em contrapartida, a Bienal passaria a ocupar o espaço do MAC-USP no terceiro piso, uma vez que essa instituição ganhou seu espaço no museu-interface mi@br instalado no "Palácio dos Estados". Com esse movimento de transferência da coleção do MAC-USP para compor o mi@br ficaria então a sede desse museu, na cidade universitária,  dedicada à realização de exposições temporárias, em sintonia com as políticas culturais da USP.

 

O MAM-SP também teria um papel central no novo museu-interface mi@br, uma vez que possui não só obras de arte moderna brasileira de destaque como, principalmente, obras de arte contemporânea brasileira adquiridas na última década, complemento fundamental ao núcleo histórico do MAC-USP. Com uma participação efetiva dessa instituição na gestão do espaço de arte contemporânea no "Palácio das Industrias", a Prefeitura poderia até negociar a retirada das instalações do MAM na extremidade da marquise oferecendo outra alternativa de localização no centro da cidade em sintonia com o projeto de um novo espaço para a Pinacoteca Municipal. Isso certamente contentaria a todos, em especial o arquiteto Niemeyer pois recuperaria a dimensão e função originais da marquise no conjunto arquitetônico do Parque, elemento de plasticidade e presença única na história da arquitetura moderna.

 

Além da marquise como elemento de ligação dos pavilhões, o Parque também ganharia um outro elemento de conexão simbólica e plástica: o jardim de esculturas que ocuparia toda a sua dimensão territorial.

 

Um outro desdobramento possível

Agregar o "Palácio da Agricultura", atual sede do DETRAN, ao complexo cultural-ambiental do Parque Ibirapuera transformando-o em Centro de Criação

 

Uma extensão desejável dessa proposta seria a transformação do prédio do DETRAN em um espaço voltado à criação artística de forma global (artes plásticas, cinema, teatro, música, etc.) incluindo  as novas mídias.

 

Seria um espaço que privilegiasse a arte em processo, a arte jovem e experimental: um laboratório. Um modelo para um projeto como esse é a Cite Internationale Des Arts de Paris < http://www.citedesartsparis.net/>

Esse espaço poderia dispor de:

  1. ateliês e laboratórios para a criação, voltado para artistas e grupos de artistas de todas as áreas (da gravura à multimídia passando pela fotografia; do teatro à imagem em movimento, da música erudita à música experimental, etc.)

  2. estúdios de ensaio para teatro, performance e música

  3. teatro(s), salas de concerto e de eventos,

  4. flats para residência (acomodação para criadores para intercâmbios de artistas, regional, nacional & internacional)

  5. Espaço de exposição, nesse sentido poderia até ser estudada a transferência do Paço das Artes (equipamento cultural que pertence a Secretaria da Cultura do Estado) para que fosse o organismo responsável por essa atividade e também pela coordenação de eventos que interligassem as facilidades que conformariam esse centro de criação.

  6. Poderia também ser estudada a possibilidade da instalação de galerias de arte comercial.

  7. espaço para festas e celebrações

  8. Bar(es) e restaurante(s)

 

OBS.: nessa empreitada, as instituições integrantes do complexo do parque mais outras instituições culturais e educativas da cidade —universidades públicas e privadas, representações culturais estrangeiras, como o Goethe-Institut, British Council, Instituto Cervantes, Consulados, entre outros, poderiam cooperar na manutenção das facilidades e programas oferecidos pelo Centro de Criação.

 

Gestão do Parque Cultural-Ambiental:

As novas organizações (Oca das artes & mi@br) teriam, cada, no seu comando, um curador-chefe de nível internacional. Esse profissional teria o apoio de uma equipe formada por profissionais-convidados e profissionais provenientes das instituições apoiadoras. Teriam também um conselho cultural e um conselho deliberativo formado não só por representantes das instituições constituintes, como também da Secretaria da Cultura do Município (e talvez também do Estado) e representantes da sociedade em geral (empresários, artistas, etc.). O processo de escolha desses gestores deve levar em conta prioritariamente suas experiências profissionais e perfil intelectual. —vide como referência para esse tipo de profissional o documento "Perfil de um diretor de museu de arte":

 

 

O administrador do Parque deve contar com o apoio de um Comitê Gestor, formado por representantes da Secretarias da Cultura, Meio Ambiente e Turismo, pelos curadores-chefes das novas organizações (OCA & mi@br) bem como dos dirigentes da Fundação Bienal e Museu Afro-Brasil e dos dirigentes das instituições parceiras do Parque (MAM & USP), bem como outros dirigentes de organismos que eventualmente venham a se somar nessa empreitada.



Martin Grossmann

 

São Paulo 25 de janeiro de 2006

 

Obs.: esta proposta foi enviada ao Secretario Municipal de Cultura, Carlos Augusto Calil, nesse dia, em grande parte inspirado pelo debate promovido pelo projeto de renovação da Ilha dos Museus em Berlin, que, juntamente com o Humboldt Forum, são o carro-chefe da cultura para uma Berlin reunificada, capital de uma nova Alemanha no pós-guerra. Nesse período, o Instituto Goethe e e o Fórum Permanente já estavam planejando um evento que discutiria esse projeto e a centralidade dos museus em Berlin por ocasião da exposição DEUSES GREGOS; Obras do Museu do Pergamon de Berlim que ficou em cartaz na FAAP de 20 de agosto a 26 de novembro de 2006. O secretario Carlos Augusto Calil foi convidado como debatedor na palestra de Klaus-Dieter Lehmann que na época era o presidente da Fundação Prussina de Cultura de Berlim.